Álcool

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Licor,
Vinho,
Vodka,
Cerveja,
Champanhe,
E até cigarros.

Agora a embriaguez era uma boa maneira de esquecer oque sentia. O vício que Vessel tanto insistiu para que largasse o trazia de volta para seus bons momentos juntos, momentos que não voltariam.

Garrafas e garrafas de todos os tipos possíveis de álcool espalhados pelo quarto e pela casa, seus olhos quase sempre fechados. Se embebedava tanto que já nem se lembrava a última vez que havia estado sóbrio - ele lembrava sim, mas bebia justamente para esquecer disso - talvez fosse porque ele só ficava lúcido com Vessel ao seu lado.
Embriagava-se pelos cantos da casa, pelos arredores do jardim e pelos lugares mais distantes, onde II não o proibiria de esvaziar as garrafas de Whisky cru.

Whisky...

Era a única bebida alcoólica que Vessel gostava.
Desgraça! Não importava o quanto bebesse, até em seu escapismo o vocalista morava. IV havia perdido seu norte.

Amargurado por perder tudo oque tinha, sua dignidade e seu amor, se afogou na miséria de que lhe restou.

Seu estômago embrulhava e a garganta queimava, engolindo o choro com o vinho e a saudade pesando a consciência. Seus dedos deslizavam pela taça como tocavam a pele suave de Vessel, seus suspiros pesados transformados em tragos ardosos de cigarros.

Chorava enquanto bebia e murmurava contra o mundo e si mesmo.
Ele não queria se lembrar em momento algum de Vessel.

Não queria lembrar de seu sorriso caloroso,
De seu rosto belo,
De suas mãos suaves,
De seus olhos acolhedores,
De sua voz angelical.

Não queria que nada o lembrasse de todos os momentos simples e pequenos juntos, de quando o ajudou á largar o vício, de quando sorria para ele ou apenas quando conversavam.

Ah, e como amava ouvir a voz de Vessel!
Era acolhedora, marcante, sempre tinha algo bom para falar. Nunca havia visto alguém tão fascinante quando o vocalista era.

Agora a casa estava silenciosa.

Mas apenas a casa, pois em seu coração, a voz do receptor sempre ecoaria gritante, angustiantemente bela e desejosa.
A voz que o escravizava todos os dias, á cada gota de álcool.

A voz que antes ria com ele, conversava e o amava,
Se tornando uma voz em sua cabeça,
Tortuosa.

A queimação em sua garganta e as náuseas constantes o faziam sentir mais falta ainda, pois caso Vessel estivesse ali, ele o acolheria e cuidaria. Mas ele não estava, então tinha que se virar sozinho.

Beberia mais,
Mais,
Mais,
E mais,
Beberia até entrar em coma alcoólico;
Porém tinha medo de entrar em coma e acabar por sonhar com aquele homem que tanto amava. Estaria eternamente destinado á lentamente se matar para esquecer sua imagem?

Essa era sua penitência.

Odiava passar em frente ao antigo quarto do receptor e ver III se lamentando agarrado aos lençóis. Odiava andar pela casa e ainda ouvir aquela risada gostosa, odiava andar pelo jardim e ainda se lembrar da figura de Vessel o chamando para se sentar junto á ele em meio ás rosas, odiava andar pela orla da praia e ainda enxergar o vocalista agarrando a areia e limpando as mãos na água, o mostrando as conchas que coletou.

Odiava ainda se lembrar dele.
Odiava ainda ter que se embebedar para ter que esquecer ele.
Não queria ter que se alcoolizar para diminuir infimamente a dor desnorteante que sentia, não queria ter que se render ao que tanto repudiou para se esquecer de quem tanto amou.

Não queria ainda ter que esquecê-lo.

Queria poder abraçá-lo novamente,
Ouvir aquela voz de novo,
Não ter desperdiçado seu tempo com o vício.

Talvez fosse isso que o matava?
O fato de não ter aproveitado o máximo que deveria? Ou era só o peso de não tê-lo mais?

Não importava.
Ia ficar bêbado e não se importaria mais com os motivos.
O problema é que ele esquecia de esquecê-lo.
O problema é que nada o fazia esquecer.
O problema é que ele ainda o amava.
O problema era ele mesmo.

Á cada gole se lembrava dos lábios de Vessel, a cada nova garrafa vazia se recordava se sua voz

"Pare de beber isso"

A lembrança de quando o vocalista o avistou bebendo Vodka pura e retirou a garrafa de suas mãos, se recusando á permitir que IV bebesse aquilo.

Se martirizando por dentro, por ainda ouvir aquela voz o repreendendo.

"Me desculpe..."

Mas não haveria desculpa que retirasse aquele peso de cima de si.
Estava fadado á eternamente viver para inutilmente tentar esquecê-lo. 

"Me desculpe..."
"Me desculpe..."
"Me desculpe..."
"Me desculpe..."
"Me desculpe..."
"Me desculpe..."
"Me desculpe..."
"Me desculpe..."

"Me perdoe, por favor."



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