Bônus

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Dean sentou-se na beira da cama do motel, com cheiro de álcool e mofo impregnando o ar ao seu redor. As paredes finas do quarto, pintadas com uma cor desbotada que poderia ter sido bege em algum ponto, agora pareciam sufocantes. A televisão chiava com um programa antigo, que ele nem se deu ao trabalho de desligar. Ele estava exausto, mas o tipo de cansaço que sentia não podia ser aliviado pelo sono.

A lâmpada ao lado da cama piscava fracamente, lançando sombras oscilantes pela pequena mesa de cabeceira, onde uma garrafa de uísque quase vazia repousava, um testemunho silencioso das noites passadas. Sam estava na cama ao lado, provavelmente já dormindo, ou fingindo estar. Dean não sabia, e naquele momento, não se importava. O silêncio pesado era quebrado apenas pelo zumbido do aparelho de ar-condicionado, que lutava para refrescar o ambiente.

Dean apertou os olhos, tentando afastar a dor surda na cabeça, resultado tanto da ressaca quanto do peso das memórias recentes. O Djinn havia mostrado a ele uma vida diferente, uma vida onde ele tinha tudo que sempre desejou, uma vida ao lado de Castiel. Era uma mentira, ele sabia disso, mas o que o incomodava mais era o quão real aquilo havia parecido, o quão real *Castiel* havia sido naquele mundo.

Ele tinha apenas um propósito: precisava falar com Cas. Não sabia exatamente o que diria, mas precisava tentar, precisava sentir aquela presença reconfortante, aquela sensação de que, de alguma forma, as coisas ficariam bem.

-Cas... eu... eu sei que tá me ouvindo, cara. Sei que sempre tá. Eu... eu preciso te ver. Preciso falar com você. - A voz de Dean tremeu ligeiramente, mas ele continuou, as palavras saindo de forma hesitante, como se ele estivesse testando a profundidade de uma água desconhecida. -Eu... tive esse sonho... Não, era mais que um sonho. Era uma vida, uma vida que eu vivi com você. E agora, tô aqui, e você não tá.

Dean estava deitado na cama do motel, com os olhos ainda fixos no teto manchado e descascado. O cansaço pesava sobre ele, mas o sono não vinha, impedido pela tempestade de pensamentos e emoções que o consumia. Ele ainda sentia o vazio deixado pela falta de Castiel, a sensação desconfortável de que algo crucial estava fora de lugar.

Ele suspirou, passando a mão pelo rosto, tentando afastar a frustração crescente. Estava prestes a se levantar novamente, talvez buscar conforto no fundo da garrafa de uísque, quando sentiu uma presença familiar — um súbito arrepio que percorreu sua espinha. Não precisou se virar para saber quem era.

-Cas…-  A palavra escapou de seus lábios em um sussurro, cheia de alívio e de algo mais profundo que ele ainda lutava para nomear. Lentamente, Dean se virou na cama, os olhos finalmente encontrando a figura alta e imponente de Castiel, parado ao lado da porta como se tivesse surgido do nada — o que provavelmente tinha, como sempre fazia. As asas invisíveis pareciam preencher todo o quarto, embora o anjo estivesse parado ali, imóvel, com uma expressão que era ao mesmo tempo tranquila e carregada de emoção.

Os olhos azuis de Cas fixaram-se em Dean, como se estivessem tentando ver através dele, direto até sua alma. Dean sentiu seu coração acelerar, a confusão e a angústia das últimas horas se dissipando lentamente, substituídas por algo mais intenso, mais real.

-Eu ouvi sua oração,- Cas disse suavemente, a voz rouca e grave, quase como se estivesse com medo de interromper o silêncio que havia entre eles.

Dean engoliu em seco, levantando-se da cama, sem desviar o olhar do anjo à sua frente. -Eu sabia que você ouviria,- ele respondeu, a voz mais baixa do que pretendia. Ele deu um passo em direção a Cas, e depois outro, até estar perto o suficiente para sentir a familiar presença reconfortante que Cas sempre trazia consigo, como uma barreira contra toda a escuridão que o rodeava.

Por um momento, os dois ficaram em silêncio, apenas se olhando, como se houvesse algo que ambos quisessem dizer, mas não sabiam como começar. Dean sentia o peso das palavras que estavam presas em sua garganta, uma sensação que ele odiava, mas que agora sabia que precisava enfrentar.

-Cas-  Dean começou, a voz falhando um pouco. Ele olhou para baixo, sentindo a pressão em seu peito aumentar. -Eu... não sou bom com essas coisas, você sabe disso. Não sou bom em... em falar sobre o que sinto. -Ele respirou fundo, como se estivesse se preparando para uma batalha. - Mas depois do que aconteceu, depois do que eu vi... eu não posso mais fingir que tá tudo bem.

