Prólogo

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- Ao menos eu poderia saber onde estou ... - pensou, constatando que não havia uma saída. Não queria estar ali, na verdade, não sabia como havia chegado lá.

Ela lembra que havia chegado em casa depois de um cansativo dia de estudos, e depois de se banhar e trocar as roupas, sentiu um dos diversos "flashs" que sentia desde os 8 anos de idade e desde então não parou de acontecer, sentiu uma dor excruciante na cabeça e então foi tomada pela escuridão da inconsciência.

Acordara ali, há algumas horas, nas quais passou analisando o local. Era extremamente sombrio e com pouca - quase nenhuma - iluminação, paredes velhas e empoeiradas, se é que aquilo eram realmente paredes. Não era uma casa, concluiu. Era um grande espaço e haviam tochas grandes com um fogo intenso, a única iluminação do local. Entre as tochas maiores havia um tipo de trono, majestoso, cinzento, decorado com pequenas caveiras e com minuciosos detalhes típicos de séculos passados.

Reparou também no grande portão ao longe, como ele era imponente, e nas estátuas de gárgulas. Tudo naquele lugar era incrivelmente cinzento, velho e empoeirado; como alguém vivia num canto como esse? E a pergunta interna mais feita por ela hoje: Porque estava ali?
Ouviu um rangido estridente e virou-se para ver o que era. Sentiu os músculos ficarem tensos ao ver o portão sendo aberto, mas permaneceu de pé. Viu uma figura alta, masculina, caminhar até ela. O que no início era uma sombra distorcida, se tornava um homem alto, bonito, de maxilar fino, cabelos pretos arrumados para o lado, com olhos azuis que pareciam analisar cada canto de seu rosto, vestido em um terno, calças e sapatos sociais pretos. Ofereceu à garota um sorriso de canto, sedutor e ao mesmo tempo, intimidador.

Ela sentiu-se ligeiramente desconfortável com suas calças de lavagem escura, camisa do Iron Maiden e seus AllStars surrados, mordendo o lábio inferior. Olhou para cima a fim de encará-lo; não que fosse pequena, pois tinha lá seus 1,70, o homem que era alto, parecia ter mais que 1,90. Os dois se encararam, ambos de olhos azuis penetrantes, com a mesma cor de cabelo: um negro azulado, e o mesmo tom de pele: pálidos. Eram parecidos, ela não podia negar, e isso a deixava intrigada, mais do que já estava. Resolveu abrir a boca, não aguentava mais aquele silêncio sombrio.

- Quem é você? - perguntou em um fio de voz, não falava por horas e sentiu a garganta seca.

- Quem sou eu? - ele questionou novamente, e riu como se tivesse escutado a coisa mais engraçada que já escutara, fazendo-a arquear uma sobrancelha para o homem à sua frente. - Chamo-me Lúcifer. - disse, enfim.

- Não brinque comigo. - ela respondeu, ríspida. Não tinha ideia de quem era aquele louco que dizia ser o demônio.

- Olhe para mim. - disse com expressão séria. - Tenho cara de quem está brincando? Porque eu faria brincadeira de uma coisa dessas? - encarou-a, e ela viu de relance um brilho vermelho naqueles olhos azuis.

- Então... - balbuciou com dificuldade. - Você é mesmo Lúcifer?

- Sim, sou. - ele sorriu largamente, exibindo uma fileira de dentes brancos e alinhados. - Mas você, querida... - pegou a delicada mão pálida da garota e levou-a aos lábios, depositando nela um beijo demorado e cheio de ternura. - Pode me chamar de Pai.

- Como assim, "Pai"?! - ela perguntou atordoada, puxando a mão num movimento brusco.

- Sabe, aqueles que doam os genes Y para os filhos e determinam o sexo deles e... - foi interrompido.

- Eu sei o que é um pai e quais são suas funções mas, eu nem te conheço, como posso ser sua filha?! - perguntou.

- Ah querida, é uma longa história. - suspirou e passou a mão pelos cabelos. - Mas, veja bem, somos parecidos, não?

Com isso ela tinha que concordar, até o brilho no olhar eles tinham. Porém, existiam muitas pessoas parecidas no mundo, não é? Essa poderia ser mais uma coincidência infeliz. Aparentemente, ele não parecia mentir, mas como acreditar no próprio demônio, que aliás estava em sua frente e alegava ser seu pai?

Sua mente girava como um carrossel, enxergava memórias de um passado nem tão distante, se via perdida num labirinto interno, havia tanto para perguntar, mas nenhuma palavra parecia querer sair. Então, tudo o que viveu foi uma mentira? Seus pais não eram seus pais? Encarou-o, absorta em pensamentos, e ele lhe lançou o olhar mais terno que podia.

Resolveu começar com a pergunta mais simples:

- Onde estamos?

- No inferno. - respondeu apenas, num tom calmo, como se estar no inferno fosse algo normal. Bem, pra ele era.

A Filha De LúciferOnde histórias criam vida. Descubra agora