A ansiosa

13 3 0
                                    

Esse conto foi escrito pelo autor Reidoci.

        Uma ligação, só uma ligação, foi do que precisei.
Foram as 3:00 da tarde, soube que minha cunhada estava mal, a doença se alastrou e foi preciso entubar. Parecia só uma pequena gripe, mas se fosse, não seriamos obrigados a usar máscaras nas ruas.
Senti-me nervosa no mesmo momento, tentei desviar a atenção, mas, à noite, a noite nos envolve com nossos medos, principalmente quando estamos sozinhas com nossos pensamentos na cama.
— Não se preocupa, ela vai ficar bem — meu marido me envolveu em um abraço.
Mal percebi tudo ao meu redor. Quando me dei por conta, o dia tinha passado e estava ao lado dele na cama. Parecia que estive dormente o tempo todo, nauseada com os pensamentos. Parei para lembrar o que fiz no dia — Acordei, fiz o almoço, minha filha participou da aula online…
Percebi que quase não me lembrava do que fiz depois das três. Eu sabia que tinha preparado a janta, lavado a louça, que Marisa passou o resto do dia lendo livros e jogando no computador, que meu marido chegou as seis, porém tudo isso era da nossa rotina… na verdade, não lembrava de nada, apenas deduzia.
Agora estava na cama, pensando. E se fosse com minha filha? Se fosse com meu marido? Estava perdida, os sons me assustavam e possibilidades terríveis me envolviam, problemas que não conseguia resolver, problemas que não precisava resolver, pois não existiam. As paredes, aos poucos, pareciam se mover no escuro, e as vozes da minha mente pareciam cada vez mais profundas. Me repreendi. Revirei-me na cama até o sono vir, finalmente durmo. As paredes, as vozes finalmente cessam.
O estado do sono. Não sei como esqueci disso, como esqueço a toda manhã… Contudo, logo a sensação invade, um aperto no peito, um peso, um sufoco. Sinto a garganta fechar enquanto tento gritar.  Resisto ao meu corpo que parece falecer, em instantes meu sono se torna uma luta.
Eu penso e repenso: “Não quero morrer”, repito para mim mesma na minha mente. Uma força me puxa para baixo. Não consigo me mexer, então, finalmente, caio em si. Abro meus olhos com esforço, tentando acordar daquilo, daquela perseguição, da escuridão, mas mesmo acordada isso não sai de mim, ela explode, como se algo me domasse, algo adormecido que tentei esquecer.
Mesmo no escuro o vejo, finalmente ele se revela, seu corpo pesa toneladas sobre o meu. Ele sempre aparece. Ele, que tantas vezes parece hirsuto nas sombras, que agora senta sobre meu busto, suas mãos frias apertão minha garganta. Meu corpo não me responde, o frio do seu toque parece me tomar tudo, o desespero floresce. Em minha pele sinto explosões, como calafrios, mas tão diferentes, como se pedras de gelo formassem em meu sangue, depois explodissem, esfriando tudo, e trazendo a sensação que já não tenho muito tempo.
Meus olhos tentam encontrar os dessa criatura sem rosto, que por sua vez se parece tanto comigo, tão humana. Grito, finalmente grito, mas me falta o som. A tamanha agonia que expressa minha voz sai em sussurros, enquanto as lágrimas escorrem. Não quero morrer, não quero!
Fecho os olhos mais uma vez, tento tomar fôlego, tento respirar. Minhas mãos finalmente voltam, mas por mais que force, não se abrem, estão tão pesadas que meus dedos parecem dar um nó. Assim, com o que me resta, medo ou força, talvez a adrenalina que percorre o sangue fazendo minhas carnes tremerem, o empurro de cima de mim. Ele se ergue, uma dor ainda maior invade meu peito, me lanço da cama, e quase caio no chão. Não sinto minhas pernas, mas sei que estão lá, forço-me a se equilibrar, cambaleio, em direção a porta. Ele ainda está logo atrás.
