Quem diria que a escola seria difícil

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Ficou satisfeito consigo por ter estudado algumas poucas coisas de matemática (que acabou percebendo que conseguia relembrar se praticasse mais) e adiantou uns resumos, pois no quadro de horários, a próxima aula seria dois tempos de português/literatura e uma de redação.
Os livros recomendados eram aqueles chatos, típicos de concursos públicos, mas estavam atualizados e ele não conhecia a grande maioria.
Apesar de ter se formado em pedagogia, não era muito conhecido por ser um grande leitor.
Ou estudante.
Andou um pouco mais devagar que o normal, já que ele agora sabia onde ficava sua sala, mas percebeu que os corredores estavam mais vazios e para falar a verdade, não tinha ninguém ao seu redor.
Olhou o relógio e viu que faltava apenas dois minutos para a aula começar e quando chegou na classe, estava completamente vazia.
Primeiro, olhou novamente o número da porta para ter certeza de que estava no local certo e sim, ele não errou. Então, pegou o celular para questionar os outros alunos, mas algumas mensagens já estavam sendo enviadas, com alguns dizendo quão chato era a reunião de boas-vindas obrigatória.
Reunião de boas vindas?
Sentiu seu rosto empalidecer e começou a andar tentando olhar os papeis com rotinas e programações da escola, mas nenhum informava nada sobre qualquer evento que fosse ocorrer hoje.
Antes que pudesse entrar em pânico, uma senhora baixa e carrancuda aparece no início da escada e para desespero de Wel, ele viu que era Rosa.
-claro que você não estaria lá – a voz rouca de fumante que ela tinha o deixava exasperado – e eu decidi vir pessoalmente procurar por você.
-bom, ninguém informou que haveria uma reunião – respondeu rápido demais, sem perceber o seu erro.
-Ah... – ela fingiu encanto – o principezinho não foi notificado? Que falha nossa! – ela começou a andar até ele e o segurou pelo braço, como se ele fosse algum tipo de criminoso – era só o que me faltava mesmo...
E antes que pudesse fazer qualquer coisa, eles chegarem a uma porta dupla e empurrado por ela, ele entra e vê um grande auditório, daqueles parecidos com anfiteatros, completamente lotado de alunos.
No palco, que ficava bem à frente da entrada onde ele estava sendo segurado por Rosa, um homem calvo e alto falava em um microfone, fardado como os outros policiais, porém com mais insígnias no peito.
Havia uma longa mesa, recheada com o que deveriam ser professores e os outros policiais (que ele descobriu que apenas faziam inspeção pela parte da manhã).
-desculpa, coronel Almeida. Encontrei esse aqui tentando fugir da reunião.
O coronel (que na verdade era uma espécie de diretor ali) mal teve tempo para reagir, quando Welleson se soltou do aperto forte de Rosa e começou a falar:
-fugir? Onde estamos? Na cadeia? Eu só não sabia que ia ter a reunião.
Mais uma vez sua língua afiada o meteu em problemas e percebeu isso, quando o local todo foi preenchido por arfadas surpresas e Rosa, que parecia que estavas prestes a explodir em raiva.
-o que disse? – o Coronel tinha uma cara tão seria que isso fez o rapaz congelar em seu lugar, como se tivesse a morte em pessoa a sua frente, pronta para lhe levar.
-perdoe-me. Eu não fui informado sobre esta reunião e me perdi procurando por ela. Não vai acontecer novamente.
-espero mesmo que não – apesar de ter uma aparência cruel, o Coronel não parecia muito interessado em Welleson – Rosa, depois oriente melhor o aluno novo.
Ali, olhando para a inspetora, ele percebeu que havia feito uma inimiga para vida toda, pois tinha certeza que ela esperava que Welleson fosse repreendido pelo diretor na frente da escola toda e isso não acontecera.
Viu um local vazio numa seção não tão alto e enquanto o Coronel voltava a falar, ele se ocupou em subir até lá, mas nas poucas vezes em que olhava para cima enquanto subia, ele percebeu que ninguém estava prestando atenção no diretor e sim nele.
Sentiu seu rosto ruborizar com a atenção e tentou apressar o passo, mas não muito para não tropeçar nos degraus e logo tratou de sentar.
Tentou focar no homem calvo que repetia todas as mesmas baboseiras que ele já tinha lido no panfleto, mas seu coração ainda batia forte demais com o ocorrido.
E ainda era seu primeiro dia de aula.
Olhou alguns rostos familiares no painel de professores e encontrou Patricia olhando para ele e tentando segurar o riso, mas a maioria dos mestres (que também o miravam) pareciam resignados.
O painel de policiais era um borrão cinza e jovem e ele só percebeu Costa o mirando um tanto curioso, pois dali, era o único que o mirava.
Não sabe dizer se gostou disso ou não.
Depois de um interminável discurso e de várias outras chatices que duraram uma hora, eles foram liberados para irem para casa e enquanto a maioria dos alunos se apressava para sair o mais rápido possível dali, ele andou devagar, indo até o palco onde o Coronel respondia o cumprimento de alguns poucos alunos, de forma mais simpática do que o esperado para esta corporação.
-Coronel Almeida – ele começou quando o fluxo diminuiu – eu venho novamente para me desculpar. Não costumo ser um aluno tão desleixado e...
-calma, aluno Paixão – ficou levemente surpreso com ele dizendo seu sobrenome, mas lembrou que estava grudado em seu peito – apesar de sermos severos, não costumamos punir por um erro nosso. Inclusive, não precisa ir até a sala de Rosa.
