CAPÍTULO ÚNICO

1 0 0
                                    



A sala estava cheia. Pessoas andando ao meu redor. Falando coisas que eu não conseguia ou não queria entender.

Sei lá!

Estava assustada, meio paralisada pelo medo do desconhecido. Pela dor. Para muitos, um momento lindo, emocionante. Para mim, assustador, doloroso, confuso demais.

Alguém segurou meu braço. Outra surgiu no meu ângulo de visão, sorrindo e falando de forma a me confortar.

Quem é essa mulher? Por que essa criatura acha que é capaz de me confortar em um momento como este?

Estava deitada, olhando as luzes brancas do teto. Pessoas andando de um lado para o outro. Falando e falando e falando.

Então, a dor de novo. Mais intensa dessa vez. Parecendo me partir ao meio e me abrindo de dentro pra fora.

Acho que senti o deslocamento dos ossos da bacia. Todo sistema funcionando para se adaptar ao momento de extremo estresse.

Cadê a magia que tanto ouvi falar?

Onde a comoção mágica e fabulosa?

O orgasmo cósmico único e incomparável?

Passei meses tentando sentir o que todos diziam ter sentido nessa situação.

Acho que não sou normal. Não senti nada do que me disseram. Ainda não sinto.

A dor novamente. Mais intensa. Aterrorizante. Rasgando. Ardendo. Sibilei.

"Calma! Logo vai aliviar."

Essa eu entendi. Talvez porque senti que fosse mesmo aliviar. Mas não passou de todo.

Senti mãos se mexendo dentro de mim.

Sabe a sensação da anestesia local?

Então... Não doeu propriamente dito, mas descobri que imaginar a dor também dói. Sentir as mãos mexendo nas minhas entranhas me fez imaginar que doía.

As lágrimas escorrendo. O suor pregando a roupa no meu corpo extenuado. Tanta dor. O rosto se contorcendo. Os músculos tensos.

"Que é isso? Não pode tá doendo!"

"Emoção!"

Tentei disfarçar.

"Ah! Não pareceu."

Não foi emoção.

Não tenho culpa se tenho muita imaginação. Doeu. Juro!

Então algo foi arrancado de dentro de mim.

Alívio!

Enfim! O invasor se foi. Um parasita a menos.

Um choro berrado. A equipe médica rindo. Palavras de pura alegria. O momento mágico de quase todos.

Eu, a exceção.

Talvez, quando o tiver nos braços...

Mas, não. Nada!

O pacote sujo e barulhento foi colocado nos meus braços. A enfermeira ajudando a boca desdentada a agarrar o mamilo inchado.

Chiei.

Como um ser sem dentes é capaz de machucar tanto, usando apenas as gengivas?

"Ele não é lindo?"

Fingi sorrir, apenas para não causar estranhamento.

Minha vontade? Vomitar!

Senti asco. Aquela coisa suja, vermelha, mole e barulhenta sugando meu peito deformado.

Mãos mexendo nas minhas entranhas. A ardência. A pele manchada. Os cabelos suados e opacos. As noites mal dormidos por causa dos chutes nas minhas costelas.

Tudo isso pra quê?

Olhei para o parasita sugando a vida dos meus seios doloridos. Enormes. Disformes. Inchados.

Não! Nada de magia. Nada do tal amor incondicional.

Então entendi.

O menino nasceu. A mãe dele não.

A mãe que não nasceuOnde histórias criam vida. Descubra agora