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"Às vezes as pessoas são tão bonitas!
Não pela aparência física nem pelo que dizem. Só pelo que são."

-A Menina que Roubava Livros.



Vazio.

Era isso que predominava na mente da jovem Despina, apenas o breu do vazio.

A feérica recém-transformada não se dava conta do tempo que passava ali, observando as montanhas nevadas, apenas observava. Ela sabia o que estava acontecendo, sabia que estava definhando, mas não se importava. Não se importava com muita coisa nas últimas semanas ou dias, apenas vegetava.

Queria ter morrido naquele mar escuro, preferia ter ido para onde quer que seja o lugar onde os mortos vivem do que ter emergido da água fria. Se é que um local como este existe, mas ela adorava a ideia de descobrir. Pensamentos como esses costumavam rondar a sua mente com mais frequência do que o normal; ela sabia que aquilo não era normal.
Mas ela não se importava.

Sequer teve a capacidade de perceber que havia neve ao redor dela; a jovem parecia dormente. Estava gelado, o quarto estava gelado. Mesmo após o caldeirão e o constante inverno que enfrentava quando mais nova, ela amava o frio. Isso a fazia lembrar do local de onde veio, de sua essência e trajetória. Lembrava da humanidade que foi arrancada à força dela.

─── Despina? - Também não havia notado a presença do macho ali, sequer se recordava de quem se tratava; então virou levemente o rosto para a porta. ─── Você precisa comer alguma coisa; a última coisa que quero é que morra de fome. - Ela não se deu ao trabalho de responder, não tinha forças para falar.

Despina. Aquele era o seu nome? A feérica já não se recordava mais.

─── Cara, ela tá me assustando. - o macho alado falava com alguém no corredor. ─── Ela tá me encarando, eu juro! Parece que ela vai atravessar a minha cabeça! - Se fosse há algum tempo atrás, Despina teria rido, mas não era o caso.

Ela ignorou, voltando a olhar para a paisagem através da janela. Não queria comer, não queria rir e não queria sentir. Estava apenas ali, pensando, enquanto o seu corpo morria aos poucos, a alma praticamente já se fora com a brisa gelada. A carcaça da humanidade em seu interior já estava podre, completamente decomposta. Não havia sobrado nada. Não havia mais nada para ser salvo. Ela queria descansar, finalmente descansar e ter um pouco de paz. Se é que merecia alguma paz.

Não queria enterrar aquele resto de cadáver que se encontrava em seu interior, não queria desapegar dos restos. Estava agarrando aquilo com todas as suas forças, destruindo a si mesma, torturando a si mesma.

A feérica pôde sentir a cama afundar ao seu lado, não se deu o trabalho de olhar, já que sabia quem era. A única pessoa que não olhava para Despina com pena, a única que era sincera.

─── Coma. - a voz soou áspera e direta. Nenhum movimento. ─── Como o idiota ali disse, a última coisa que queremos é que morra de fome, criança. - Nenhum movimento.

─── Amren, eu acho que você não é a pessoa mais adequada para essa tare— o macho foi cortado pelo olhar fulminante e impiedoso da mais velha, fazendo-o se calar rapidamente. ─── Tenho uma reunião com Rhys agora, se me dão licença.

─── Não pode continuar nesse estado vegetativo; vamos logo com isso. - Amren colocou uma bandeja em frente à mais nova, que sequer olhou para a comida. ─── Mexa-se! - O pé da jovem Despina se moveu, derrubando a bandeja no chão de forma nada discreta. Seus olhos permaneciam apenas na janela. ─── Peste! - A fêmea mais velha se levantou de imediato, surpresa com tal petulância.

Despina iria respondê-la, mas simplesmente não conseguiu. Não conseguia falar; era como se sua boca estivesse selada há décadas, estava seca. Sua garganta arranhou e tudo doeu, mesmo assim tentou novamente, com muita dor e esforço.

─── Disse para que me mexesse. - Sua voz estava por um fio, rouca e irreconhecível aos ouvidos de quem já a ouvira. ─── Eu me mexi. - Um bufar de aborrecimento escapou de Amren; a mais nova permanecia com o olhar na janela. ─── Você é igual a mim, não é? Passou pelo mesmo que eu. - Amren infelizmente transpareceu a surpresa em seu rosto, a expressão sumindo rapidamente. Mesmo com o olhar na janela, Despina parecia ter visto o olhar surpreso de Amren. ─── Sinto muito, posso dizer que entendo você. Presa em um corpo que não é seu, entendo você, entendo seu humor. - A mais velha estava estática. Ninguém nunca havia falado com ela sobre isso, não dessa forma. Não com essa tranquilidade, como se não tivesse medo dela, como se realmente a entendesse e sentisse verdadeiramente a dor dela. Não de uma forma cautelosa ou ameaçadora, apenas verdadeira e sincera.

A fêmea de olhos prateados se afastou em passos rápidos em direção à porta. Algo na mais nova despertou algo nela, uma coisa que não conhecia, algo novo. Estava a cinco centímetros da porta quando ouviu a voz rouca novamente, deixando-a em estado de choque.

─── Quer ser minha amiga? - Parou, tudo parou. ─── Parece que não tem muitos amigos, podemos ser amigas sabe. Bom, eu também não tenho muitos amigos! - Amren virou-se, encontrando a feérica com os olhos na janela, como sempre. ─── Na verdade... Não tenho amigos, gostaria de ter uma.

Amren apenas saiu da sala, totalmente estática para falar alguma coisa. Ela sabia o que era, sabia que sentimento era aquele. Medo. Estava com medo, com um receio em relação a tudo aquilo. Ninguém em séculos ousou fazer um pedido tão sincero como aquele, sem nenhum interesse. Ela havia mantido aquela postura por anos, o tipo de postura que afasta as pessoas, propositalmente. Estava morrendo de medo.

Um pequeno sorriso brotou nos lábios de Despina. Era o seu primeiro sorriso, a primeira expressão sincera desde o caldeirão, durante seu estado depressivo.

Naquele momento, ela se permitiu sorrir.
Permitiu-se lembrar do seu próprio nome.

Porque ela sabia que Amren voltaria, sabia que havia feito uma amiga.

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Mais um capítulo pequeno!
Quero mostrar um pouco do ponto de vista do Kallias e da Despina, para vocês poderem ter uma ideia de como está a mente deles após tudo.
Vão ter alguns flashbacks do passado da Despina ao longo dos capítulos para vocês conhecerem a personagem.
Agora a história começa.

Me perdoem caso tenha algum erro, estou sonolenta.

Votem e comentem! Motiva muito.

B L I Z Z A R D : KALLIAS - ACOTAROnde histórias criam vida. Descubra agora