Sussurros no Jardim

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Lysander Grimshaw abriu os olhos lentamente, despertando mergulhado na penumbra matinal. Os primeiros raios de sol esgueiravam-se pelas cortinas pesadas, revelando uma atmosfera carregada. As sombras dançavam pelas paredes de madeira escura, enquanto a lareira ainda lançava seu calor sutil.

O quarto, adornado com tapeçarias antigas e móveis elegantes, testemunhava a passagem de séculos. Lysander sentia o peso da história da família Grimshaw em cada móvel, em cada retrato a óleo nas paredes. Levantou-se com uma graciosidade que denotava treinamento militar, vestindo a capa negra que o transformava em uma figura ainda mais enigmática.

Ao caminhar pelos corredores silenciosos, os criados evitavam seu olhar penetrante, deixando-o imerso em seus próprios pensamentos. Lysander parou diante de um retrato antigo de um ancestral que guardava segredos que ecoavam através dos séculos. Um sorriso enigmático curvou seus lábios enquanto seus olhos fixavam o retrato, como se a pintura guardasse respostas para suas próprias dúvidas.

O cheiro do café recém-preparado flutuava pelos corredores, guiando até a sala de jantar. Lá, ele se sentou solitário, contemplando a chama tremeluzente das velas enquanto dedilhava as páginas de um livro.

Enquanto saboreava o amargo café, Lysander  mergulhava em lembranças do passado. Memórias de batalhas distantes e juramentos de lealdade ecoavam em sua mente como fantasmas do tempo. Seus olhos, normalmente tão serenos, agora refletiam um misto de determinação e melancolia.

Uma carta selada repousava sobre a mesa, trazendo consigo notícias de terras distantes. Lysander quebrou o selo com a mesma calma que dominava suas ações, desvendando palavras que acendiam uma faísca de inquietação em seu interior. Um chamado para retornar a uma vida que ele havia deixado para trás, mas que parecia agora bater à sua porta.

A mansão, antes silenciosa, ecoava com os passos apressados dos criados, preparando-se para o dia. Lysander levantou-se, deixando a carta sobre a mesa. Seus olhos cruzaram com os do retrato ancestral, como se a figura pintada o desafiasse a enfrentar os mistérios de seu destino.

Saindo para o pátio, ele selou seu cavalo, um companheiro de jornadas e confidente. Os raios do sol da manhã filtravam-se entre as árvores centenárias, criando padrões de luz e sombra no solo. Ele montou, encorajado a um passeio pelos jardins grandiosos da mansão.

Ele conduziu seu cavalo através da trilha serpenteante que cortava os majestosos jardins que circundavam sua mansão. O aroma do orvalho da manhã se misturava ao perfume das flores antigas, criando uma atmosfera de encanto e nostalgia.

O cavaleiro contemplava as estátuas de mármore que pontuavam o caminho, rostos petrificados de antigos patriarcas Grimshaw que o observavam com olhares severos e sábios. A brisa suave acariciava sua face, enquanto as folhas das árvores centenárias sussurravam segredos guardados.

Ao alcançar a fonte de mármore no centro do jardim, Lysander deteve-se. As águas cristalinas fluíam suavemente, ecoando uma melodia que ressoava com os segredos que ele guardava. Ali, sob a copa das árvores antigas, ele ergueu os olhos para o céu, como se buscasse respostas nas nuvens que pairavam acima.

Descendo de seu cavalo, parou a observar atento o canto dos pássaros que criavam um ambiente especialmente calmo e melancólico.
Dentre essa sinfonia majestosa da natureza, um som baixo e sinfônico começou a tocar, era a voz de uma Jovem, em um canto frio e doce.

Curioso, guiou-se em direção à melodia que emanava da margem de um lago escondido por uma parede de rosas floridas ao longe do jardim.
Ao contornar a parede de pétalas, deparou-se com um cenário de encanto. O lago refletia os raios de sol, criando um brilho dourado na água. Uma donzela, etérea como uma visão de sonho, banhava-se em suas águas cristalinas, nua envolta apenas pelo véu da natureza.

Seus cabelos escuros e úmidos, caíam como cascata sobre os ombros, enquanto ela cantava uma melodia antiga e hipnotizante. As gotas d'água deslizavam por sua pele como pérolas.
Lysander envergonhado por sua nudez, voltou seu caminho, apenas ignorando oque acabara de ver.

Lysander sentiu o calor das faces subindo, enquanto a vergonha se instalava como uma sombra fugaz. Era como se o véu que escondia sua própria vulnerabilidade tivesse sido momentaneamente levantado. O cavaleiro, por um instante, vacilou em sua determinação, questionando a audácia de ter testemunhado uma cena tão íntima.

Contudo, a chama interior queimava mais forte do que a fugaz vergonha. Lysander, com a postura ereta que caracterizava seu orgulho, recusou-se a permitir que o constrangimento dominasse seu espírito. desculpando-se silenciosamente consigo mesmo pelo breve momento de invasão.

Ao entrar na majestosa entrada da mansão, as tapeçarias antigas e a atmosfera rica em história pareciam envolvê-lo, como se o próprio lar compreendesse a complexidade de seus pensamentos. Lysander se dirigiu à sala de estudos, onde pergaminhos e mapas aguardavam sua atenção.

Diante das tarefas diárias, o cavaleiro mergulhou nos deveres que o aguardavam, deixando para trás o canto enfeitiçante do lago e a visão da donzela misteriosa. No coração de Lysander, entretanto, permanecia a lembrança da melodia e a beleza da dama.

Após horas imerso em seus deveres na sala de estudos, Lysander recostou-se em sua cadeira, as velas lançando sombras dançantes nas paredes adornadas. O murmúrio dos pergaminhos e o arranhar da pena sobre o papel ecoavam, mas sua mente não estava completamente entregue às tarefas diante dele.

A imagem da donzela, sua canção e o lago cintilante persistiam como um eco persistente em sua mente. Lysander, um homem de poucos sentimentos conhecidos, se viu questionando o porquê dessa intrusão inesperada. Seus pensamentos, normalmente focados em estratégias e deveres, agora se desviavam para a presença enigmática que encontrara na margem do lago.

Ele contemplou a reflexão em um espelho polido, observando os olhos profundos que revelavam mais do que ele gostaria de admitir. A solidão, que havia se tornado uma companheira silenciosa ao longo dos anos, parecia adquirir novas nuances naquele momento de introspecção.

"Por que ela persiste em minha mente?" Lysander murmurou consigo mesmo, questionando a própria resistência aos sentimentos. Ele sempre se orgulhara de ser um homem de lógica e disciplina, mas agora se via envolto em pensamentos que se desviavam do esperado.

A solidão, até então abraçada como uma armadura, começou a revelar suas rachaduras. se perguntava se a presença da donzela no lago havia tocado algo adormecido em seu coração, algo que a rigidez de suas responsabilidades havia mantido escondido por muito tempo.
Seria sua nudez? Sua beleza? Ou seu canto inigmático?

Com um suspiro, ele retornou aos afazeres, mas a semente da dúvida havia sido plantada. Enquanto traçava linhas nos mapas e assinava documentos, Lysander Grimshaw reconhecia que, mesmo para um cavaleiro endurecido pelo tempo, a solidão poderia ser uma ferida que, uma vez aberta, revelaria um lado mais humano e vulnerável.

Lysander GrimshawOnde histórias criam vida. Descubra agora