One Shot

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Na pequena cidade costeira de Crescent Bay, 1986 parecia se arrastar ao som de fitas cassete, com o brilho frio dos fliperamas iluminando as noites e o vento do oceano carregando consigo um ar de nostalgia precoce. As batidas dos sintetizadores ecoavam pelas ruas, como uma trilha sonora invisível para os sonhos e segredos que habitavam os corações inquietos dos adolescentes. O verão estava à beira do fim, e com ele, o início das aulas no colégio Crescent High se aproximava como uma tempestade prestes a irromper. Mas ninguém estava preparado para a colisão inevitável entre dois mundos que pareciam tão distantes, mas que, na verdade, estavam destinados a se encontrar.

Keith Kogane era um enigma. O tipo de garoto que nunca falava mais do que o necessário, mas cujo silêncio dizia mais do que qualquer palavra. Seu cabelo preto sempre parecia bagunçado, mas de um jeito calculado, como se o vento o moldasse para destacar sua rebeldia natural. Sua jaqueta de couro já desgastada e a moto ruidosa que ele pilotava pelas ruas da cidade faziam de Keith uma figura que captava todos os olhares — mesmo aqueles que ele ignorava com maestria. Ele era uma presença solitária, como se carregasse o peso de algo que ninguém mais entendia. Nos dias de folga, enquanto outros adolescentes se reuniam nas festas ou no fliperama, Keith escapava para a praia deserta, com o walkman nos ouvidos e os olhos perdidos no horizonte, o vento do mar acariciando seu rosto como uma lembrança antiga.

Havia uma intensidade inabalável em Keith. Uma energia contida que parecia pronta para explodir a qualquer momento, como se ele estivesse constantemente em alerta, esperando por algo — talvez uma chance, um sinal, uma mudança que ele não conseguia definir. E essa intensidade se infiltrava na atmosfera ao seu redor, atraindo olhares furtivos, sussurros, mas também medo. Ele era difícil de ignorar, e ainda mais difícil de entender.

Lance McClain, por outro lado, era a personificação do oposto. Onde Keith era todo mistério e quietude, Lance era brilho e som. Sempre rindo, sempre no centro das atenções, com uma piada pronta nos lábios e um sorriso que iluminava até o mais escuro dos corredores da escola. Lance vivia cercado de pessoas, mas, por dentro, ele sentia um vazio que nem as multidões conseguiam preencher. Ele se gabava de seu charme, especialmente quando estava rodeado de garotas, mas, no fundo, Lance sabia que havia algo faltando, algo que ele não conseguia nomear — uma lacuna que suas piadas não conseguiam preencher.

Um dia, como se guiado por um impulso invisível, Lance se pegou observando Keith à distância. O céu de Crescent Bay estava tingido de laranja, o pôr do sol lançando uma luz dourada sobre a cidade, transformando cada detalhe em algo mais dramático, mais vívido. Keith estava lá, parado ao lado de sua moto, encarando o oceano, com uma expressão tão tranquila que fez o estômago de Lance se contorcer com uma sensação que ele não sabia como nomear.

O vento balançava os fios de cabelo escuros de Keith, e por um segundo, Lance teve a impressão de que o mundo havia parado, que tudo — as batidas dos sintetizadores, o som distante das ondas quebrando nas rochas — desaparecera. O que restava era apenas ele e Keith, e aquela distância infinita entre eles, uma distância que não era física, mas emocional. Havia algo na forma como Keith parecia estar em paz na solidão, algo que Lance nunca entenderia, porque, por mais que estivesse cercado de amigos, ele nunca se sentiu tão... sozinho quanto naquele momento.

A tensão entre eles, no entanto, não demorou a crescer. Quando as aulas recomeçaram, Lance, sendo quem era, não conseguiu evitar. Ele implicava com Keith sempre que podia, suas piadas e comentários sarcásticos sendo uma fachada para algo que ele não estava pronto para enfrentar. O que era aquela sensação estranha que surgia sempre que os olhos de Keith o encontravam? Aquele aperto no peito, aquela faísca de raiva misturada com... curiosidade? Ele não sabia. E não queria saber.

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