panic room

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Já se sentiu no inferno alguma vez?
Em algum momento, você preferiu morrer do que continuar lutando contra todas as coisas que pareciam maiores do que você?

Eu confesso que já, algumas vezes.
Mas em especial agora, vendo meu sangue tomando conta do chão, tudo parece tão irrelevante, tão drástico e irrefutável.

Estamos cientes de que devemos viver a fundo para que não hajam arrependimentos, entretanto temos que tomar cuidado para que esse a fundo não extrapole as barreiras da segurança. Mas como saber? Como saber se estamos vivendo ou nos defendendo?
Até que ponto você pula de paraquedas para diversão e em que momento isso se torna um risco para sua vida?

Em que momento o amor que te fazia acordar feliz e sorridente te faz querer definhar até a morte?

Quando exatamente o prazer e a adrenalina se transformam em vício?

Acho que estou em devaneio, quando minha visão embaçada desfoca do sangue no chão para analisar o corpo da mão que me puxava.

Olhos azuis novamente, desta vez preocupados, mas não consigo reparar muito ou definir a pessoa que me puxa e me apoia em seu peito, sinto meu corpo indo de encontro a inconsciência, mas ao mesmo tempo permanecendo, como em um limbo.

Um limbo entre a vida e a morte, o certo e o errado, o bom e o ruim... reflito um pouco até me lembrar da última vez que me senti assim, foi quando recebi a notícia de que meu pai havia sido assassinado em uma rodovia indo para o trabalho. Eu tinha 19 anos na época e por infelicidade do destino atendi o telefone, não tendo outra oportunidade de receber a notícia sem que fosse pelo baque de uma ligação de 24 segundos.
Me esforço para recordar sobre meu pai nos momentos que julgo serem meus últimos quando já não me vejo em condições para responder a voz que me pergunta se consigo entendê-lo. Meu pai, que tanto me amou e me respeitou durante toda minha vida, uma pessoa doce e gentil sendo alvejada por 17 tiros sem alguma explicação sequer é tudo que ecoa em minha mente durante bons segundos.

Me arrependo de ter me isolado tanto, eu tinha tantos amigos antes de ter episódios depressivos e crises de pânico. Ia a festas todo fim de semana, estava sempre me divertindo com Clair e aproveitando a vida como um adolescente.

"Harry? Consegue me ouvir?" - uma voz doce me pergunta mas não consigo genuinamente responder, estou absorto em meus pensamentos, meus arrependimentos e lamentações.

Me sinto em um quarto do pânico nesse momento, estou me protegendo da maneira mais absurda e angustiante possível, e de alguma maneira somente eu posso me tirar dessa situação, só eu posso abrir a porta, só tenho como sair caso eu resolva controlar a situação.

"Harry, preciso que responda" -sou chamado novamente pela mesma voz.
Minha vontade é ignorá-lo, mas sinto receio de não morrer e ter graves sequelas, tendo de depender de outras pessoas para me ajudarem e a angústia de atrapalhar mais alguém aumenta mais minha ansiedade, posso sentir minha respiração se acelerar e meu coração bombear mais sangue para meu corpo.

"Clair está aqui, Harry" -Abro meus olhos em espanto ao que ouço o mesmo médico dizer pacientemente uma frase que finalmente me faz querer "abrir a porta."

"E-ela está?" - Tento não evidenciar minha excitação em saber que ela veio me ver ao responder o médico de olhos azuis e cabelo liso castanho.

"Oh, graças a Deus você está consciente" - O mesmo diz em alívio enquanto coloca uma mão na altura de seu coração.

"Você disse que Clair está aqui, eu posso vê-la por favor?" - Reparo mais no médico e agora vejo seu semblante preocupado me fitando - "O que foi Doutor...?"- não consigo ver o nome em seu jaleco, já que meus olhos ainda estão um pouco embaçados e sinto uma leve tontura ao erguer meu pescoço.

healing is not forgettingOnde histórias criam vida. Descubra agora