3 | Palavras cruéis

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C A L E B

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C A L E B

Os raios de sol atravessavam o vidro da janela e aqueciam minha pele.

Apesar de ser desleixado na maior parte do tempo, prezo por uma rotina organizada e metódica. Normalmente, no dia anterior, faço mentalmente uma lista de afazeres e as programo para as horas livres. Não há coisas muito divertidas, em suma é mais uma divisão entre meus horários de estudo e os momentos que dedico para assistir séries e ler. Pela manhã, minha primeira tarefa é me arrumar para ir ao colégio, a mais árdua das atividades é ter ânimo para levantar da cama. Meu pai e minha madrasta acordam um pouco mais tarde, então tenho esse espaço só para mim.

Gosto de ir arrumado para a escola, é onde todo meu círculo social se encontra e também é minha única distração. Eu mesmo preparo meu lanche matinal, hoje comi torradas com ovos e iogurte natural. Vou riscando os números da lista à medida que meu dia vai desenvolvendo-se. Marcela às vezes me compara a um robô, alegando que tenho que me programar para tudo e não sei lidar com improvisações; ela não está totalmente errada, quando as coisas não saem como imaginei fico perdido.

Terminei de comer e peguei minha mochila de cima do sofá, seguindo em direção a porta e a trancando ao sair. Admirei o céu por uns segundos, assemelhava-se a aquarela. Coloquei os fones de ouvido e iniciei a trajetória, procurando por USHER no Spotify. Me sinto seguro para andar com o celular à mostra nesse horário, o bairro é tranquilo e há câmeras por todo canto. Durante esse percurso tenho o péssimo hábito de remoer acontecimentos.

Desde que vim morar com meu pai, há três anos, para cursar o ensino médio no Santa Teresa, vou para a escola andando, demora cerca de 15 minutos e também evito ter conversas constrangedoras com meu pai. Faz alguns meses que notei uma mudança de comportamento nele, de repente, começou a querer saber da minha vida particular e a questionar tudo, em especial faz perguntas acerca da minha sexualidade, beirando arrombar a porta do meu armário e tirar-me de lá a força. Geralmente são indagações do tipo "quando você vai trazer uma namorada para dormir lá em casa?" ou "por que não é namorador igual seus primos?". É desgastante ter que ouvir isso e não saber o que responder, não me sinto preparado para "assumir" minha homossexualidade.

Há muitos anos escondo quem sou de verdade por medo da rejeição e da solidão, meu pai jamais me aceitaria do jeito que quero ser, ele sequer conhece genuinamente o filho que tem. A visão que ele tem de mim não é nem de longe o que sou, infelizmente não consigo controlar suas expectativas irreais e temo que o dia que ele quebrará a cara comigo está mais perto que nunca. Me sinto um monstro por não ser o filho que ele sonhou ter, por não ser tão masculino e tão interessado em "coisas de homens".

Por acaso meu cérebro traz à tona memórias do final de semana, em específico de quando estava na cobertura de um prédio abrindo meus problemas para um estranho. Acho que nunca tive um sentimento tão agridoce sobre uma situação, haja visto que tive uma crise de ansiedade no meio da festa, mas também conheci o enigmático Theodore Machado, que proporcionou-me os melhores minutos da minha vida. Perfeito, profundo e profano, os três adjetivos que surgem em minha mente ao pensar nas iniciais daquele playboyzinho. Apesar de ter o meu número, ele não mandou mensagem no final de semana e confesso que esperava ao menos um "oi, foi bom conversar contigo", só que nem isso.

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