십칠

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LÍDER KIM


A grade da cela se fechou com um estrondo enquanto eu voltava a me sentar no banco de concreto. O guarda levou a chave, deixando-me sozinho em um espaço que parecia se estreitar a cada segundo. Naquele momento, a solidão era a última coisa que eu desejava, especialmente sabendo que tudo isso era culpa minha.

Pela primeira vez em muitos anos, fui imprudente. Permiti-me ser dominado por sentimentos que nunca havia experimentado, e agora, não só perdi o controle de tudo, como também fui o causador da minha própria queda.

Não consigo lembrar da última vez que me senti tão frustrado por não saber o que fazer. Na verdade, consigo sim; eu ainda era um pré-adolescente, completamente alheio à crueldade que um ser humano pode infligir.

Ao contrário das memórias que inventei para que Jungkook e Yoongi pudessem crescer sem traumas, meus pais eram, no mínimo, as pessoas mais cruéis que já conheci. Nem o assassino mais habilidoso da firma tinha a frieza que eu via no olhar da minha mãe quando ela me encarava.

Ela nos odiava, em parte, por sermos fruto de um casamento arranjado que ela nunca quis. Nossos avós, figuras poderosas, uniram as famílias com um casamento que deveria beneficiar as duas empresas familiares. No entanto, isso não adiantou muito, pois, em pouco tempo, meu pai conseguiu levar ambas à falência.

Para esses dois adultos, ninguém tinha mais culpa pela vida desgraçada que levavam do que nós, os filhos. Meu pai afogava suas mágoas no álcool antes de espancar minha mãe até ela desmaiar, e quando isso acontecia, ele se voltava contra nós.

Mesmo com minhas pernas tremendo de medo e a urina encharcando minhas calças, eu sempre me colocava à frente dos meninos para suprir a frustração do homem. Lembro de acordar no chão inúmeras vezes, com as pequenas mãos de Jungkook me sacudindo, seus olhos inocentes sem entender o que estava acontecendo.

Foi ali, com o bebê balbuciando palavras incompreensíveis, que decidi que nada era mais importante do que manter meus irmãos seguros. Essa decisão se tornou uma tarefa difícil para um garoto malnutrido, constantemente machucado pelas surras incessantes.

Omma fingia não notar meus ferimentos e pouco se importava quando Yoongi pedia comida. Passei a antecipar as necessidades e alimentava Yoongi nos horários corretos para que ele não precisasse se aproximar de nossa mãe, assim como passei a colocar Jungkook para dormir durante o dia.

Acontece que isso não era algo que deveria acontecer com crianças. Logo, a escola quis saber por que eu tinha deixado de frequentar as aulas, e fui obrigado a voltar. Essa exigência se tornou a pior tortura para mim.

Fiz amizade com a senhora da biblioteca, que brincava com Yoongi enquanto eu estava em aula. Mas Jungkook era muito pequeno. Eu não tinha escolha a não ser deixá-lo em casa. Todos os dias, eu o colocava para dormir antes de sair e caminhava até a escola chorando, rezando para qualquer entidade divina mantê-lo seguro.

Yoongi me perguntava o que estava acontecendo, mas eu apenas dizia que estava doente. Por isso, fungava o nariz e vomitava de nervoso. Não demorou muito até que a criança de dois anos aparecesse com hematomas pelo corpo.

Eu o examinava todos os dias quando voltava, e as marcas roxas aumentavam a ponto de o pequeno alfa chorar ao menor toque. A cada nova marca, meu desespero crescia. Roxos, cortes e queimaduras de cigarro...

Os olhos brilhosos do garotinho já não eram visíveis. Ele se transformou em uma criança calada, que mal reagia às brincadeiras que antes lhe arrancavam gargalhadas. Isso foi destruindo minha alma pouco a pouco.

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