-ciente, senhor – ele tentou soar o mais formal e profissional possível, sem saber se estava exagerando ou fazendo um bom trabalho.
O coronel olhou para os lados e percebendo que ninguém estava tão próximo, chegou mais perto:
-Claudio, o homem que o colocou aqui, é meu irmão, veja só você como o mundo é pequeno. Ele me informou que seu tio é um homem de muito profissionalismo e respeito, fazendo um sacrifício para levar a educação para longe. Isso é admirável e certamente foi o que ajudou a entrar aqui. Relevarei a situação hoje, apesar de incomum fazermos isso, pois como disse, foi mais erro nosso que seu, mas peço que não se meta em muitos problemas. Não quero que comecem a desconfiar de sua entrada aqui e certamente não podemos chamar muita atenção. Estamos combinados?
Apesar de gentil e com voz suave, algo no pedido de Almeida soava mais como uma ordem de estado, algo que jamais poderia ser questionado ou inviolável.
Quase como uma ameaça.
Welleson não apostaria para saber se era ou não. Apenas balançou a cabeça de forma oficial e saiu pela porta dupla, onde Hugo estava encostado do lado de fora e o aguardava.
-desculpa não ter avisado da reunião – ele parecia sincero – mas é um trote que os veteranos insistem em fazer nos novos alunos e se descobrissem que eu o avisei, poderia ser ruim... para nós dois.
-eu poderia ter levado uma advertência ou algo parecido... foda-se o que alunos iriam fazer conosco. Achei que você era legal.
-fala isso porque não sabe como podem ser cruéis.
-não interessa, Hugo. Isso aqui é a porra de uma escola. Existe um caralho de um mundo lá fora que é incrivelmente maior que isso. Aguente a porra de um ano e verá que tudo que passou aqui não significa nada. Esses merdas deixarão de existir na sua cabeça em dois meses de faculdade, acredite em mim.
E começou a andar, virando-se e procurando a direção da saída.
-por que acreditaria? Tu por acaso já fez faculdade? – a pergunta saiu como uma piada.
-Hugo, me faça um favor e não fala mais comigo.
Conseguiu deixar o rapaz para trás e quando finalmente encontrou o portão de saída, o pátio antes dele estava lotado de alunos e a maioria parou para olhá-lo enquanto caminhava.
Sabia que não era possível que todos estivessem no auditório e tivessem visto sua ceninha, mas percebeu que as fofocas corriam rápido por essa escola.
Estava um tanto saturado, irritado e cheio daquilo tudo.
Com certeza iria desistir.
Não precisava passar por aquilo novamente.
Ele era a porra de um adulto! Como pode achar que conseguiria passar por essa experiencia de novo e se saísse bem? Não existe chances dele receber ordens como uma criança e com certeza não queria lidar com elas.
Caminhou até o ponto de ônibus, torcendo para que alguém zoasse ele ou algo parecido, para poder descontar sua raiva ou algo assim, mas a única coisa que lhe aconteceu, foi uma mão segurando seu ombro e enquanto ele se virava furioso, preparado para atacar, viu que o policial Costa estava ao seu lado.
-não esqueça sua boina, aluno.
Welleson o fitou como quem não entende algo, preparado para mandar ele se fuder, mas finalmente entendeu e também se conteve, pois nunca que iria perder seu réu primário por causa daquilo, então riu como quem acha tudo aquilo uma grande bobagem.
-nem sei se vou voltar, então não me importo em usar esse chapéu irritante.
-você não me parecia alguém que desiste rápido.
-e você não me conhece – começou a andar ignorando o policial, como se aquilo não fosse perigoso – não entende como minha vida está uma bagunça e sinceramente, tenho mais com o que me preocupar do que um chapéu.
-o nome, aluno, é boina e enquanto estiver matriculado em nossa instituição, terá de respeitar nossas normas – não esperava que o policial fosse segui-lo, até porque nem queria que o fizesse, então parou novamente para evitar problemas – por favor, coloque a boina.
-porque você está sendo atencioso comigo? – percebeu alguns olhares para eles – serio, você deveria me prender. Eu tenho sido um babaca desde que pisei aqui. Sabia que não era uma boa ideia. Maldito dia em que fiz aquele desejo!
-você parece confuso com algo, isso é obvio – a forma como o policial mudava suas expressões: de zangado para compreensivo tão rapidamente deixava o rapaz atordoado – mas não deixe suas emoções falarem mais alto. Vá para casa, pense com calma e então decida se realmente quer voltar ou não. Observei você durante o dia. Vi que não quis ofender Rosa e Marques nunca pediu para adiantarem uma autorização da biblioteca para ninguém. Se ele o fez, é porque acreditou que você tem potencial e isso porque você mostrou que tem. Pode até desistir e decepcionar a todos, mas pense no principal: se não estará decepcionando você mesmo.
Ele falou tudo isso, sem encostar ou chegar mais perto, mas Welleson sentiu suas palavras com força, quase como se o próprio Universo estivesse falando com ele.
Mas podia ser, certo? Quando em sua vida teve tantas chances e quando todos foram tão compreensíveis e legais com ele, sem nenhuma intenção por trás disso? Não podia ser tão mesquinho e estupido a ponto de ignorar tudo isso e desistir tão facilmente a ponto de nada.
-e coloque sua boina. Último aviso – agora, Costa estava sério como se fosse prender um bandido e enquanto Wel ria como uma besta e colocava o acessório, o policial sorriu para ele finalmente, deixando seu rosto ainda mais jovem e até bonito.

Tudo Que For Possível Fazer (Trilogia dos Desejos #2)Onde histórias criam vida. Descubra agora