Peter Pan

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Todo mundo conhece a história de Peter Pan. Quem nunca leu as aventuras fantásticas do menino que morava na terra onde crianças não viram adultos? Que criança não sonhou junto que podia voar, concentrando todas as forças em pensamentos felizes?

Lauren adorava esse conto em particular, como poderia não amar uma história onde havia um mundo mágico que adultos não podiam entrar e as crianças voavam? Era tudo que a cubaninha de Little Havana queria.

Paul, o primeiro padrasto, a tinha dado o livro, uma edição muito bonita com personagens da disney e páginas brilhantes. Lauren o manteve quase intacto por anos, até Simon o rasgar num de seus rompantes de raiva, a pequena havia cometido o erro de ignorar os chamados do homem para ler, o que para um bronco como ele, era um absurdo. Como ela ousava ignorar o homem da casa?

A pequena não entendia bem o que significava a expressão e porque devia ser importante para ela. Sim, só havia um homem naquela casa, e era assim em todos os modelos de família que a pequena conheceu, mas que diferença fazia o gênero? O que o tornava tão distinto ao ponto dela ser obrigada a respeitá-lo?

Veio ter um entendimento melhor aos 11, morando com o avô, quem nunca se auto intitulava de "homem da casa" embora o fosse e cumprisse todas as funções que a menina achava pertencerem a um homem.

Ricardo era prestativo, estava sempre consertando as tábuas da varandinha, lixando os movéis, procurando uma engrenagem que estivesse precisando de óleo ou uma lâmpada fraca para trocar. A avó quase nunca tinha que lhe pedir alguma coisa, e quando pedia, ele assentia, acenava com a cabeça, sorria como um adolescente e fazia.

Ele nunca levantara a voz ou a mão para a esposa, muito menos para Lauren, ele era tão silencioso. Foi uma das coisas que a pequena estranhara a príncipio, o silêncio, a falta de ecos das portas batendo, não havia móveis sendo arrastados com violência, nenhum grito

quando ele chegava em casa, buzinando seu táxi, nem copos sendo atirados em paredes, nem pratos sendo virados, empurrados na mesa.

Apenas a calmaria, pela manhã enquanto a panela italiana do café assobiava, Ricardo batia na porta do quarto dela, um quartinho pequeno mas inteiramente dela, pela primeira vez. Ela se arrumava para escola, ia levando um lanche preparado pela avó, saía e voltava as 16h, não precisava esperar ninguém pois vinha com seus amigos da escola. Nessa hora, a avó já estava costurando, o tec tec da máquina de costura singer de pedal era a música ambiente para os deveres de casa de Lauren. Era bons barulhos de se escutar, ela não trocaria por nada.

E a noite, Ricardo não batia a mão contra mesa ou gritava ansioso se o jantar não estivesse pronto assim que ele chegasse, não era incomum que ele entrasse na cozinha para preparar comida para si e para elas. Foi ele quem a ensinou que respeito se conquista, que masculinidade era diferente de agressividade.

Levou algum tempo para a menina entender que a bomba nunca explodiria, que ela não precisava mais se contrair toda vez que a porta da frente batia, que ela estava finalmente segura.

Um dia a avó a dera um exemplar de Peter Pan, uma edição pequena, que foi recebida com muito carinho pela neta. Jane sempre a mimava como podia, se culpava de não ter buscado a menina mais cedo, não ter compreendido que, talvez, a sua filha não fosse a pessoa mais adequada para ser mãe em suas condições. A mais velha apresentava a pequena como sua, e Lauren sempre ficava com as bochechas vermelhas quando as pessoas diziam "você é a cara da Jane mais nova."

Não queria ser parecida com sua mãe. Não era parecida com Roberta em nenhum outro aspecto além do físico, o que ficava mais evidente com cada ano que se passava.

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⏰ Última atualização: Sep 12 ⏰

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