Sabe qual é o problema de se apaixonar por momentos?
Lembro da primeira vez que a vi, ela estava usando aquele suéter branco com o rosto de um gato estampado - nunca vou entender o por que dela gostar tanto de suéteres. Era um dia frio e resolvi sair de casa para comprar uma bebida quente, o que não ocuparia muito do meu tempo ja que o café ficava no prédio à frente do meu. Ela estava atravessando a rua com um copo do Starbucks na mão, tentei ler seu nome mas fui interrompido por um sorriso encantador, eu queria tê-la cumprimentado ou apenas ter sorrido de volta mas simplesmente não consegui então resolvi seguir em frente.
Abri a porta do café, e Chad, o jovem que estava trabalhando ali por aproximadamente uns três meses, como sempre perguntou-me:
- Vai querer o de sempre senhor Gomez?
- Chad, ja lhe disse para parar de chamar de me chamar de senhor, tenho apenas 28 anos, e sim vou querer o de sempre.
Ele esboça um sorriso no rosto, pega um copo, escreve "Charlie" e em seguida grita em um tom totalmente irônico.
- Um capuccino descafeinado com canela bem quente para o jovem aqui por favor.
Reviro os olhos e Chad pisca para mim colocando um sorriso no rosto, pronto para atender o próximo cliente da fila.
Apos pegar minha bebida, saio dali voltando ao meu apartamento e assim que entro, Ruppert, meu velho bulldog inglês, olha para mim com a sua típica cara de quando está chateado, e eu sei o por quê, giro a chave na porta, trancando-a mais uma vez e digo:
- Ruppert, já viu o frio que está lá fora? Acha mesmo que é um bom dia para dar um volta? - Ruppie emite um muxoxo e eu sorrio.
Caminho em direção à cozinha com ele sob meus pés e coloco o copo ainda quente em cima do balcão, retirando o casaco. E é neste ato que me lembro daquele sorriso, aquele sorriso que a simples lembrança foi capaz de aquecer meu corpo.
- Talvez não esteja tão frio assim, não é? - falo mais para mim do que para ele.
Olho em volta procurando a coleira e como não a avisto, abro novamente a porta e faço sinal para que Ruppie me siga.
- Você venceu mais uma vez amigão!- Desço as escadas, até o primeiro andar, sendo acompanhado pelo meu cão.
Quando chego a portaria, avisto o relógio acima da porta de entrada, oito e vinte da manhã, dou com uma brisa gelada de outono e olho para meu bulldog afirmando que aquilo não era uma boa ideia, mas ele não se entrega a minha cara feia e põe suas quatro patinhas para fora do prédio, não tive outra alternativa a não ser segui-lo.
Fizemos o mesmo percurso de sempre, Ruppert caminhava a minha frente, o movimento de pessoas era pequeno, devido ao horário, mas vez ou outra alguém esbarrava nele me obrigando a desculpar-me e ser por vezes ignorado.
Ainda não havia me acostumado com o jeito das pessoas daqui, por mais que em Londres as pessoas não sejam tão calorosas, ainda assim são mais receptivas, bom dia's são dados por educação, aqui parece que todo mudo está sempre apressado demais, estressado demais.
Sentia falta de tomar chá com a minha familia todos os dias a tarde, daqueles pãezinhos que minha mãe preparava desde a minha infância, - embora eu os achasse altamente gays - sinto falta das histórias do meu pai, que de uma forma estranha sempre acabavam em alguma piada sem sentido que apenas ele entendia. A verdade era que eu sentia falta da minha familia, porém meu trabalho como checador de fatos em um dos jornais mais famosos do mundo, o New York Times, não me permitia morar lá.
Era uma manhã bonita apesar do tempo fechado, nessa época do ano as folhas ficam em um tom alaranjado antes de cairem, o que é um tanto estranho pois logo após este período de frio e cores quentes, a neve ganha espaço deixando tudo branco e patético.
Ruppert para de andar e só então percebo que já estávamos caminhando a mais de quinze minutos, tempo o suficiente para um velho bulldog preguiçoso se cansar.
- Agora você me olha com essa carinha de desaprovação? Foi você quem quis sair, lembra? - ele solta um gemido como se me entendesse, e talvez estivesse entendendo mesmo - Você está muito gordo para ser carregado por cinto quarteirões amigão. Sinto muito, mas não vai rolar. - Damos meia volta, estava frio demais, gostaria de ter lembrado de pegar meu capuccino antes de sair.
Chegamos em casa em menos de dez minutos, a volta havia sido uma caminhada rápida e sem devaneios.
Meu cappuccino ainda estava sobre o balcão, agora completamente gelado. Ruppert se espreguiçara, deitando no sofá e eu me preparava para mais um dia de trabalho. Novamente a lembrança dela vinha a minha mente. Veja bem, eu nunca acreditei em amor a primeira vista, não fazia meu estilo, mas eu simplesmente não conseguia parar de pensar nela, naquele sorriso simples e encantador. Eu costumava dizer que foi a primeira coisa que eu notei - embora ela não acreditasse.
Aquele foi o primeiro de nossos vários momentos. O momento que para ela pode não ter significado muita coisa, mas para mim significou tudo. Foi quando eu descobri que de uma forma ou de outra, eu precisava conhecê-la, precisava que ela fizesse parte da minha vida.
O problema de se apaixonar por momentos é que as pessoas vão e os momentos ficam. E junto com os momentos, fica a saudade.