chapter one.

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Scott abriu os olhos.

As vozes ao longe não o incomodavam, na verdade, eram quase distantes o suficiente para ele sequer as escutar, mas ele sabia que Kojj dispersava a multidão com seu uniforme policial, que Akino deslizava atento a caneta pelo bloquinho de couro com as palavras do padre e que Bastet fotografava a cena. Ele desviou os olhos para cima, mexendo pouco a cabeça. O corpo de uma noviça flutuava acima da entrada da igreja, preso à mureta da varanda do segundo andar. Rangia ao balançar para frente e para trás. O flash da câmera iluminou o rosto inexpressivo da moça, e Scott se atentou aos detalhes. Uma faixa cobria seus olhos da mesma forma que outra cobria os seios, e um pedaço de pano branco fora amarrado em sua cintura para cobrir as partes de baixo. O peculiar, entretanto, eram as asas. Suas costas foram totalmente dilaceradas, e a pele, junto da carne, era erguida com os braços para simular asas de anjo.

— Ela esteve devota em fé durante toda vida para, na morte, ser transformada em um ser divino.

A voz de Fit preencheu o vazio de sua cabeça e o fez desviar os olhos para o homem. Ele tinha uma feição difícil de decifrar, talvez fosse sua forma de expressar um certo luto. Scott voltou a olhar para a moça, ponderando agora o que foi dito pelo mais velho.

— O que você acha?

Scott pensou.

— Não parece uma coincidência a vítima ter uma ligação direta com a religião e ser exposta dessa forma em uma igreja. — sua voz era calma, Fit prestava atenção. — Mas ele não a matou aqui. Não há qualquer resquício de sangue além do pouco que pingou do corpo dela. — Scott apontou para o chão e então para o corpo. — Ele se preocupou em cobrir suas partes. Expôr uma noviça nua seria grotesco demais para ele. Ele respeitou a vítima, teve cuidado para não a deixar numa situação humilhante. — o agente se virou, observando ao fundo, atrás do altar, a imagem de Jesus pregado à cruz. — Ele podia imitar a forma que Jesus fora colocado na cruz, mas quis algo mais próprio.

A cabeça de Jinki surgiu da mureta do segundo andar, acima do corpo pendurado. Pareceu observar a cena de cima e então se apressou a desamarrar as cordas que suspendiam a moça. Akino se aproximou batucando a caneta sobre a capa do bloquinho. Fit nem precisou perguntar nada.

— Irmã Anne, 24 anos. Fazia suas rezas noturnas na igreja todos os dias, mas não veio ontem. O padre disse que esperou por ela até por volta das dez horas, que fechou a igreja quando viu que ela não vinha e, de manhã, a encontrou... assim. — Ele evitou olhar para o corpo, mas indicou-o com a caneta. — De acordo com ele, ninguém mais tem a chave da igreja além da madre, e ela está de viagem, mas achamos sinais de arrombamento na porta de trás.

— Para onde leva a porta de trás?

Akino tremeu.

— Para o cemitério, depois à floresta. É cercado por muros e tem um portão de ferro com correntes e um daqueles cadeados grandes.

— Você não acha difícil pular o muro carregando um corpo? — Fit cruzou os braços enquanto se virava para Scott, que pareceu pensativo.

— Pode ser, mas pode ser que ele tenha recebido ajuda, ou sequer pulou os muros. Ele podia já estar dentro, apenas escondido. — Scott abaixou a cabeça por alguns segundos para então se virar para Akino. — O padre esteve o tempo todo aqui?

— Ele disse que esteve na sala dele. Anne era a última a frequentar o lugar, então sempre o avisava quando terminava para fecharem a igreja juntos.

Método Anjo.Where stories live. Discover now