II

13 1 0
                                    

Dileta,

Há muito tenho tentado escrever-lhe, contudo minha pena, antes prolixa, já não é mais a mesma. Como a labareda de uma chama, ela bruxuleia, vacila, distancia-se das minhas intenções, porque, conhecendo-me mais do que me conheço, ela sabe, o desejo teve enfim seu êxito: saciado, encontro-me humilhado. Não há nada mais vil, sinto dizer, do que conseguir o que se quer. É ver rir de ti seu então objeto de suposta felicidade. Nessas condições, cabe ressaltar, te escrevo, subalterno dos meus afetos e escravo do meu padecer.

Dir-lhe-ei de antemão, sem circunlóquios, amo-te. Sim. Não custou-me muito dizê-lo, todavia, segue agora uma admoestação sem fim. É necessário, como em toda poesia, dizer como te amo. Falaria talvez que te quero dos pés a cabeça, do cabelo bagunçado, despojado, castanho, languidescentes, aos dedos frágeis que, comumente comidos, aplaca-lhe a ansiedade instigando a minha. De dentro para fora, dessa pretensa escuridão que você finge emanar para defender-se, à doçura meiga do seu olhar intranquilo. De fora para dentro, da sua fragilidade mais forte, do seu receio mais certeiro, do seu medo mais corajoso. Me encontro em cada uma das suas contradições.

Sonho de olhos abertos, vendo-te feliz, com o riso a iluminar-me o caminho à felicidade. Vivo com seu perfume a invadir-me o olfato. O toque da sua pele somado ao doce embaraço da sua companhia, subtrai a incerteza da minha vida. Sou feliz quando penso na sua existência. Sou infeliz porque perdendo a guerra dos quereres, só quero pensar no seu abraço.





As coisas de dentroWhere stories live. Discover now