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Quando acordei minha esposa já tinha ido embora, as cortinas estavam abertas, era um sinal seu de que eu devia acordar logo.

Me levantei, fui ao banheiro, ainda me sinto estranhamente cansado, apesar de ter dormido 12 horas essa noite. Me olhei no espelho e meu cabelo estava completamente bagunçado, suspirei e entrei no banho.

Desde que me casei, mesmo estando em casa me arrumo como se fosse sair, meus sogros me repreenderam quando os conheci... Não fez eu me sentir muito acolhido. Agora meu guarda roupa consiste de calças de linho, camisas sociais, blazers, coletes, gravatas... Me disseram que era apropriado que um escritor se vestisse dessa maneira.

Não gosto de me destacar muito, apesar desse estilo de vida ser confortável, olham pra mim por onde eu passo. Hoje estou vestindo uma calça preta e uma camisa branca, é o que parece mais comum.

Hoje decidi que vou ajeitar meu "escritório", não gosto de chamá-lo assim, parece muito sério e, mesmo que de fato se trate do local em que realizo meu trabalho, é muito mais livre que isso. É o meu espaço pessoal.

Juntei as bolas amassadas de papel, organizei os cadernos e livros que estavam empilhados no chão em seus devidos lugares nas estantes e aspirei. Quando minha esposa ou outra pessoa aspira em casa, o barulho é horrível, me ensurdece, mas quando eu aspiro o som invade meus ouvidos fazendo com que não ouça mais nada, é bom, é pacífico.

Com tudo arrumado, me sentei à mesa, liguei o computador no programa. "Piloto", primeira página, zero palavras escritas. Olhei ao redor, para as estantes com minha coleção extensa de livros. Dostoyevsky, comprei 6 anos atrás, Crime e Castigo, durante a faculdade. Como escritor tenho vergonha de dizer que ainda não tirei o livro do lacre, pelo menos é edição limitada.

Eu abri o livro. Comecei a ler...

Não sei por quanto tempo dormi, mas olhando pro livro sob meu rosto, não passei da primeira página.
O computador ainda estava ligado, mas tinha algo escrito:

"Uma das feições mais horríveis que já vi."

Piloto, primeira página, 7 palavras escritas.

Ah sim, a garçonete de ontem... Me recordei dela, mal vi seus olhos de tão baixa que sua cabeça pesava, sua franja também os cobria. Me senti sufocado assim que olhei pra ela, a atmosfera ficou dez vezes mais densa. Como alguém assim pode trabalhar atendendo clientes? É surpreendente.

Ainda sim, não lembro de ter escrito isso, a única coisa de que me lembro é que eu estava lendo a primeira página do livro e de repente apaguei. Que estranho.
Olhei pro relógio na parede, 16:40.
Peguei minhas chaves, pus meu casaco, me perfumei e saí com o carro.

Mesma lanchonete, mesmo horário. Esperei minha vez na fila, respirei fundo, me preparando pra sorrir e pra falar.
–Parece que vai se tornar um rosto frequente por aqui... Kaleb. – Sorri de volta, então ela lembra de mim.
–Não acredito que me reconheceu. – Disse entre risos leves.
–Fiquei sabendo do incidente de ontem,– Sua feição antes risonha se tornou levemente preocupada.
–Sinto muito pelo que aconteceu..
–Não precisa se desculpar foi apenas um incidente.

Incidente que se não tivesse acontecido, eu não estaria aqui, estranhamente nervoso, pedindo desesperado pra que seja ela que me atenda.
Fiz meu pedido, queria algo diferente hoje, pedi uma torta de limão e um milk-shake de baunilha.

Esperei, esperei, esperei, finalmente sinto uma aproximação. Não era ela.
–Aqui seu pedido. – Sua atmosfera por sua vez era gentil.
–Muito obrigada. – Tentei dar meu melhor sorriso e não demonstrar minha completa decepção ao não ser ela.
–Lembra-se de quem te serviu ontem? Acho que ela não soube expressar bem o quanto estava arrependida... Bom, foi ela que fez essa torta de limão, espero que sirva pra recompensar a bagunça de ontem.

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⏰ Última atualização: Sep 27 ⏰

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Palavras Manchadas de TintaOnde histórias criam vida. Descubra agora