O azul mais profundo

Qeda

Nenhum deles gosta de estar próximo as cidades humanas, ali a água está sempre suja, há carcaças e lixo, o cheiro parece grudar em suas escamas e deixar um gosto amargo na língua. Acenando para o irmão, ele aponta para cima, as águas estavam turvas devido ao movimento das embarcações e os sons de cima vinham abafados, eles precisariam emergir.

Wave agita a calda e se impulsiona para cima, suas escamas verdes brilham com os últimos raios de sol. Qeda se afasta com um movimento da sua propria calda, não desejando ser golpeado pelo movimento do outro. O irmão parece esquecer o motivo de estarem ali, um pouco de desconforto valeria a pena quando seus planos se concretizassem.

Nunca é uma sensação agradável deixar o lar, o ar esfria mais suas peles, secado a água se fora por tempo demais, felizmente, dessa vez eles não precisam subir tanto para que tenham que respirar como os humanos, mais incômodo que a água secado era se adaptar a respirar pelo nariz. Eles estão longe para que os humanos não os notem sem que estejam os buscando propositalmente, emergindo ao lado do irmão, ele conta as embarcações atracadas no porto, há sete delas, contudo, apenas três parecem serem grandes o suficiente para estarem transportando uma grande carga. A segunda coisa que nota é que todas fervilham com seus tripulantes.

-︎ Como saberemos qual delas é? Todos os navios humanos parecem iguais para mim.-︎ O irmão se queixa em voz baixa ao seu lado.

Qeda não discute quanto a isso, por baixo, todos os cascos são iguais, madeira e ferro. Desanimador como era, não seria o suficiente para os desinibir, eles apenas teriam que chegar mais perto. Em algum lugar do grande mar seu cardume aguardava por um sinal, eles afudariam todos aqueles navios se necessário, ainda que tal ação acrescentassem riscos ao plano, seriam mais humanos e mais daquelas suas armas irritantes.

-︎ Porque suas barbatanas estão eriçadas? -︎ O guincho do irmão o desperta de seus pensamentos, nadando ao seu redor Wave para a sua frente, barrando parcialmente a visão do porto. Apertando os olhos esmeralda, ele se aproximando mais, desconfiança clara no olhar. -︎ Você está planejando algo estupido.

Qeda suspira, levantando uma mão para fora d'água, a passando sobre a barbatana de um lado do crânio, aquelas coisinhas tendiam a entregar seu humor.

-︎ É necessário, não podemos permitir que aquela carca chegue ao exército humano.

Achatando as delicadas barbatanas verdes conta os fios castanhos, Wave pergunta:

-︎ O que isso implica exatamente?

Não seria uma conversa agradável e Qeda estava preparado para as queixas, porém, eles eram guerreiros e por mais que o irmão se preocupasse com sua segurança, isso não os impediria de seguir com o dever. As ações daquele dia diziam mais respeito a todo o cardume e a guerra em si que a eles próprios, ainda que, se fosse ser sincero, Qeda queria fazer aquilo, como todas as vezes anteriores, nunca mostrando pudor ao afundar um daqueles navios, afinal, ele não tinha qualquer carinho guardado pelos humanos, o contrário, seria mais preciso.

-︎ Os humanos estão sempre falando e suas armas têm um cheiro distinto para nós, se eu estiver perto o suficiente, poderei dizer qual daqueles é o certo.-︎ Não há hesitação em seu tom, como líder designado ele deve se manter firme.

Seu irmão afunda mais na água, cobrindo a boca e nariz, seus olhos mão escondem o descontentamento, mas como Qeda previu, Wave entende o quão importante era aquela ação. Por um tempo nenhum deles diz nada, o sol afunda no horizonte e as ondas se movem por eles, suas caldas se agitam levemente em uma garantia de não serem levados com a maré.

-︎ Se algo acontecer, irei fatiar aquele estranho de orelhas pontudas.-︎ Wave diz quando volta a emergir, sua calda bate levemente na sua em uma demonstração irreverente, ambos sabem que Wave não fala sério, mas o irmão gosta de fingir o contrário, não pronto para admitir o afeto que guarda pelo filho das árvores.