Novamente, a dor me acompanhou logo pela manhã. A vertigem voltou com ela.
O médico Davi me deu uma pequena balinha, dizendo que resolveria.
Meu "Irmão" estava sendo atendido por enfermeiras, segurado pelos guardas enquanto fugia da luz.
Sinto pena deles.
A neblina continuava no lado de fora ta estalagem, continuava sem cor e sem vida. Os corredores frios pareciam se estender por quilômetros antes que eu chegasse à Sala de Controle; a ínfima sala de atrocidades perturbadora.
Me sinto pesado.
O cheiro de café poluiu o ambiente novamente, me atormentou, admito — minha cefaleia voltou.
Minha irmã estava mexendo o café na pequena xícara de porcelana, produzindo os tilintares irritantes do atrito com o ferro. Ela se aproximou de mim, cantarolando a melodia russa.
Hoje estou mais irritadiço, talvez seja a vertigem.
Não lembro de ter achado minha irmã tão repugnante quando agora; com um sorriso condescendente, seus olhos desprezíveis e sua postura venenosa. Ela me ofereceu um café.
—Vai cuidar do pequeno Sobrevivente hoje, irmão.
—Não ia me cobrir hoje, irmã?
—Não faça birra, te compensei com aquele pequeno pardal, não compensei?
"Pardal"?
Devo estar cansado, porque ela percebeu minha confusão. Eu não deveria ter deixado. Não estou tão perturbado assim. A dor não é tão forte quanto ontem. Baixei a guarda.
—Ora, é realmente uma pena que não o tenha recebido ainda... Não me refiro a Lucy, então sugiro que fale com as enfermeiras das criaturinhas irritantes sobre meu presente. Pergunte sobre "Samael", se não deixei de conhecê-lo, irmão, deve gostar.Criaturinhas irritantes... Sim, ela se referia às crianças, ela as odeia.
Ela passou os dedos de porcelana pelo meu pescoço, segurou firme e assistiu a chuva na janela. Se tornou mais gentil, ajeitou meu cabelo e colocou as mãos sobre meu peito, me observou. Ela teve um momento de tristeza, seus olhos brilharam com as lágrimas que se formavam e seu sorriso desapareceu.
Se tornou outra pessoa, envelheceu em segundos e se afastou. Perturbada, ela tateou por algo na mesa, alcançou os fios que permaneciam ali desde a manhã de ontem.
—Chame os guardas — ela disse.
Senti um profundo desespero, aquele de quando éramos crianças. Me afastei. Vi o chão inundar com cor, tão tinto como vinho, preencheu o chão que ela tocava. Sua pele já não era tão limpa quanto porcelana agora.
Seus olhos estavam mergulhados em raiva, mas ela estava assustada.
Me permiti sentir nojo por uma última vez.
Do lado de fora, os guardas aguardavam, intrépidos. Toda coragem foi embora de seus olhos quando me viram.
O corredor frio parecia mais quente agora, mais agitado e claramente mais vivo.
Meu novo "irmão" estava no final do corredor.Senti uma pontada na cabeça, me senti pesado.
Minha memória falha.
Não lembro o que aconteceu depois de ter aberto a porta.
Eu estou na Ala Vermelha, meu "irmão" ao meu lado; Mamãe estava cortando uma maçã.
Me levanto, me sinto tonto e demasiado cansado, também sinto sono.
—Estava preocupada com você, tem estado distraído esses dias — disse Mamãe.
Ela sentou ao meu lado, mandou as enfermeiras saírem.—Davi te deu uma bala, você comeu?
Ah, sim, o médico Davi...
Não o vi hoje.
Me perdi no teto cor de leite. Eu mudei?
—Ontem, quando entrei aqui, com a Meritíssima.
Não... Não foi assim que aconteceu... Foi?
Tudo parecia nublado. Eu estava preso.—Ela fez com que passasse a dor de cabeça, não é?
Eu queria responder, mas não tinha certeza.
Meu "irmão" se deitou ao meu lado, senti o terror na sua pulsação e o amargor nos olhos da Mamãe. O som estridente de alguma máquina marcava meus batimentos, não reconheci de que lugar do quarto este som vinha.
—O que aconteceu com Amelie? — perguntei.
—Sua irmã teve um pequeno surto, ela estava sobrecarregada.
Minha irmã não se sobrecarrega, ela é 'perfeita'.
Antes de sair, Mamãe lançou um olhar penoso sob meu "irmão", que se encolheu ainda mais.
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Injury - Injúria
Mistério / SuspenseEm uma montanha afastada, esquecida, poluída; um pequeno pássaro se perde, e, então, encontrado por corvos, tornou-se tão desprezível quanto eles, os empurrando cuidadosamente do ninho - os envenenando por dentro -, escondendo sua revolta e sua falt...