25 Outonos

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Boston - Massachusetts
14 de Novembro de 2022

O apartamento de três quartos, onde Camila ainda morava com os pais, parecia menor naquela tarde de novembro. O vento frio entrava pela janela da sala, mas a tensão dentro da casa era sufocante. O ar fresco não conseguia dissipar o peso das palavras não ditas.

Camila estava no quarto, deitada na cama, ouvindo as vozes dos pais atravessarem as paredes. Eles não sabiam aonde ela ia, mas sabiam que suas saídas noturnas estavam se tornando mais frequentes e misteriosas. E o fato de ela não dar explicações estava irritando-os profundamente.

Na noite anterior, ela tinha passado a noite na casa de Lauren. Não era a primeira vez que isso acontecia, mas com certeza era a que mais a fazia pensar. Lauren aparecera na livraria de surpresa, como sempre fazia, uma garrafa de vinho na mão e aquele sorriso que Camila achava irresistível. Os olhos verdes de Lauren eram praticamente uma ordem para que ela largasse tudo. O jantar foi íntimo, regado a conversas soltas, vinho e toques mais íntimos. Ela acabou dormindo lá, enroscada no corpo quente de Lauren. E agora, ao voltar para casa de manhã, os pais a esperavam com o peso de um julgamento iminente.

"Camila! Venha aqui. Agora." A voz do pai soou do outro lado da porta, cortante, sem margem para desculpas.

Ela respirou fundo, sentindo o estômago revirar. Saiu do quarto com passos lentos, mas firmes, e os encontrou na sala. O olhar de seu pai estava mais frio que o vento que entrava pela janela aberta, enquanto sua mãe a observava com a habitual mistura de preocupação e desapontamento.

"Você pensa que pode sair e voltar na hora que quiser? Sem dar satisfação para ninguém?" O pai começou, a voz baixa, mas afiada. "Você não mora sozinha, Camila. Enquanto estiver debaixo deste teto, vai ter que respeitar as regras."

"Pai, eu só estava com amigos." Ela tentou manter a calma, mas o cansaço da noite anterior pesava em seus ombros. "Eu não estou fazendo nada de errado."

"Com amigos?" Ele deu uma risada curta e sarcástica. "Toda noite? Não sou idiota. Você sai, desaparece, volta quando quer, e acha que não temos o direito de perguntar? De se preocupar?"

"Não é questão de direito, é questão de controle!" Camila rebateu, a voz subindo sem que ela conseguisse conter. "Eu sou adulta. Eu posso decidir onde eu vou e com quem. Não preciso pedir permissão."

"Adulta?" O pai cruzou os braços, desafiando-a. "Uma adulta não precisa fugir no meio da noite como uma adolescente descontrolada. Uma adulta dá explicações, ganha respeito com honestidade, não com segredos."

"Não são segredos. É a minha vida. Eu estou tentando... respirar um pouco longe dessa pressão!" Camila se virou para a mãe, esperando uma tentativa de mediação, mas sua mãe também parecia desolada.

"Camila, nós só queremos saber se você está bem," sua mãe disse, com a voz trêmula. "Você desaparece, não sabemos o que está fazendo, e você não diz nada. Não entendemos por que você está se afastando."

"Porque vocês não vão entender!" Camila explodiu. "Eu não posso ser quem sou debaixo deste teto porque vocês acham que têm o direito de julgar cada passo que eu dou! Acharam mesmo que eu ficaria presa aqui para sempre, só porque vocês querem?"

O pai avançou um passo, o rosto endurecido. "Então diz pra gente quem você é, Camila. Diz o que está fazendo nas ruas até de manhã. Porque, pelo visto, você quer distância de nós."

Ela parou, o coração batendo descompassado. Cada fibra do seu ser gritava para fugir, mas ela sabia que não poderia escapar para sempre.

"Eu estou com alguém." As palavras saíram antes que ela pudesse pensar. "É isso. Eu estou com alguém e, sim, passo as noites fora. E não acho que tenho que justificar isso para vocês, porque isso é a minha vida."

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