Capítulo 02 - Localização

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Eu fecho os olhos, buscando uma fuga da tormenta que se instalou em cada canto da minha existência

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Eu fecho os olhos, buscando uma fuga da tormenta que se instalou em cada canto da minha existência. Parece absurdo que até mesmo os recônditos mais íntimos da minha vida se transformem em locais de perturbação. Essa angústia, arrastando-se desde os primeiros suspiros da minha infância, é uma corrente que percebo ser interminável. Será demasiado pedir por um momento de silêncio, um breve vislumbre de vazio, um lampejo de paz? São poucos os indivíduos que desfrutam da verdadeira liberdade; muitas vezes, não somos meros escravos das nossas escolhas, mas sim cativos da nossa herança.

Seria desonesto da minha parte negar o fascínio que o poder exerce sobre mim e tudo o que ele acarreta, mas o poder também exige seu tributo, sempre alto, e, não importa quão exorbitante seja, a dependência dele nos obriga a pagá-lo incessantemente, dia após dia, ano após ano. A consciência de que, em algum momento, serei incumbido de gerar outro ser que assumirá esse fardo, perpetuando esse ciclo, pesa mais sobre mim do que eu gostaria de admitir.

Pressiono a testa com a ponta dos dedos, pronto para enfrentar o restante da tarde, ciente de que há muito a ser feito para me permitir o luxo de perder tempo com reflexões que não me conduzirão a lugar algum. O caminho é único, indiferente à minha vontade ou desinteresse. Não há escapatória. O som que marca o início de tudo me arranca dos devaneios. A porta se abre com rapidez, revelando passos apressados que reconheço bem, respondendo à pergunta inicial.

Nunca houve espaço para o vazio na minha vida, e é possível que nunca exista.

Estalo o pescoço antes de dirigir minha atenção para a figura que se acomoda na cadeira à minha frente, sua expressão notavelmente grave indica uma tensão incomum. Meu irmão gêmeo é, sem dúvida, um prodígio. Não hesito em reconhecer que boa parte das estratégias criativas e completamente singulares que impulsionam nossa organização são fruto de sua mente.

São justamente essas estratégias que nos têm conduzido ao sucesso desde que assumi o comando. Gael não possui o perfil tradicional de um líder: é verborrágico, excessivamente compassivo e carece da disposição necessária para lidar com a burocracia inerente ao cargo. Além disso, é extremamente debochado e não raro seus comentários sarcásticos fazem parte de sua comunicação. Mas não falta a ele uma inteligência que supera em muito a média. O que me falta, ele possui, e vice-versa. Éramos, afinal, duas metades de um todo singular.

Observo a expressão tensa do meu irmão. Gael raramente fica em silêncio, raramente demora ou sequer pensa antes de falar, e raramente fica nervoso. Não obstante, é raro vê-lo assim, das poucas vezes que aconteceu, o assunto era o mesmo, e saber disso me faz ficar igualmente nervoso e ansioso. Engulo em seco, criando a coragem para iniciar essa conversa.

— Aonde? — Falo e ele me encara, batendo os dedos com certa força na mesa de mogno.

— Tampico!

— Tem certeza? — Pergunto, sentindo um acelerar no coração. Não era de hoje que Gael fazia essa investigação, e apesar de termos uma equipe que poderia assumir as buscas, ainda assim considero pouquíssimo provável que alguém além de Gael consiga encontrar a localização que buscamos.

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