Capítulo 02

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Eu não podia acreditar. Ele tava me dispensando assim, fácil desse jeito? Não... Aquela era a minha chance de ajudar o Jack!

— Senhor Crane, por favor...

— Não gosto de atrasos, senhorita Larson. Sete e meia da manhã. Passe no RH com seus documentos.

Meu cérebro parou de funcionar direito.

— Ah... espere... Amanhã?

Ele levantou uma sobrancelha e me olhou com um certo desgosto.

— Não quer o trabalho? Por favor, se você tem problemas em entender simples comandos, acho que talvez não seja uma boa ideia.

— Não! — Eu me levantei de uma vez e ele fechou a boca. — Perdão. Eu... — limpei a garganta. — Eu quero o emprego. E sim, eu compreendo comandos simples, é só que eu fiquei um pouco surpresa, só isso. Essa oportunidade significa muito...

— Amanhã.

Na boa, ele era grosseiro. Que inferno! Mas tudo bem... Era pelo Jack. Valia a pena aguentar aquele homem.

— Obrigada. — Respondi, pegando a minha pasta, a minha bolsa e me retirando dali. Antes de fechar a porta, podia jurar que ele tava me olhando de uma maneira estranha. Espero que ele não seja aqueles chefes tarados, porque por mais bonito que ele seja, eu não vou me rebaixar a isso!

A tal recepcionista me olhou, sem levantar a cabeça e eu pude ver que ela não parecia muito contente quando eu sorri na direção dela. Na verdade, eu precisei de toda a minha força de vontade para não sair saltitando pelos corredores e gritando, como louca; consegui! Fui direto para o departamento de RH.

A volta para casa foi o trajeto mais tranquilo e feliz da minha vida, eu juro! Eu precisei pegar um ônibus, afinal, táxis estavam fora do meu orçamento, e só peguei um mais cedo porque eu realmente precisei. Agora, eu olhava pela janela do transporte público, enxugando aqui e ali as lágrimas que caiam. Lágrimas de felicidade, algo que não acontecia em muito tempo.

Assim que abri a porta de casa, Jack, que estava sentado no nosso pequeno sofá, levantou a cabeça. Ele tinha os braços em cima das pernas, as mãos cruzadas, como se esperando ansiosamente por algo.

— Jules? — Ele perguntou e eu caminhei até ele. Pude ver os olhos dele cheios de dúvidas.

— Sinto muito, Jack. — Eu disse e os ombros de Jack arriaram, como se derrotado. Então, ele me ofereceu um sorriso fraco.

— Tudo bem. Teremos outra oportunidade. Você vai ter. Você é ótima no que faz, Jules. Se eles não te quiseram, quem perdem são eles! — Ele se levantou.

Coloquei a mão no ombro dele.

— infelizmente, você vai ter que acordar mais cedo pra tomar café, ou vai ter que preparar sozinho. — Eu disse e vi que o rosto dele mudou de expressão para confusão. — Porque eu vou ter que chegar no trabalho antes das sete e meia da manhã!

A boca dele abriu, sem palavras, e então, um gritinho de felicidade, enquanto ele me abraçava.

— Caramba, você me pegou! — Ele disse, enxugando os olhos. — Jules, eu tô muito orgulhoso de você!

Eu sabia que Jack não estava mentindo, e que estava mais feliz por eu estar me realizando profissionalmente, do que por nossa condição financeira melhorar a ponto de podermos pagar pelo tratamento dele.

Depois disso, preparei nosso almoço e fui arrumar as minhas coisas para o dia seguinte. Limpei a casa, enquanto Jack colocava as roupas para lavar. O resto do dia, assistimos filmes e fizemos planos.

A noite não foi tranquila como eu preferiria, mas com certeza era por causa do nervosismo.

— Fica calma, Jules. Vai dar tudo certo. Papai e mamãe ficariam muito orgulhosos de você!

Eu senti meu coração apertar e tomei um gole do meu café.

