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"'Se eu não conseguir escapar desta casa', ele pensou, 'sou um homem morto!'"

Robert L. Stevenson, A Flecha Preta

MÍRIEL BLACKWOOD NÃO TINHA UMA VIDA que poderia ser chamada de feliz

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MÍRIEL BLACKWOOD NÃO TINHA UMA VIDA que poderia ser chamada de feliz. Quando tinha seis anos seus pais conseguiram se divorciar; na verdade, sua mãe insistira tanto no divórcio que os sacerdotes do templo aceitaram por já estarem cansados. O motivo? Um dia, seu pai a proibira de sair para trabalhar, dizendo que, como era sua mulher, se fosse contra sua vontade estaria em "desobediência" aos olhos dos deuses, pois desrespeitaria a palavra de seu marido — que deveria ser a última.

Após isso, Míriel passou a morar com sua mãe, que trabalhava como professora em Mystic Valley, a cidade em que tudo isso se passou. Durante um ano foram felizes, apenas mãe e filha, até que seu pai casou-se novamente com uma mulher três anos mais jovem; ela era diferente, tão diferente de sua mãe: tinha os cabelos loiros, olhos castanhos, uma voz sempre alta demais, e gostava de usar ouro no pescoço, nas orelhas e nos dedos. Não demorou muito para que ela desse à luz a um filho varão, um menino oito anos mais novo que Míriel, seu meio-irmão.

Seu pai se tornou proeminente na cidade graças ao temperamento extrovertido da segunda esposa, e os parentes não tardaram a comentar sobre como Sabrina, madrasta de Míriel, era tão superior à Rhiannon, mãe de Míriel. O pai e a madrasta tinham até mesmo lugares na frente do templo, onde os sacerdotes diziam "Esses são abençoados pelos deuses!", e sempre abençoavam seu meio-irmão.

Para invocar a aparência de pai perfeito, ele passou a exigir a presença de Míriel sempre que se reunisse com sua família ou a de Sabrina, e também cobrava sua presença sempre que fosse ao templo, assim ficariam todos lado a lado, uma família feliz.

Mas essa não era a família de Míriel, ela sabia disso, sua família era sua mãe.

Conforme os anos foram passando, seu pai pressionava tanto que parecia conseguir afastar sua mãe, e sua madrasta parecia cada vez mais tentar fazê-la trilhar caminhos diferentes do que aqueles que seguia com sua mãe. Tornava-se claro que pretendia tomar-lhe o lugar, ao menos aos olhos daqueles de fora.

Sabrina no início parecera gentil, mas a todo momento tentava muda-la, a rebaixando enquanto exaltava seu próprio filho.

Míriel não demorou a entender o que era: apenas a filha do primeiro e fracassado casamento de seu pai, uma menina que não poderia passar para frente seu sobrenome, tímida, que não falava com ninguém e estava fadada à murchar na sombra do filho de Sabrina.

A madrasta apresentou a solução dizendo que seria melhor que Míriel casasse cedo, pois um marido poderia fazê-la ser mais alegre, e sua natureza tímida a faria ser submissa: o que todo homem queria.

O homem escolhido foi Sebastian Yarwick; rico, inteligente, estava sempre presente para as comemorações e eventos no templo, e era amigo de todos os sacerdotes. Aceitou o casamento, pois sabia que Míriel aprendera que uma mulher deveria ser submissa e mansa, suportar tudo em silêncio e nunca se irar; ele sabia que quando desse suas ordens, ela iria se calar e obedecer, já tivera provas disso.

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