Prologo

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O vento soprou forte, balançando as altas folhas dos canaviais que se estendiam até o horizonte. O som, semelhante a um sussurro, ecoava entre os vastos campos do Engenho Gindaí , testemunhas silenciosas de gerações de sofrimento e poder. Sob o sol escaldante , o cheiro doce da cana recém-cortada misturava-se com o suor dos trabalhadores, enquanto o engenho, com suas engrenagens ruidosas e chaminés fumegantes.

Era nas terras férteis de Rio Formoso, sob a jurisdição da antiga comarca de Sirinhaém, que João Maurício Vanderlei nasceu. Filho de uma escrava e de um senhor de engenho, João crescera entre os sussurros das senzalas e os olhares frios dos salões da casa grande. Desde cedo, sua condição de bastardo era uma marca que carregava, mas também um mistério que o distinguia dos outros filhos de escravas. Sua pele, levemente mais clara, e seus modos instruídos revelavam a origem misturada de seu sangue.

Não demorou para que o jovem João despertasse a curiosidade da elite da província de Pernambuco. Ao contrário dos outros filhos de senhores, que se acomodavam no privilégio, João buscava nas letras e nos negócios o caminho para algo maior. Enquanto observava as transações nos mercados de açúcar e as intrincadas relações entre senhores e comerciantes, seu tino apurado para os negócios o destacava. João via oportunidade onde os outros apenas viam tradição. Mas, a cada passo que dava rumo ao sucesso, um novo inimigo surgia.

O maior deles: Dona Francisca Vanderley. Irmã de seu falecido pai, Francisca não via com bons olhos a ascensão de João. Para ela, o nome Vanderley jamais deveria ser manchado pelo sangue de uma escrava, e cada vitória de João era uma afronta à sua honra. A tensão entre os dois era palpável, e os olhares que trocavam diziam mais do que qualquer palavra dita no silêncio de uma sala de estar.

Com a morte de seu pai, João se via alçado à condição de herdeiro dos vastos latifúndios. Agora, sob o peso de um sobrenome que não o queria, ele teria que enfrentar não apenas o desdém de sua tia, mas o preconceito de toda uma sociedade que insistia em colocá-lo à margem. Seria ele capaz de carregar o legado dos Vanderley e moldá-lo à sua própria imagem, ou seria esmagado pelas forças que conspiravam contra ele?

João sabia que os caminhos que o aguardavam seriam árduos. Mas o sangue que corria em suas veias, o mesmo sangue que plantara as raízes do Engenho Gindaí, também carregava em si a força de gerações que lutaram pela liberdade. A história de João Maurício Vanderlei estava apenas começando, e os campos de cana eram o palco de sua ascensão.

Enquanto o sol se punha, banhando o engenho em tons de laranja e vermelho, João olhou para o horizonte e soube que o destino estava em suas mãos.

Um legado de sangue e açúcarOnde histórias criam vida. Descubra agora