— A mamãe, eu não duvido. Mas o papai... ele provavelmente nem ligaria, Jack.

— Jules...

— Se ele ligasse pra gente, não teria deixado tudo pra esposa e pra filha dela. Não teria nos deixado só com a roupa do corpo!

Era difícil falar do nosso pai. Não é que ele tivesse sido um pai horrível, porque não tinha. Porém, era bem óbvio que ele comia na mão de Hanna, aquela mulher sonsa e sem coração. Quando ele se foi e o testamento foi aberto, o resto do meu mundo desabou. Ele deixou tudo para elas. TUDO. Era o mesmo que renegar a Jack e a mim, ainda mais sabendo que o filho precisava tanto de tratamento.

Senti os dedos de Jack no meu rosto. Ele estava limpando as minhas lágrimas.

— Não fica assim. Eu não entendo como ele pode fazer aquilo, mas... de alguma forma, eu sei que ele nos amou.

Eu não queria continuar naquele assunto e apenas sorri. Eu precisava terminar de me arrumar e ir para o meu primeiro dia de trabalho. O primeiro dia da nossa nova vida!

Cheguei no prédio quinze minutos antes e, ao olhar para o lado, enquanto esperava o elevador, vi uma figura que eu reconheceria em qualquer lugar:Laura, minha meia-irmã. Mas... O que ela estava fazendo ali?

Olhei para o indicador de andar e caramba, tava demorando um século!

"Qual é! Anda logo, ou ela vai me ver!", eu pedia mentalmente. Laura não era lá muito agradável e, sinceramente, era uma das últimas pessoas que eu queria ver naquele dia. Só perdia pra Hanna. Aquela dali era pior.

Assim que o elevador abriu as portas, eu entrei como se a minha vida dependesse daquilo! Eu só pude soltar o ar que segurava quando as portas se fecharam e o elevador começou a subir. Levei a mão ao peito. Foi por pouco!

Cheguei no meu andar e caminhei até a secretária do dia anterior. Ela, novamente, me olhou com cara de poucos amigos. Eu não seria antipática, afinal, talvez ela só precisasse de um pouco de calor humano!

— Bom dia! Eu sou Julie Larson!

— É, eu sei. — Nem respondeu o meu "bom-dia", eu percebi. — Bem vinda. Venha, a sua sala é por aqui.

O tom de voz dela, monótono e de puro desagrado não deixava dúvidas: por algum motivo que só Deus sabia qual era, aquela loira não gostava de mim. Parecia que eu não tinha muita sorte com loiras, na minha vida.

A segui por um corredor e logo ela parou em frente a uma sala e abriu a porta.

— Tudo o que você precisa está no computador. Vou avisar ao seu superior que você chegou. Ele vai te passar mais instruções.

— Obrigada! — Eu disse e ela virou as costas. — Espera, qual seu nome?

Sem parar de andar, ela respondeu: Amanda!

Antes de sair da sala, ela olhou por sobre o ombro.

— Você quase chegou atrasada e o chefe odeia isso. É só um conselho que estou de lhe dando, de boas vindas.

E se foi. Bom, eu agradecia, de qualquer forma.

E eu não cheguei quase atrasada. Ou o quê? Ele espera que eu chegue muito antes do meu horário? Quinze minutos era o suficiente.

Suspirei fundo e fui para a minha mesa. Se me pedissem para chegar uma hora mais cedo, eu chegaria. Tudo aquilo era por algo maior.

O computador estava ligado, mas antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, uma batida na porta.

— Entre! — Eu disse. Aquele deveria ser o meu superior direto. Porém, quando a porta se abriu, ele estava lá. — Senhor Crane! Bom dia!

Eu me levantei.

Ele entrou, fechou a porta e colocou as mãos nos bolsos. Ele estava olhando pra mim. Tipo, me olhando mesmo, como se me analisasse. Ele deu mais um passo em minha direção. 

Apenas me ame - DEGUSTAÇÃO APENASOnde histórias criam vida. Descubra agora