Capítulo 1

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1807

A esponja deslizava em minha pele sob a água morna. Meu corpo pesava como chumbo, incapaz de levantar o próprio braço para que minha dama de companhia me auxiliasse no banho dentro da grande bacia. Meus olhos permaneciam vidrados no horizonte cinzento da paisagem além da janela; o tempo nublado fazia tudo parecer sem vida, sem cor. Era como se todos os meus sentimentos tivessem sido vomitados para fora, e a sensação de ter sido arrancada da minha própria realidade me fazia agir no automático enquanto a mulher me secava delicadamente com uma toalha macia.

Minhas vestes agora seriam pretas, e eu não relutaria em usá-las—meu mundo havia perdido toda a cor, e eu não conseguia mais vestir outra cor sem ele ao meu lado. Sentia-me culpada por não ter feito o suficiente; tudo o que fizera não bastou para salvá-lo.

Meus pés foram calçados com os sapatos, embora eu preferisse caminhar descalça pela estrada da plantação. Sabia que alguém me impediria, então não protestei ao usá-los.

Ao sair do quarto, o cheiro de flores-do-campo misturava-se com o aroma da cera das velas espalhadas pela sala de estar. As pessoas me olhavam com pena, e eu só conseguia sentir vergonha por não ter conseguido salvar meu marido. Como poderia? Havia sido um dia difícil, para mim e para ele.

As pessoas não sabiam, nem poderiam saber, o que se passava naquela fazenda. Tudo fazia sentido apenas para mim e para Breton; prometemos um ao outro que ninguém entraria em nosso mundo.

Fazia um mês que descobri estar grávida. Foi uma felicidade para nós dois, e Breton criou uma nova fragrância, a qual chamou de Renese, o nome que daríamos à nossa garotinha. No entanto, perdi a criança na semana passada, e desde então, tudo começou a desmoronar.

Ao olhar para o caixão aberto e vê-lo, percebi que ele não era mais o mesmo de quando dormia. As pessoas têm o hábito errado de dizer que os mortos parecem estar dormindo para nos confortar, mas isso não é verdade. Breton não dorme assim, e é aterrorizante vê-lo frio, sua pele antes tão quente com um toque carinhoso e delicado, como se temesse machucar a pétala de uma flor rara.

— Senhora Floquet, gostaria de comer alguma coisa? — Uma voz rouca se aproximou do meu ouvido, ao mesmo tempo em que uma mão quente pousou em meu ombro.

Não olhei para a pessoa, mas imaginei que fosse o padre Roger, um homem a quem meu marido admirava profundamente e de quem frequentemente buscava conselhos e apoio. Se não fosse padre, poderia jurar que eram amantes. Era natural que ele estivesse presente no velório, pois padre Roger e Breton eram inseparáveis; meu marido sempre parecia aliviado após uma conversa com ele, como se o peso que carregava no peito desaparecesse por completo.

Um homem de fé e devoto como Breton certamente encontrou a paz, mesmo que todos duvidem que aqueles que tiram a própria vida estejam livres desse pecado. Mas para mim, esta era uma madrugada infernal.

Tudo tinha começado horas antes, em uma briga amarga. Breton repetia que eu era uma esposa ingrata e mentirosa.

— Você escondeu de mim — disse ele, os olhos vermelhos, com lágrimas ameaçando cair.

— Não escondi nada de você, meu amor — tentei ser firme, mas um nó na garganta quase me sufocava. — Contei sobre a gravidez, sobre a perda do bebê... contei tudo — uma lágrima solitária desceu por meu rosto.

— Geneviève — sua mão segurou meu rosto, os dedos estavam frios como gelo. — Você realmente não sabe do que estou falando? — Sua voz era fria, como se sua alma tivesse congelado, cada palavra me atingia como um golpe.

— Se está falando dos meus diários... — comecei, confusa. Não havia nada neles que Breton não soubesse. — Meu amor, eu... — Respirei fundo, segurando seu rosto entre minhas mãos. — Nunca escondi nada de você. Prometi que seríamos nós dois contra o mundo, que ninguém interferiria em nada. Mas você se afastou, se fechou em um casulo e não me contou nada.

Contrato de Judas - Pitch BlackOnde histórias criam vida. Descubra agora