V. Gon

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escrito originalmente em 20 de janeiro de 2021

reescrito em 24 de abril de 2024

[🍫]

Aos dezesseis anos, Killua lhe convidou para passar as férias de verão junto com sua família ㅡ e ele deixou claro que poucas coisas boas poderiam sair de um par de semanas conjunto aos Zoldyck.
Mas não é como se Gon tivesse ido à viagem esperando menos do que alguns olhares feios e palavras ácidas.

No seu primeiro dia, pouco fez além de correr pelo pomar de tangerinas com os pés desnudos e passar longos minutos inalando o cheiro cítrico, até ter sido encontrado por Alluka e rir do chapéu espalhafatoso dela voando.
No segundo, comeu daquelas frutas como se fosse uma minhoca fazendo a festa numa colheita; deitou de barriga cheia, com seus olhos fixos nas estrelas e vagalumes dançando ao seu redor, e sorriu ao encontrar Killua dentro do labirinto de folhas chamando seu nome.
No terceiro, acharam um pequeno riacho no rancho, banharam-se na cachoeira e falaram sobre muito, ao mesmo tempo que nada.

Enquanto grilos crilavam e cigarras cantavam, o moreno passou as noites quentes que passava em claro suando, caminhando até um celeiro abafado ㅡ onde o único cavalo presente relinchava com sua presença, quase que pedindo por mais tangerinas, e nuvens faziam espirais no céu.
Numa dessas noites, ele acabou por sair do quarto que dividia com Killua para o celeiro apenas por ㅡ graças às paredes finas ㅡ, terem no quarto escutado uma discussão para qual nem deveriam estar presentes para início de conversa.

ㅡ Eu entendo que ele faça birra pra' aquela aberração estar presente, mas esse moleque nem é da nossa família ㅡ Kikyou suspirava, rodando vinho numa taça. ㅡ Se nem o pai, do próprio sangue, quis ele, por que nós iríamos querer?

ㅡ Não é com o moleque que me preocupo, Kikyou... ㅡ A voz de Silva então se fez presente, pausada para o que Gon presumiu também ser um gole na bebida. ㅡ Killua está no caminho errado.

ㅡ Hein? O que isso quer dizer?

ㅡ Quer dizer... ㅡ Uma cadeira rangiu, provavelmente simbolizando que o homem havia se levantado. ㅡ Que eu conheço meu filho. ㅡ Então, passos soaram. ㅡ Sei o que Killua quer, e sei que por isso você não deveria ter permitido que ele compartilhasse o quarto com esse garoto.

Nem a brisa da noite lhe acalmou, daquela vez, enquanto caminhava até o celeiro.
Pela primeira vez, o cavalo estava quieto ㅡ as cigarras permaneceram no subsolo, e os grilos não ousavam cantar naquele silêncio; senão pelo discreto zumbir dos vagalumes, a mudez da calada da noite teria sido ensurdecedora.
Mas as estrelas ainda fulguravam vivazes, e parecia que apenas o brilho delas seria necessário para Killua quando ele adentrou o celeiro e sentou ao seu lado naquela pilha de feno.
Seus cabelos reluziam com o brilho da lua, a lamparina de querosene era cálida na pele do rapaz e as íris safira permaneceram fixas no seu olhar. Gon reparou como os pontos da iluminação delineavam as angulações daquele rosto tão simétrico; reparou nas sombras feitas, no contato visual quebrado.
Ele reparou, mesmo, em como a ponta dos seus dedos formigou quando roçou nas do dele, ao pegar um daqueles cigarros de chocolate, e como Killua parecia tão cansado que sequer desejou imitar alguém.
Gon o entendia, estava da mesma forma.

Nenhum dos dois disse uma palavra sobre a conversa que ouviram.

Foi, incrivelmente, a primeira vez que provou o doce, mas, assim que voltaram para casa, descobriram que a marca havia parado de fábricá-los.

Cigarrinhos de Chocolate [🍫] KILLUGONOnde histórias criam vida. Descubra agora