Maria.

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-Calma falta pouco agora. João estava me guiando pela mata adentro, com a promessa de que encontraríamos uma casa de madeira logo adiante, o que pela demora, estava começando a duvidar.

-João, por que temos que nos esconder? Vamos voltar para casa agora!

-Não podemos voltar Maria, não viu como o pai falou? Percebeu como ele estava assustado? Vamos passar a noite aqui, depois voltaremos.

Ele disse isso entre sussurros e não perdendo o ritmo apressado. Eu não estava segura, mas não queria contradizê-lo. Para dizer a verdade, estava apavorada e podia ver que ele estava também, mesmo querendo se fazer de forte para mim. João era assim, nunca queria demonstrar fraqueza ou insegurança e parecia que todos já haviam aceitado isso, mas eu via, notava como ele apertava as mãos ao lado do corpo ou as colocavam unidas nas costas, tentando esconder o tremor. Ele conseguia enganar a todos, mas não a mim.

Conforme entrávamos no breu da floresta pude ouvir a noite. Corujas estavam acordadas e pássaros passavam como borrões de escuridão na nossa visão periférica. Apertei a mão que estava unida a dele e fomos a passos apressados, seguindo em frente para alcançar qualquer que fosse a casa que João tinha certeza que estávamos próximos.

-Estamos chegando já. Reconheço essa trilha. Está perto.

Então, como se se mesclasse a noite, ela repentinamente se materializou na minha frente. Apertei os olhos para enxergar o contorno melhor. Ela era simples, com uma porta e uma única janela na lateral. Não era grande, mas estava conservada o bastante para nos abrigar. E o mais importante, parecia vazia.

João, com uma facilidade absurda, deu um trombão de encontro à porta, me empurrando para dentro da cabana com ele e já no instante seguinte, a fechava tão rapidamente como abriu. Meus olhos se acostumaram com a penumbra e notei que ela parecia maior olhando de fora. Tinha espaço para uma mesa no centro, que já estava lascada pela umidade, uma cadeira, um caldeirão nos fundos ao lado de uma pequena cama podre.

- Vamos tentar achar alguma coberta. Não vamos poder ascender uma fogueira agora. Maria, por favor, fique calma. Vai ser só por essa noite.

Ele se aproximou e me abraçou para me acalmar, pois, ao notar que estávamos sozinhos, em um lugar desconhecido enquanto nossa casa estava sendo atacada, fui consumida pelo pânico e, se não fosse por ele, já teria começado a chorar.

- Estou bem, mas e os nossos pais? Como podemos fugir enquanto eles não estão bem? Temos que pedir ajuda na aldeia e não nos esconder.

- Não! Está muito arriscado lá fora. Todos devem estar se protegendo também. Ninguém nos ajudaria.

João pôs-se a andar, tentando achar alguma coisa que pudéssemos usar para nos esquentar. Ao dar duas voltas completas pela cabana, não achando nada em especial, ele retirou a capa dos ombros e me olhou, um pouco arrasado.

- Vamos ter que dividir.

Eu não estava me importando com nada além dos meus pais, porém aquele olhar de decepção no rosto dele me fez focar a atenção ao nosso redor e tentar tirar aquela expressão de sua face. Não havia nada. Tentei:

- Ei, está tudo bem. Vamos dividir a cama, assim ficamos aquecidos e protegidos.

Aproximei-me dele e retirei a capa de suas mãos. Comecei a arrumar a cama que não passava de palha sobre madeira, mas, naquele momento, parecia ótima. Retirei os sapatos enquanto João verificava a porta. Também retirei minha capa e me aconcheguei ao canto da parede. João, ainda cauteloso, se certificou que a janela estava fechada e veio se deitar ao meu lado. Estremeci quando a cama rangeu sob o peso dele, mas ele disse: - Está tudo bem agora. Amanhã nossos pais virão nos buscar e ficaremos bem.

Não consegui responder, pois alguma intuição me dizia que nada estava bem, mas consegui dar um sorriso. - Vamos dormir.


João e Maria.Onde histórias criam vida. Descubra agora