Tento reagir. Quero, não, tenho que fugir! Esbarro nas paredes, chocando-me ao caminhar pelo corredor. Ele me persegue em passos lentos, trazendo as sombras. Apoio-me com dificuldade nas paredes, com minhas mãos ainda alçadas com o nó de meus próprios músculos e vacilando tentado me equilibrar nas pernas dormentes, sem que nenhuma das outras sensações cessem.
Tento gritar mais uma vez, nada sai. Chego à cozinha ofegante, com dificuldade ligo as luzes, arrastando as costas do punho no interruptor. Meus olhos buscam sem sucesso a caixa de remédios, e mais uma vez sinto o toque frio do desgraçado no braço. Outras mãos surgem do escuro e seguram meu calcanhar. Rujo e dou tudo de mim para fugir. Aos tropeços chego ao armário, ainda em crise, pego os remédios, os calmantes.
Tentado usar as minhas mãos, retiro um dos comprimidos que despenca. Penso em pegar outro, ele está perto, não tenho escolha. Mergulho a procurando o comprimido, tudo mais frio, mais escuro, as luzes piscam, ou será que são meus olhos? Estou perdendo a consciência. Levo minha boca ao chão para finalmente tomar o calmante, engulo seco, porém minha garganta está fechada e nada desse. Arrasto-me até a torneira e com dificuldade a abro. Grito, só mais um sussurro. Tentando manter o remédio em minha boca, bebo a água cheia cloro diretamente da torneira e engulo.
Olho para trás e o vejo. Seu rosto sem feição nenhuma, totalmente vazio, agora sem nenhum pelo ou roupa cobrindo sua pele azulada como a noite. Ele recua lentamente, esconde-se no escuro, finalmente some.
Busco apoio para as costas na parede, e as lágrimas escorrem. O nó em minhas mãos se desfaz, escuto meus soluços e gemidos. Aos poucos os músculos sedem e volto a controlar todo o corpo. A sensação não sumiu, ainda sinto as mãos apertando minha garganta, ainda sinto o desespero e todas as outras sensações mesmo que pequenas. Sei que passarei a semana as sentindo, até sumirem sem que eu perceba.
Lavo o rosto e volto a cama. Meu marido se volta ao meu lado.
— Está tudo bem? — pergunta. — Não vi quando se levantou.
— Passei mal. Já estou melhor.
O sono me envolve, mais pesado dessa vez, nem sequer tenho como resistir, sou forçada a adormecer…
Mais uma vez acordo assustada, levanto-me de uma vez, o coração bate forte e acelerado, olho ao redor, a luz do dia já chegou. Não faço a mínima ideia de que horas sejam, mas o calor me diz que é tarde, talvez 11:00 horas.
Levanto e me olho no espelho, as linhas de expressões do meu rosto estão aparentes e sinto a indescritível vontade de tomar banho. Ajeito o cabelo, estou bem melhor do que na madrugada.
Uma sensação ruim invade, como se algo tivesse observando, ele. Olho para trás com o terror fluindo pela pele em forma de calafrios…, mas não há nada…
Eu sei o que significa…

Recado

Agradeço à minha mãe, que foi a responsável por descrever para mim os sintomas de sua condição (ansiedade), que a incomodou por muito tempo. Eu te amo, mãe. Obrigado por me apoiar! Dia 19 desse mês é o aniversario dela, e, por mais que ela não saiba ler, deixo minha homenagem a essa mulher que passou por muita coisa e continua de pé, mesmo em crises.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Aug 15 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

𝐄𝐮 𝐦𝐨𝐫𝐫𝐞𝐫𝐞𝐢 𝐝𝐮𝐚𝐬 𝐯𝐞𝐳𝐞𝐬 - 𝐓 𝐝𝐞 𝐓𝐫𝐚𝐮𝐦𝐚Onde histórias criam vida. Descubra agora