Eu quero ser livre

114 13 2
                                    

27 de setembro 1994

-- Mãe por favor, me deixa ir! Eu prometo que venho visitar vocês -- falei para Carol minha mãe, que estava me olhando com um semblante triste.

-- filha a questão não é você vim nos visitar e sim o perigo, seu pai não vai deixar você ir de jeito nenhum!

Sentei na cama rendida e com raiva, queria ir embora, queria construir a minha vida sozinha e no que gosto. Pesquisei bastante antes de pensar nisso, eu ficaria na casa de uma amiga, Rebeca, que morava em Recife próximo de minha casa, somos amigas, ela decidiu ir pra Salvador pois o tempo estava propício para trabalhos no ramo da arte. Atualmente ele trabalha no teatro.

-- que história é essa Amélia Castro? -- a voz de meu pai me fez estremecer, eu não tinha medo dele mas quando sua voz engrossa e ele diz meu nome quase por completo, meu coração falta sair pela boca, minhas mãos começam a suar. Ele apareceu na porta com os braços cruzados e aquela feição brava.

-- pai por favor, eu prometo não decepcionar vocês! Ainda quero dar muito orgulho, eu só desejo conseguir minha própria carreira no ramo que gosto, eu sinto que nasci pra isso e eu preciso ir -- minha voz saía como súplica, o semblante ainda bravo dele não se desfez e eu o vi soltar um suspiro pela boca como se tivesse cansado daquilo.

-- de jeito nenhum! Você não tem com quem ficar, vai se perder e sabe lá Deus o que vai acontecer se não conseguir esse emprego como cantora ou atriz sei lá o que! Tira isso da tua cabeça, ninguém como a gente, sem renda, vai conseguir essas coisas -- eu queria chorar, aquelas palavras pessimistas invadiam minha mente toda vez. Já não bastava eu mesma colocando pilha furada em minha mente agora meu pai decidiu por as suas na minha.

-- painho me desculpe mas eu vou, você tem ainda Leonardo e Miguel para lhe ajudar nas coisas que precisa e mainha sabe o quanto eu sou apaixonada nisso -- minha mãe estava de cabeça baixa quando meu pai a olhou, ela talvez estivesse segurando uma lágrima. Meus irmãos estavam em seus quartos apenas ouvindo entre as paredes certeza! Eu era a mais velha, eles ajudam bastante aqui em casa e são ótimos meninos, obedecem e são alunos destaques da escola. Ele me olhou novamente com a feição totalmente fechada.

-- tudo bem, se é o quer quer tanto! Pode ir. Agora não volte se não der certo, não volte pensando que vamos estar te esperando de portar abertas caso todos os sonhos que tem, derem todos errados, porque aviso não faltou! -- sua voz recheada de ignorância e pesada fizeram de novo estremecer, eu fechei os olhos pra fazer aquilo passar. Eu nunca tive coragem de falar olhando em seus olhos, meu pai sempre foi bruto demais com todos nós.

Ele se retirou do quarto, eu ainda sentia o seu olhar antes de sair, assim que o fez minha mãe chegou próxima a mim e me deu um abraço bem apertado, minhas malas já estavam prontas e minha passagem também, eu terminei o colegial fazia pouco tempo mas trabalhava dando algumas aulas de reforço ou telefonista. Juntei dinheiro pois sabia que esse momento iria chegar, eu tinha certeza! Comprei passagem de avião, era meu sonho isso também, juntei durante o colégio.

-- minha filha você é muito corajosa, eu sei que você vai conseguir e não liga pro seu pai, ele te ama e com certeza vai entender você depois.

Minha mãe era especial, ela me apoiava em tudo e eu não tinha o que falar dessa mulher! Eu queria ser como ela, crescer como ela pra conseguir ter 1% de sua coragem e força! Eu era a única mulher entre os irmãos, de início Carol me falava que João - meu pai -  não gostou muito quando soube que eu era mulher, eu não o culpo, teve uma criação péssima então tudo que era ruim antes continuam em sua vida até hoje, passando pros filhos. Criação machista expondo a mulher como frágil, a que serve somente para ficar em casa lhe servindo quando convém.

