Parte 1: A ideia de uma vida
É da natureza humana andar em bando, o conceito de família existia muito antes da língua base ser criada, é um ciclo vicioso que é de sina daqueles que não se questionam o porquê dessas ações e agem da forma mais normal possível.
Agora, de qual princípio se parte a ideia de algo normal? Arranjar um emprego e conseguir uma esposa para montar uma família? É um ciclo cruel, mas nem mesmo eu escapei da tentativa desse ciclo.
Aos meus 16 anos de idade eu me apaixonei pela garota mais linda que eu conheci na vida, ela era brilhante, tão bela e tão sensível, parecia um tesouro de uma fantasia que em bilhões de galáxias se tornou a mais surreal. A paixão é algo horrível, te torna escravo de pensamentos que não são seus por completo e refém de uma vontade que até então era inexistente em qualquer realidade imaginável, mas é maravilhoso sentir que você ama alguém, dá sentido ao que você vive, dá cor e graça aos dias cinzas e sem graça, te mergulha na ilusão de que tudo está certo.
Eu me apaixonei por uma garota chamada Agatha, ela tinha os cabelos escuros cacheados e a pele clara e macia, ficava vermelha toda vez que se irritava ou ficava com vergonha. Eu nunca havia me apaixonado antes, para ser sincero achei que nunca ocorreria, nunca vi as pessoas como algo belo ou algo interessante, sempre como comum ou imundo, mas ela era diferente, ela era magia pura.
Ninguém sabe como agir direito aos 16 anos de idade, eu muito menos, em nenhum momento consegui manter uma mínima interação com ela, sempre suando ou sempre confuso, eu era um idiota e completamente imbecil. A consequência disso era que meus sentimentos até então eram só meus, sem reciprocidade por conta da falta de contato, mas assim como a mudança da estação que ocorre folha por folha, a mudança das nossas estações começou em um dia de domingo.
Eu não era exatamente um gênio quando se falava em estudos ou atividades envolvendo escrita e leitura, mas em relação a arte e esportes, eu era algo que poderia ser chamado de destaque, não acredito que aplicar valores em cima de determinados atributos seja algo certo a se fazer, mas sim, eu era bom pra cacete. Participei de muitos jogos na escola e fora da escola, eu virei um destaque por um período de tempo, até eu me machucar, a Agatha era responsável pela equipe de cuidado caso alguém se machucasse em algum jogo, o que foi o meu caso, eu desloquei o meu ombro tentando empurrar um garoto com 5 vezes o meu tamanho, eu não era muito esperto.
Assim como começou, meu momento de glória se esvaiu do dia pra noite, mas eu ganhei algo melhor ainda, a atenção dela.Parte 2: O começo do final
Apesar das dores e o desconforto de ter o ombro deslocado, a atenção que recebi dela durante o período de repouso fez com que tudo valesse a pena, o rosto dela era perfeito, sua voz era tão doce de ouvir, e os seus olhos… Aaah os seus olhos, eram profundos e lindos, como o fundo do oceano de uma terra de sonhos que nunca poderia ser real.
Ficamos amigos muito rápido, tínhamos tanto em comum que parecia destino, por mais que eu não acredite nisso, passava o dia com ela, e quando não estava com ela pensava em quando podia estar com ela de novo.
A paixão tão quanto triste, é tão linda aos olhos de quem a possui quando se é correspondida, que era o meu caso. Me declarei para ela na noite de seu aniversário e me surpreendi com a resposta, um caloroso e certeiro "sim" os olhos lindos aos quais eu me apaixonei, brilharam. Após esse acontecimento o mundo foi outro, nunca me senti tão alegre ao saber que eu estava vivo, realmente havia ganhado uma razão, algo a mais, algo pra fazer o mundo brilhar em cores.
Relacionamentos exigem muita maturidade e responsabilidade, e eu não tinha nenhum dos dois. Eu estava tão feliz com o acontecido, mas quando acalmou os ânimos, eu entrei em completo pânico, não sabia o que significava ter uma namorada, não entendia como funcionava muito menos o que eu tinha que fazer, por conta disso, no início eu cometi atos bem desagradáveis a ela, fui estúpido e ignorante muitas vezes, a tornei distante de mim sem perceber, e quando percebi agi de forma infantil sem ao menos uma chance de conversar, quando comecei a trata-la de forma correta e parei de me comportar como uma criança, já era muito tarde, eu a havia machucado e muito.
Ela mesmo assim não acabou com tudo, continuou comigo porque tinha a esperança que eu melhorasse, eu por outro lado não sentia que merecia tal pessoa, o brilho que eu tanto admirava, eu mesmo estava o apagando, eu percebi que por mais que eu me considerasse uma pessoa boa, não estava impedido de ser ruim. Eu decidi encerrar a tortura psicológica, acabei com o relacionamento, eu não estava pronto e ela não merecia arcar com as consequências, ela era linda e especial, tinha muitos problemas em casa, não queria ser mais um, eu não merecia ela e ela não merecia passar por isso.
Dia 22 de março, marquei de me encontrar com ela para conversar, em uma lanchonete na avenida perto da escola, não queria vê-la chorar, estava ansioso e minhas mãos suavam, eu me senti estranho, não era só nervosismo, parecia que tinha alguém me sussurrando algo no ouvido, eu me arrepiei. O tempo passava e nada dela, comecei a ficar preocupado, após uma hora voltei para casa, minha mãe estava me esperando na porta, o que eu tinha feito? Eu lembro de tê-la avisado que iria sair, quando me aproximei percebi que ela não estava com raiva, ela me olhou da mesma forma que a tia Dani olhou pra ela no dia que meu avô morreu… Dia 22 de março, vítima de violência doméstica sofrida pelo próprio pai e madrasta, Agatha Ferreira morre de asfixia.Parte 3: Conclusões
Assim como todo ser humano em crise, optei em por a culpa da minha dor e mágoa em algo físico, mas como um adolescente, que acha que o mundo é belo e cheio de bondade, não consegui relacionar a culpa da morte ao próprio pai. Não obtive chão por longos meses, não somente pela morte da garota que mais amei, mas pela culpa que me consumia todos os dias, culpa de não ter visto os sinais, culpa por ser só mais um problema para ela, culpa por não ter feito nada a respeito, apenas precisava culpar algo pra assim conseguir superar essa dor. Superar, algo que nunca fui bom, a dor ainda existe e eu sinto-a todos os dias como se fosse o primeiro deles, o pior de tudo, é que parei de me culpar.
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Tudo que consigo
Short StoryMomentos marcantes e desenvolvimento de um homem durante sua vida