Parte sem título 2

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Capítulo 20

Dona Albertina não via com bons olhos a aproximação constante da filha com Sara e não gostava da moça, tinha um sentimento que ela era livre e liberta demais para o seu gosto e padrões. Vinha observando e visto alguns olhares dela para Anita que a deixava inquieta e apreensiva, mas a cada dia mais parecia que Anita fazia de propósito insistindo em estar com ela. Tinha até marcado um almoço para o final de semana, em casa, mas sem a consultar. Arrumou, então, uma ida a um encontro na congregação. Uma forma de evitar o almoço, assim, mesmo sem querer ir ao evento da igreja, foi. Era um evento da terceira idade num hotel fazenda, onde sairiam na sexta e voltaria no domingo à noite. Anita contrariada desmarcou o almoço.

-Mãe, porque a senhora não me avisou que iria a esse encontro?

-Porque eu não tinha certeza se iria ou não. Resolvi hoje.

-Resolveu no instante em que falei que traria a Sara.

-Um pouco antes.

-Mãe, porque essa antipatia com a Sara?

-Mas que antipatia? Agora não posso mais sair, ter meu lazer? Tenho que ficar para agradar uma pessoa que nem sei bem quem é?

-A senhora a conhece, tenho falado dela sempre que posso e você até a encontrou na igreja outro dia.

-Tem falado até demais, acho que você anda exagerando nos elogios, não sei, mas creio que teremos alguma decepção com ela. Você sabe que quando falo dificilmente me engano.

-Pare com isso mamãe, desde quando a senhora é uma pitonisa?

-Se eu fosse você acreditaria quando falo.

-Está certo mãe, vamos parar com esse desencontro de pensar, sabe bem que não gosto quando isso acontece, depois, a Senhora fica amuada e sem falar comigo. Às vezes penso que se não fossemos mãe e filha não seriamos amigas.

-Que blasfêmia menina, de onde tirou esse pensamento.

-Mãe, tenho carinho e admiração pela senhora, mas sempre fui franca.

-Até demais.

-Pois é mãe, assim sendo temos afeto e nos unimos mais depois que papai morreu, mas antes, acho que disputávamos o carinho dele.

-Anita, eu a proíbo que fale assim, de onde vêm esses pensamentos descabidos?

-Mãezinha, a senhora sempre implicou comigo, acho até que fomos hostis em outras vidas.

-Deus perdoa minha filha, ela não sabe o que fala. Não gosto desses assuntos sobre outras vidas, reencarnação e essas coisas de vida depois da morte, isso me assusta.

-Papai sempre me orientou pelos ensinamentos de Kardec, embora a senhora não aceitasse isso, mas papai sempre foi o meu ídolo e o pensamento de que ele ainda existe, que está vivo, me traz mais conforto e alento.

-Seu pai morreu e está aguardando o retorno de Jesus.

-Não vamos discutir sobre isso. Nunca chagaremos a um acordo. Mãe, então, no sábado a senhora não estará em casa?

-Não estarei.

Capítulo 21

Arturo crescia e em sua mente a ausência da mãe era em parte minimizada, pois a sentia sempre que seu coração apertava, mas sua vida, ainda, era um complexo mundo íntimo e relacional. A convivência com a tia sempre era artificial e emblemática, na concepção dela o mais importante era compensá-lo por tudo que a vida trouxera de mal. Ela queria ser a enfermeira, a psicóloga, até mãe-substituta. Dedicava a ele, sempre exagerava nas demonstrações de sentimentos, excessivo, sufocante, sem naturalidade, com afetação, sem a medida equilibrada. Senhora de si, sentia-se capaz de suprir com seus carinhos a afeição adequada, a qual ele ansiava.

O GRITO - Uma História de Amor e PreconceitosOnde histórias criam vida. Descubra agora