5 | Um singelo desabafo

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C A L E B

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C A L E B

Quando você se sente estranho, não há nada que faça essa sensação passar.

As vezes sinto que a vida é um grande teatro e que sou um mero personagem interpretando a vida de outra pessoa, meus amigos são atores que compõem a peça e o cenário é meramente cinematográfico. Parece cômodo acreditar que esses problemas não são meus e essa vida não é minha, até porque, quando reflito, não sei o que fiz para merecer todas essas merdas que vêm acontecendo sucessivamente.

Desde que me entendo por gente esse sentimento me persegue; antes ele não era tão forte, provavelmente porque a ingenuidade da infância não nos permite enxergar maldade em tudo. À medida que crescia fui sendo parasitado por essa sombra até virar patológico. Não faço ideia do que pode ajudar a melhorar, me vejo encurralado de todos os lados e com medo demais para enfrentar isso tudo.

Apenas menti para mim mesmo quando pensava que um dia as coisas seriam diferentes, toda parte minha está quebrada e os cacos despedaçados demais para se juntarem. Eu sou o filho que não deu muito certo, o irmão ausente, o amigo desagradável. O estranho lançou uma sombra sobre mim, ela é invisível e impalpável, não há escapatória e a verdade é que serei eternamente defeituoso.

— Coloca outra música! Nessa casa ninguém escuta essas poluições sonoras de hoje em dia, põe Roberto Carlos! — O berro estridente da minha tia reclamando do funk fez-me sair do meu mundinho e retornar para a vida real.

Estou na sacada, admirando a paisagem paradisíaca que a varanda proporciona e me perdendo em pensamentos. Faço isso enquanto trago goles de vinho escondido da minha família, não quero que me vejam bebendo. O fato da residência de minha tia ser afastada do conturbado centro de São Paulo faz o cheiro da natureza permear as narinas e traz um aconchego inexplicável, gosto de contemplar essa brisa.

É domingo e todos os meus parentes paternos estão reunidos na casa da minha tia, Patricia, assando carne e enchendo as barrigas com cerveja e vinho enquanto conversam e gargalham. Em alguns momentos eles discutem e fico aguardando uma briga feia, porém, repentinamente, fazem as pazes e voltam a rir como se nada tivesse acontecido. Definitivamente não tenho nervos para aguentar essa bipolaridade.

— Finalmente te encontrei! — A voz de Marcela soou nas minhas costas e escutei seus passos na minha direção. — É sério que teve a ousadia de me abandonar lá embaixo com aqueles foragidos do manicômio só para beber vinho? Sabe que ninguém vai se importar se te verem bebendo, né?

— É algo que prefiro manter discrição. — Murmurei, bebericando o último gole e virando de frente para minha prima. Ela estava de braços cruzados e com os cabelos soltos, destacando seus olhos.

— Me perdoe por interrompê-lo mas vamos descer, não vai se safar e ficar aqui em cima enquanto aturo a presença de nossos primos. — Falou, segurando minha mão e puxando. Deixei a taça por lá e a segui, descendo as escadas em direção ao térreo.

Estar na presença da minha família me deixa sempre em um impasse, não consigo imaginar que tipo de pergunta vão fazer e qual tipo de resposta darei, fico apreensivo de me colocarem contra a parede e eu ceder. Meus parentes são alienados ao tradicionalismo: seguem estritamente a Bíblia e são incapazes de compreender algo diferente do que acreditam. A situação piora porque não há ninguém que seja LGBT entre nós, ou seja, estou sozinho nessa jornada.

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⏰ Última atualização: Jul 03 ⏰

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