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Está de volta significava desenterrar lembranças que eu custei dois anos para enterrar, mas minha avó disse que não suportaria ficar cuidando de mim mais um ano, ao menos foi isso que eu escutei ela falar ao telefone três dias atrás.

Eu amo minha avó, de verdade, mas tem certos momentos em que ela exagera demais nas coisas e ela adora aumentar um pouco a história, ser um pouco exagerado deve ser algum requisito para fazer parte da família Piper. Mesmo eu insistindo para que ela pegasse o barco junto comigo e fosse até Bay Creek ao menos para dar um oi para minha mãe e ver a antiga casa que seu filho morou até os últimos dias de sua vida, ela se negou, disse que não gostaria de reviver as lembranças do filho e que aquilo poderia ser doloroso.

E foi quando eu a entendi.

Porque isso estava doendo em mim também, está em Bay Creek doía. Assim que cheguei ao píer olhei para todos os lados na esperança de vê-la, mas ela não estava em lugar nenhum, Diana Piper poderia ser coroada como rainha do atraso e acredite até para essa coroação deste título ela chegaria atrasada.

— É verdade o que dizem, o bom filho a casa torna — me viro para olhar o homem alto e fardado atrás de mim.

— Policial Bailey! — o abraço e faço o nosso famoso toque, a gente ri quando eu acabo errando, ainda achei que me lembrasse.

— Anda, vou te mostrar o que mudou neste lugar durante esses dois anos.

— Não precisa, estou esperando minha mãe vim me buscar.

— Então... antes de, bom, de qualquer coisa ela mandou te pedir inúmeras desculpas. — Meu sorriso no mesmo instante desaparece me fazendo suspirar de frustração, como eu disse, atitude clássica de Diana Piper. — Ela pediu que eu ficasse de olho quando você chegasse para eu te dar carona até em casa.

Não podia recusar e simplesmente ir andando, o píer fica um pouco longe da minha casa e eu também não poderia proferir qualquer palavrão no momento, sem dúvidas o policial Bailey me bateria com o cassetete. Então só aceno com a cabeça e o sigo até a sua viatura. Ele ainda continua o mesmo desde a última vez, exceto pela aparição de alguns cabelos brancos e pela barba que ele deixou crescer e o deixou com a aparência ainda mais intimidadora. Policiais precisam ser assim não é? Precisam mostrar um pouco de seriedade, mas minha conexão com ele não é apenas por ele ser o policial local que todos os moradores conhecem.

Por um tanto nós fomos, sogro e genro por assim dizer. Queria muito perguntar para ele sobre ela, queria saber como ela está e se em algum momento durante esses dois anos ainda lembrou de mim e do que vivemos durante o último verão que passei em Bay Creek. Mas sinto que não estou preparado para as respostas então só continuo olhando as casas e toda a paisagem do lugar até chegarmos em casa.

— Valeu pela carona policial Bailey — eu digo ao descer do carro e pegar minha mala que havia colocado no banco de trás da viatura.

— Não foi nada. — Ele diz, sorrindo. — Aliás, ela está trabalhando lá no Creek Richie, caso queira dar uma passada e... bom, acho que ela vai gostar de te ver.

Não precisa de nomes, eu sabia muito bem de quem ele estava falando. Assenti com a cabeça e fiquei o observando ir embora, não sei se vai ser uma boa ideia aparecer justo no lugar onde ela está trabalhando mas convenhamos que não há outro lugar melhor em Bay Creek com as melhores rosquinhas e torta de banana do que na lanchonete Creek Richie.

Assim que cheguei ao hall de entrada tentei ver alguma movimentação na parte de dentro pela janela, mas parecia que não havia ninguém em casa, dei uma olhada ao redor então fui até o vaso de planta do lado do assento de madeira que na entrada, a chave reserva ainda continuava debaixo do vaso. Pego a chave e destranco a porta, sinto que sou atingido por alguma coisa.

Lembranças é o nome desse sentimento que me atinge.

É como se ele ainda estivesse aqui e me chamando para tomar café e comer as terríveis panquecas que ele tentava fazer. Caminho observando todos os cômodos do andar debaixo, até que ouço barulho vindo do andar de cima, vou subindo lentamente e sem fazer muito barulho, mas paro antes de chegar até a porta do quarto de minha mãe que está entreaberta, ela ainda não pode estar dormindo, Diana só é mestre em se atrasar mas não em acordar tarde. Acredito que nesse momento ela possa estar no bar, arrumando algumas coisas, então a casa pode ter sido invadida por algum maluco.

Vou andando na ponta dos pés para tentar pegar o bandido de surpresa, vai ser ruim se ele estiver armado, então é bem capaz que nesse meu plano idiota eu acabe morrendo.

Empurro a porta entreaberta tão forte que ela faz um barulho ao bater contra a parede, mas a cena que vejo é muito pior do que a de um invasor de casas.

— Caleb! — Ela diz um pouco assustada e usando apenas uma camiseta grande e... meu Deus, a cena do verdadeiro inferno.

— O quê ele... por que ele está aqui? — É a única coisa que pergunto olhando diretamente para ele enquanto termina de se vestir.

— Tá de volta ao paraíso garoto.

O sorriso dele, aquele olhar de quem sabe que é intocável. Tenho vontade de socar tanto esse imbecil, sinto meus punhos se fechando e todo meu corpo parece tremer quando ele se aproxima de mim.

— Não sabe o quanto eu aproveitei neste dois últimos anos.

E num simples impulso, eu só consigo sentir a grande dor que começa a surgir no meu pulso, mas acredito que valeu muito a pena, já não posso dizer o mesmo da dor que o idiota do Marco Frey está sentindo em seu nariz e eu juro por Deus que pude ouvir um estalo quando o nariz dele beijou o meu punho.

Segredos No ParaísoOnde histórias criam vida. Descubra agora