Toda Cobra Troca de Pele

O ARTIGO

Os pesadelos o assombravam ainda, e eram cada vez mais nítidos. Mas Harry não sabia o que eles significavam... Era um longo, longo, corredor, iluminado estranhamente com luzes esverdeadas que continuavam pelo caminho distante, com azulejos pretos e piso de porcelanato. Harry não estendia muito bem esses sonhos, mas era como se ele estivesse vendo tudo de baixo, rastejando, sentindo as coisas por debaixo da sua pele como se elas fossem continuamente unidas e ao mesmo tempo se arrastassem por baixo dele. O ar era um pouco frio e quase sem vida, e tinha gosto. Mas Harry não conseguia entender o porque que ele sabia dessa informação.

Ele também não conseguia dizer porque que aquele sonho o deixava tão ansioso ao ponto de acordar diversas vezes durante a noite, com um torcicolo infernal que o acompanhava constantemente pela tensão de seus músculos.

Eram sonhos estranhos, que pareciam com os do ano passado, e ao mesmo tempo eram totalmente diferentes. Eles tinham aumentado depois que Draco precisou ser separado de Harry, e agora o garoto não tinha com quem desabafar sobre eles. Ele tentou, falando para Ron e Hermione, que não pareciam tão impressionados com isso, principalmente Hemione, que não acreditava em nada que fosse uma sombra de divinação sequer.

Harry queria conversar com Draco sobre isso, mas não sabia como, já que o garoto não tinha aparecido.

Já fazia três semanas desde que Harry precisou depor no ministério (de novo) e mostrar Draco para eles, os convencendo de que a cobra era simplesmente isso. Uma cobra. Por isso ele não conseguia entender porque estava demorando tanto tempo para Draco aparecer. Logicamente, na verdade, ele entendia muito bem, principalmente porque Hermione constantemente o segurava no seu ombro e dizia "ele tem que demorar um tempo, Harry, assim ninguém irá suspeitar de que Dragão e Draco eram de fato a mesma coisa, er, pessoa, animal?" E Harry iria assentir com a cabeça em confirmação e aceitar essa explicação, com certeza. Mas isso não afastava a sensação estranha que ele sentia na boca do estômago.

Porque, veja bem, ele estava com saudades de Draco. Por incrível que pareça, afinal aquele era Malfoy, pelo amor de deus! O mesmo garoto insuportável dos anos anteriores.

Mas ter Draco como a cobra Dragão ao seu lado fez Harry começar a entender uma coisa importante sobre as outras pessoas além dele, que era profundidade. Draco tinha diversas camadas, uma história de vida mais profunda e próxima de Harry do que ele poderia esperar, e Harry estava sedento por essa proximidade com outra pessoa.

Por isso, quando os pesadelos estranhos não aconteciam, eram sonhos estranhos que faziam Harry acordar sobressaltado pela noite. Sonhos onde ele explorava as coisas com Malfoy. Onde ele imaginava brigas antigas tomando uma nova forma, com continuidades que ele nunca tinha explorado antes. O que sinceramente era bem ridículo, afinal ele não tinha ideia alguma de que Draco sequer gostava de garotos! Quanto mais de Harry! Mas só de pensar sobre isso, ele lembrava da maneira como Draco se aninhava por baixo de suas roupas, como se estivesse o abraçando, ou como Draco costumava encostar o focinho no rosto de Harry várias vezes como se estivesse beijando seu rosto, ou naquela noite em que os dois tomaram banho juntos e tudo pareceu real demais.

- Finalmente! - A voz de Hermione tirou Harry de seus devaneios enquanto ela sentava na mesa da Grifinoria com o O Pasquim aberto. - Nossa versão foi publicada hoje pela manhã, e até agora nenhum jornal do Profeta Diário foi entregue. Apostam quanto que eles estão reescrevendo a edição de hoje?

- O artigo saiu? - Harry perguntou, já olhando por cima do ombro da amiga e encarando as longas letras chamativas:

EXCLUSIVA: HARRY POTTER FALA CONOSCO FINALMENTE.

O garoto tentou segurar uma careta para a enorme foto que tinha na capa da revista com seu rosto no torneio tribruxo do ano passado, e começa a ouvir Hermione ler: