Capítulo 1 - O encontro sob a chuva.

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O som do saxofone ecoava pelo pequeno bar, misturando-se com o murmúrio distante da chuva batendo contra as janelas. O bar era um refúgio de tranquilidade em meio à tempestade, um lugar onde o tempo parecia desacelerar, permitindo que os presentes se entregassem ao momento.

O homem alto no balcão, conhecido por alguns como João, fitava o líquido âmbar em seu copo de whisky. Havia uma aura de mistério ao seu redor, algo que fazia a bela moça ao seu lado, Karen, observá-lo com um interesse velado. Karen, com seu vestido cor vinho e batom avermelhado, tinha um charme inegável, e seu sorriso discreto indicava uma curiosidade crescente sobre o homem ao seu lado.

No canto oposto, os dois amigos, Alexandre e Gabriel, conversavam e riam alto, suas vozes um pouco mais animadas do que o ambiente exigia. Alexandre, com seu paletó preto desabotoado e cabelo loiro ondulado, parecia mais preocupado em se divertir do que em manter as aparências. Gabriel, com seu cavanhaque, bigode, blusa social branca e gravata preta, era uma figura singular, atraindo olhares curiosos de vez em quando.

A jovem moça no palco, Clara, deixava sua alma fluir pelo saxofone, criando melodias que tocavam o coração de todos ali. Ao seu lado, o pianista Pedro acompanhava com maestria, suas mãos correndo pelas teclas com uma graça que vinha de anos de prática. Juntos, eles eram a trilha sonora perfeita para aquela noite chuvosa.

O barman, Antônio, limpava os copos com uma calma quase meditativa, observando os clientes de vez em quando. Ele conhecia bem todos os frequentadores habituais, e cada um deles tinha uma história única que contribuía para a atmosfera do bar.

Enquanto a música continuava, Karen finalmente decidiu iniciar uma conversa com João. "Você parece perdido em pensamentos", disse ela, sua voz suave contrastando com o som da chuva. João levantou o olhar, seus olhos encontrando os dela. "Às vezes, a chuva traz lembranças", respondeu ele enigmaticamente.

Karen sorriu, inclinando-se um pouco mais perto. "Que tipo de lembranças?", perguntou, curiosa.

João hesitou por um momento, olhando novamente para o seu copo antes de responder. "De tempos passados, pessoas que já se foram... e sonhos que ficaram pelo caminho."

Karen assentiu, entendendo a melancolia nas palavras dele. "Todos nós temos fantasmas, não é? O importante é como convivemos com eles."

João ergueu o copo em um brinde silencioso. "Acho que você tem razão. E você, Karen, quais são os seus sonhos? Ou fantasmas?"

Karen riu suavemente, tocando levemente o copo de João com o dela. "Acho que uma mistura dos dois. Sonho em ser uma artista famosa, viajar pelo mundo, mas meus fantasmas sempre me lembram do quanto isso pode ser difícil."

"Bem," disse João, "você já conquistou algo. Está aqui, vivendo uma noite memorável. E quem sabe? Às vezes, os sonhos se realizam quando menos esperamos."

Eles continuaram conversando, cada palavra os aproximando mais, enquanto a música e a chuva criavam o pano de fundo perfeito para uma conexão inesperada. No pequeno bar em Fortaleza, em uma noite chuvosa de 1980, duas almas encontravam um pouco de paz em meio às suas próprias tempestades.

O som do saxofone de Clara e as teclas do piano de Pedro se harmonizavam pela última vez naquela noite, enquanto eles encerravam sua performance com uma melodia suave. Clara deu um passo à frente, segurando o saxofone ao seu lado, e Pedro se levantou do banco do piano, sorrindo para a plateia.

"Obrigada a todos por estarem aqui conosco nesta noite chuvosa," disse Clara, sua voz calorosa preenchendo o espaço. "Esperamos que tenham apreciado a música tanto quanto nós apreciamos tocar para vocês."

Pedro acenou, acrescentando: "Foi um prazer tocar para um público tão acolhedor. Cuidem-se e tenham uma ótima noite!"

Os poucos presentes aplaudiram, alguns com entusiasmo, outros com uma calma apreciativa. Clara e Pedro fizeram uma breve reverência antes de se retirarem para o canto do bar, onde guardaram seus instrumentos.

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