Meus irmãos apareceram a porta, Leonardo de 12 anos e Miguel de 10. Estavam escorados na porta batendo o pé no chão e não me encarando muito, eu sabia o que eles tinham, estavam com medo de ficarem aqui sozinhos.

-- Melinha -- eles vieram em minha direção dizendo em uníssono.

-- eu vou voltar pra ficar com vocês ok? Vai ser rápido, me esperem! Mainha vai cuidar de vocês, continuem estudando e tirando boas notas, a irmã de vocês vai dar muito orgulho e um bom futuro a todo mundo.

-- nós já sentimos orgulho de você Mel -- Léo disse, ele tinha olhos marejados enquanto Miguel já não aguentava segurar, o seu rosto estava vermelho.

Eu os abracei com tanta força que me pediram pra soltar, eu estava com o coração em pedaços de ir embora e deixá-los mas era pra um bem maior, eu queria fazer da arte a minha vida e construir ela em cima disso, eu sabia que ia conseguir, eu tinha eles comigo me apoiando e sempre em meus pensamentos e coração.

-- eu preciso ir, meu vôo não vai esperar por mim -- me levantei saindo de seus rostos melancólicos e abraços apertados, arrependida.

Minha mãe olhava aquela cena com o rosto vermelho de choro também, cruzava os braços e às vezes escondia o rosto pra gente não ver ela daquele jeito, era forte! Eu a abracei com força e muita saudade já, ela retribuiu da mesma maneira. Peguei as malas prontas e fui andando pela casa em busca de dizer um até breve ao meu pai.

-- você realmente vai fazer isso Amélia? -- ele dizia com autoridade enquanto estava sentado na mesa de jantar tomando café em pleno calor e sol rachando.

-- eu estou decidida, por favor painho acredita em mim! Eu vou conseguir mudar de vida -- eu insistia novamente, ele não mudava a expressão, era a mesma.

-- eu não vou me meter em sua vida mais agora saiba de uma coisa -- ele deixou a xícara de lado, cruzou as mãos e me encarou -- não volte aqui, não volte quando precisar, nós avisamos.

-- João! -- minha mãe disse com entonação alta, meu pai apenas a olhou e ela soube que ele não ia retirar aquela palavra. Eu a olhei conformada, eu sabia que quando ele falava, tinha que ser daquele jeito.

-- tudo bem, então adeus pai!

Eu falei enquanto meus olhos queriam encher de lágrimas, ele não me disse nada depois disso apenas se levantou e foi até seu quarto fechando a porta. Eu olhava pra minha família de novo, minha mãe e meus irmãos, eles continuavam com os olhares tristes e com os rostos vermelhos.

-- não chorem, não vou embora de vez. Só algum tempo e eu estarei de volta.

Os abracei novamente e demorei mais em minha mãe, ela me dizia de novo pra eu não ligar pro que meu pai falava mas eu já sabia disso, ele sempre fala essas coisas e se arrepende bem depois. Eu o conheço, entendo seu lado por mais injusto que pareça pra mim, também não ia querer saber de minha filha indo embora morar longe de mim, até que soa bem egoísta.

-- eu os amo muito, até breve!

Disse ao sair pela porta e entrando no carro de um amigo que conhecia da escola, ele iria me levar até o meu destino, até meu sonho.

~☆~

Oii gente! Mais um capítulo quentinho pra vocês. Eu realmente fico muito feliz em ver vocês comentando e dizendo que estão gostando, isso deixa meu coração quentinho.

Obrigada por isso gente ♡

Eu fiz uma playlist pra essa história pelo spotify, alguém mais habilidoso na internet poderia me explicar como coloco aqui pra vocês? Coloco o link? Me sinto uma idosa...

Te Conheci || Wagner MouraOnde histórias criam vida. Descubra agora