Busquei os seus olhos na esperança de me encontrar naquelas pupilas dilatadas que me olhavam. O desconforto de ver, de fato,
o meu reflexo naquela janela me assolou, pois via pouco de mim; o que a minha aparência diz sobre quem sou? Porque teus olhos não podem refletir o meu âmago? Já que o toca toda noite, pois então, deveria o ver também. És injusta, Lógica.Deitado em meu peito, me observava.
Será que sabia da tormenta que assolava? Notava-me? Estava comigo, mas por quê? Para e me diz, está por estar, por cansaço de continuar caminhando sem companhia, ou está porque me encontrou no caminho e quis me levar para o teu destino? Ao menos me perguntou antes de me puxar?
Eu diria sim. Mil vezes, diria sim. Minha caminhada insistente não tinha norte, nem sul, me levava para os lugares que o sol banhasse, isto é, todos eles. Passei por matas, cidades e desertos, rios, lagos e oceanos. Se hoje te digo que já vi de tudo, te tenho confuso. Nunca questionou-me, mas sei que vai, o porquê de eu ter escolhido seguir o teu caminho. Eu, uma alma livre, uma folha seca guiada pelo vento. Talvez tenha sido ele que me levou até você, Minghao.
Escolhi como destino os teus braços, sorriso e teu amor por não aguentar mais andar sem ter onde chegar. Você tinha um ponto de parada: a paz que tua cidade natal te proporcionava.
Passei por tantos asfaltos, odiei as ruas fechadas, somente para hoje não me importar com as casas com meias-paredes. Queria ser o lugar onde você sempre irá desejar voltar e descansar os seus ossos após um longo trajeto.
— O que há? — Perguntou-me, sonolento.
Suas pálpebras se fecham suavemente sob teus globos oculares que amo mais que minha própria existência, que leio tão bem como se fosse a minha língua nativa.
Deixo de lado o livro de capa dura que compraste para mim pensando em como eu adoraria ler para ti enquanto o sono não nos levava embora para o meu próprio Olimpo, um lugar onde o deus supremo seria a ti, e somente a ti. Psiquê me devora os órgãos ao ser comparada por mim a você, mas ela sabe que, infelizmente, não tenho uma flecha. Não precisei disso.
— Nada. Realmente. Eu só o amo. Sabe disso, não é, Minghao?
Sabia, claro que sabia. Quem é que não sabe? Quem é que não percebe?
Sentou-se sobre mim e curvou os lábios num sorriso que você sabia ter o poder de me aquecer o peito mesmo em um inverno rigoroso. Meu calcanhar de Aquiles talvez fosse você, mas apostava todas as minha fichas naquele maldito sorriso. Ah, e esses lábios que eu deixaria pela eternidade me macularem até a alma, se assim você desejasse.
— Claro que sim. Você é louco por mim. — Se gabava por ter o meu coração na mão direita e os meus pensamentos na esquerda. — Não tens interesse em esconder esse teu amor tolo.
— Ainda há de existir aquele me convença que qualquer amor pode ser tolo.
Apesar de apaixonado, insistia em se esconder naquele casulo de ignorância. Mas eu sabia, Minghao, que era recíproco. Que tu também compartilhava comigo aquele estranho amor girassol, tão grande e majestoso, esplêndido, mas ainda assim doloroso, que não se sustentava sob o próprio caule, que estava fadado a dor por sua própria perfeição.
Eu sabia, Minghao, que as pétalas desse nosso sentimento um dia iriam se tornar pó, que iriam fazer parte de outra flor. Quem sabe constituir uma peônia ou, talvez, se morreremos afogados nas profundezas das tuas palavras brutas, uma lótus.
E por mais que inúmeros “talvez” chegassem em grandes números, sabia que nosso amor havia de se tornar a mais bonita flor do jardim de qualquer um. Qualquer um porque as mais belas pessoas não se escondem atrás de títulos. O anonimato basta para elas, além do imenso jardim que têm em suas próprias almas, esses que somente mais um anônimo poderia ajudar a regar.
— Vou confiar-te um segredo, Jun. Guarda-o contigo mesmo se eu não estiver mais aqui. Promete.
— De nada vale as promessas. Não seja bobo. — Ignorei a parte em que dizia de forma lícita que iria embora.
— E o que vale o amor? O que vale as palavras se não confiarmos nelas? — Calei-me diante a sua mania de sempre parecer certo. Ouvi teu suspiro. — Promete, Junhui.
— Não conto a ninguém. Prometo.
E a quem eu contaria?
Se aproximou mais de mim, passou as mãos sob os meus olhos e os fechou. Sempre fazia aquilo. “Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.”, O Pequeno Príncipe.
Eu decorei cada linha daquele livro apenas porque você disse ser o seu favorito quando criança.
Em meio ao som do silêncio que estávamos mergulhados, me segredou algo que eu desejava gritar ao mundo, mas que agora não podia. Havia prometido ao meu girassol não contar a mais ninguém seu segredo:
— Eu também o amo.
Se afastou logo após.
Virou-se de costas para mim, encarando o lado oposto. Não dormia, nem fingia estar dormindo. Apenas estava ali, quieto, quase alheio a tudo o que aquela palavras mexeram aqui dentro. Quase.
O abracei por trás, lhe beijando a nuca. Não chorava nem nada, como ele, também estava apenas ali. Talvez não tão quieto. Quem sabe meu coração poderia estar dançando junto ao seu. Nós tínhamos o nosso próprio ritmo, nossa própria coreografia.
— Não vou contar a ninguém. É uma promessa.
Não podia de fato ver, mas sabia que você sorria.
— É teu agora.
— O quê? — perguntei. — O segredo?
— O meu coração.
Me perguntei se já não era.
© jungwooppy, 2024.
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𝗮𝗺𝗼𝗿 𝗴𝗶𝗿𝗮𝘀𝘀𝗼𝗹 | 𝗃𝗎𝗇𝗁𝖺𝗈
Fanfic🌻' Jun(hui) + (Ming)hao Vivendo um amor autodestrutivo, mas belo. › Baseado no conto "Girassol" de Caio Fernando Abreu.