capítulo único ;

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O sol já brilhava fortemente em um céu azul límpido quando as cortinas grossas foram desajeitadamente puxadas por mãozinhas animadas. Uma gargalhada docemente arteira chegou aos ouvidos de Severus e ele precisou concentrar ainda mais esforços na árdua tarefa de manter firme o seu disfarce.

Pôde ouvir muito bem quando um pulinho quase barulhento foi bem cravado no chão e o vestido roxo rodou com todas as suas camadas, acompanhando o giro da pequena antes de se ajustar corretamente em seu corpinho. Ela não poderia estar mais ansiosa em acordá-lo após ajudar a preparar o seu café da manhã.

Fizera questão de lavar todas as frutas e colocá-las à sua maneira na tigela, formando as mais diversas figuras — como corações, estrelas, uma carinha feliz e até mesmo uma cobrinha com as cascas de uma maçã verde, em homenagem ao sangue sonserino que o aniversariante do dia tão orgulhosamente carregava em suas veias.

Entretanto, ao se virar para a grande cama, dedinhos inquietos encontraram imediatamente o tecido de seu vestido, apertando e amassando-o insistentemente, como sempre fazia quando algo lhe parecia errado, seja por nervosismo, irritação, ou qualquer outro sentimento negativo com o qual não soubesse lidar.

E, naquele momento, ela estampava a mais pura confusão em seu lindo rostinho angelical.

— Mas… — o tom quase choroso por muito pouco não o fez erguer uma de suas sobrancelhas. — Mas, titia, hum… — ela pareceu pensar — mamãe, mas, o papai não doime de ponta de cabeça?

A pergunta tão ingênua, repleta de confusão e desapontamento, fez com que Severus quase se engasgasse na tentativa de não rir. Por sorte, não fora o único a perder a pose com o jeitinho doce e inocente de Eloáh, tendo a risada que tanto gostava para encobrir sua crise de tosse.

— Shhh… — Aquila tentava disfarçar o riso, com um sorriso enorme em seus lábios pintados, sem conseguir culpar o marido por quase estragar a pequena farsa combinada para agradar a futura caçula dos Snape. — Veja, meu amor, quase acordamos o papai!

— Mas não pode ainda! — Eloáh reclamou com um biquinho emburrado.

— Humm… Então, o que acha de fazer isso com um abraço? — Sugeriu cautelosa.

— Ataque de beijinhos, mamãe! Ataque de beijinhos! — Elô sussurrou animada, surpreendendo a si e aos seus pais com sua própria ideia. Batia palmas silenciosas e frenéticas em comemoração, pronta para dar sequência em seu plano, enquanto arrancava os sorrisos mais rendidos que o casal poderia dar.

Os olhos acinzentados de Lia lacrimejaram pequenos enquanto Eloáh corria até Severus com as mãozinhas em frente a boca, tendo extremo cuidado para não produzir nenhum som que pudesse acordá-lo antes da hora — mesmo que seus sapatinhos não fossem tão discretos ao bater contra o chão.

— Feliz anivesálio, papai! Feliz anivesálio!

Ver ela tão confortável, chamando-os de “mamãe” e “papai”, permitindo-se estar cada vez mais próxima física e emocionalmente, fazia transbordar o peito da mulher. Era sempre muito bonito e reconfortante olhar para todo o processo de adaptação da menina. Desde o início agiram com extrema compreensão e paciência, sem nunca pressioná-la, apenas demonstrando o carinho que eles sentiam e mantendo os braços abertos, para quando ela quisesse aceitar.

Portanto, fora uma alegria imensa quando Vivianne, a responsável pelo processo de adoção de Eloáh, entrou em contato com Aquila para comunicar que, graças à insistência da criança, a solicitação fora aceita e a pequena poderia estar com o “novo papai” no dia do aniversário dele.

E, é claro, logo mais, em todos os dias do ano — Lia lembrou.

— Mas moicego não doime detado. — Eloáh resmungava, acusando-o de ter acordado antes do que deveria, enquanto Severus buscava a melhor forma de explicar que, apesar do apelido, ele não era um morcego, nem mesmo um vampiro.

Tão distante em seus pensamentos, com o corpo distraidamente apoiado na parede do quarto, a Senhora Snape via o homem fielmente dedicado ao teatrinho que haviam planejado. Ele estava acordado há numerosos minutos, mas fazia questão de fingir que não, apenas para que a bruxinha pudesse acordá-lo como tanto queria. Com seu sorriso bobo, nem mesmo notou quando fora flagrada admirando sua família.

— Por que não chama a mamãe para deitar aqui com a gente? — A voz suave a trouxe de volta, com a coberta erguida e um sorriso apaixonado.

Não demorou para que Eloáh fosse buscá-la, entregando-a aos braços de Severus e se aninhando aos dois, num abraço carinhoso e quentinho, perfeito para aquele nove de janeiro.

de ponta 𝘥𝘦 cabeça ; sevlia.Where stories live. Discover now