Dean levantou os olhos, encontrando o olhar intenso de Cas. -Eu vivi uma vida com você, Cas. E por mais que fosse uma mentira, por mais que fosse uma armadilha do Djinn, aquilo me mostrou algo que eu... que eu tentei ignorar por tempo demais. Eu não posso continuar assim, não posso continuar fingindo que você não significa tudo pra mim.

Cas inclinou a cabeça ligeiramente, o gesto pequeno mas cheio de significado, enquanto suas sobrancelhas se franzem em uma expressão de confusão e curiosidade. -Dean, o que você está tentando dizer?

Dean soltou o ar que estava segurando, sentindo seu peito apertar. -O que eu tô tentando dizer, Cas, é que... eu te amo. Eu amo você, porra! Eu passei tempo demais correndo do que eu sinto por você, tempo demais tentando ignorar. Mas não dá mais. Eu não quero mais esconder, não quero mais fingir.

As palavras pareciam sair com uma força própria, como se finalmente tivessem encontrado uma brecha para escapar. Dean sentiu um peso enorme ser aliviado, mas, ao mesmo tempo, a vulnerabilidade de se expor de uma maneira que ele nunca havia feito antes o assustava. Ele não sabia como Cas iria reagir, não sabia o que viria depois disso. Mas o silêncio de Cas, a maneira como ele olhava para Dean, fez com que ele continuasse.

-Você sempre esteve lá, Cas. Mesmo quando eu não merecia, mesmo quando eu te afastei, você sempre voltou. E agora... agora eu entendo por quê. Porque eu não quero mais viver em um mundo sem você. E eu... eu preciso saber se você sente o mesmo.

Cas ficou em silêncio por um momento, mas seus olhos, que sempre carregaram uma infinidade de emoções não ditas, estavam intensamente fixos em Dean. Então, ele deu um passo à frente, diminuindo a distância entre eles até que estivessem tão próximos que Dean podia sentir a respiração quente de Cas.

-Dean…- Cas começou, sua voz tão suave e grave como sempre, mas agora carregada de emoção. -Você me deu muitas coisas, me mostrou muitas coisas. E uma delas é que... o que eu sinto por você é mais do que amizade, mais do que devoção. Eu te amo, Dean. Eu te amo de uma maneira que vai além de tudo que eu conheço.

Dean ficou imóvel, com o coração disparado. Ele ouviu as palavras de Cas, cada uma delas penetrando fundo em seu ser, confirmando o que ele havia suspeitado, mas nunca teve coragem de admitir. E então, Cas continuou, suas palavras soando mais convictas, como se ele estivesse derrubando as últimas barreiras que o impediam de se expressar plenamente.

-Eu estava preparado para morrer, Dean, - Cas disse, a intensidade de sua voz crescendo. -Preparado para ir embora sem nunca ter te contado isso, porque o que eu sinto por você é puro, é uma parte de quem eu sou. E quando você rezou para mim, eu soube que você precisava ouvir isso. Eu te amo, Dean Winchester. Eu te amo, e nada no mundo pode mudar isso.

As palavras de Cas foram como um alívio, como se finalmente tudo se encaixasse. Dean não conseguiu mais conter o impulso que sentiu. Com uma urgência que vinha do fundo do seu ser, ele agarrou Cas pela lapela do casaco e o puxou para um beijo, seus lábios colidindo em uma mistura de desespero, alívio e paixão.

O beijo começou intenso, mas logo suavizou, os lábios de Dean moldando-se aos de Cas, que retribuía com a mesma intensidade, como se esse momento fosse a resposta para tudo o que eles haviam vivido juntos. Era como se todo o tempo que passaram  lado a lado, todas as lutas e sacrifícios, convergissem para aquele instante.

Quando finalmente se separaram, ambos respiravam pesadamente, as testas encostadas uma na outra. Dean olhou nos olhos de Cas, seus dedos ainda segurando firmemente o casaco do anjo, como se ele tivesse medo de que Cas desaparecesse.

-Eu te amo, Cas,- Dean repetiu, sua voz agora mais calma, mais certa. Ele sabia que, finalmente, tinha encontrado o que sempre procurou.

-E eu sempre estarei aqui- Cas respondeu, a voz cheia de uma promessa que ia além das palavras. Eles se beijaram novamente, desta vez com mais calma, mais suavidade, saboreando cada segundo.

A noite ao redor deles parecia finalmente tranquila, o mundo lá fora ainda cheio de monstros e caos, mas ali, naquele pequeno quarto de motel, tudo estava bem. Finalmente, Dean e Cas haviam encontrado seu próprio pedaço de paz.

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