Capítulo 3

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1807

Todas as manhãs tornaram-se tão vazias quanto as noites. A cama era fria, e o sono, uma ilusão distante. Mal conseguia fechar os olhos; dormir na nossa cama era impensável.

Era impossível imaginar voltar para aquele quarto, como encarar o vazio depois de perder o homem que foi meu grande amor? Aquele a quem fiz promessas que agora pareciam inalcançáveis. Como seguir em frente sem ele?

Os pássaros cantavam na árvore perto da janela do quarto de hóspedes. Duas semanas haviam se passado desde a morte de Breton, e ainda assim, eu permanecia ali, sem coragem de voltar ao nosso leito. Olhei pela janela, para a plantação de íris, tentando buscar forças.

Todos os funcionários me alertavam: era preciso retomar a produção ou perderíamos tudo. Mas por onde começar? A contabilidade, os funcionários, a fazenda... tudo parecia desmoronar ao meu redor.

— Senhora Floquet? — A voz suave de minha dama de companhia me tirou dos pensamentos. Ela era mais velha que eu, mas não o suficiente para ser minha mãe. No entanto, era a única que nunca me julgou, nunca questionou meu comportamento. — Chegou uma carta para a senhora.

— De quem é? — perguntei, notando o envelope em sua mão, o braço estendido na minha direção.

Era o mesmo tipo de carta que sempre chegava: sem nome, sem remetente, apenas o meu nome escrito. Nunca contei a Breton sobre essas cartas. Era um segredo que apenas Madelene e eu compartilhávamos.

— Mais uma daquelas cartas sem remetente — murmurou, com um olhar de preocupação.

Aproximei-me rapidamente, pegando o envelope. Meus dedos tremiam ao tocar a textura do papel.

— Alguém mais viu? — indaguei, a voz mal saindo.

— Não, senhora — Negava com a cabeça — Tomei muito cuidado, como sempre faço.

— Sempre temi que Breton descobrisse. — Suspirei, o peito apertado pela culpa que me corroía — E se ele viu alguma dessas cartas, Madelene? E se foi isso que o levou...?

— A senhora não tem culpa do que aconteceu — Madelene falou firmemente. — Não foi isso que o fez tirar a própria vida.

Mordi o interior da bochecha, sentindo o gosto metálico do sangue.

— E se ele leu? E se foi sobre isso que estávamos brigando?

— Não seja tola, menina — Ela me repreendeu, mas sua voz era doce. — Breton estava bravo por outros motivos, coisas que ele escondia de você, não sobre as cartas.

A verdade doeu como uma lâmina.

— No fundo, nós dois tínhamos segredos — Minha voz falhou, e as lágrimas encheram meus olhos. — Talvez, se tivéssemos sido honestos, ele ainda estaria aqui.

— Não pense assim, minha senhora. — Madelene suspirou e apertou meu ombro com carinho. — Breton a amava, mas estava submerso na própria escuridão. Você não poderia salvá-lo de si mesmo.

Meus dedos tremiam enquanto abriam o envelope. Lá dentro, um cartão com uma caligrafia impecável fez meu coração disparar. Instintivamente, levei a mão aos lábios, sentindo o gosto do medo enquanto meu corpo congelava por alguns segundos.

— Está tudo bem, senhora Floquet? — Madelene se aproximou, seus olhos refletindo preocupação. — A senhora está pálida como uma vela.

Ela rapidamente foi até a penteadeira, encheu um copo d'água do jarro e me entregou.

— Beba, vai lhe fazer bem.

— Eu... estou bem — menti, embora o som do meu coração martelasse em meus ouvidos, o sangue queimando em minhas veias.

Contrato de Judas - Pitch BlackOnde histórias criam vida. Descubra agora