04.

23 4 0
                                    

𝗖𝗮𝘁𝗮𝗿𝗶𝗻𝗮 𝗕𝗲𝗻𝗻𝗲𝘁𝘁


27 de Agosto de 2023.

Caminhei pelos corredores até a sala indicada, meu coração batendo um pouco mais rápido do que eu gostaria de admitir. A cabeça de médica se aplicava a qualquer emoção. Não importava quem estivesse naquela maca. Ele era apenas mais um paciente, e eu tinha um trabalho a fazer.

Assim que entrei na sala, o som das máquinas monitorando seus sinais vitais preencheu o espaço. Joaquín estava deitado na maca, os olhos fechados, o rosto tenso com uma expressão de dor que ele tentava disfarçar. Um enfermeiro ajeitava o suporte de soro, e outro preparava as radiografias. Ao vê-lo ali, minha respiração ficou presa na garganta por um breve segundo.

Ele parecia diferente. Os traços que eu conhecia tão bem agora estavam mais maduros, a expressão mais séria. Mas ainda era ele. Joaquín. O garoto que tinha sido meu melhor amigo. O mesmo garoto que havia partido meu coração e destruído a confiança que eu depositava nele.

Me esforcei ao maximo para não demonstrar nada além de profissionalismo.

— Como ele está? — Perguntei ao enfermeiro, que imediatamente começou a me atualizar sobre os sinais vitais e a lesão.

A resposta entrava na minha mente em palavras picadas, meus olhos insistiam em analisar o rosto de Joaquín. Os anos passaram, mas a sensação de desconforto e de mágoa parecia tão fresca quanto no momento em que tudo aconteceu. Ele abriu os olhos devagar, parecendo confuso por um momento antes de focar o olhar em mim. Por um breve instante, nossos olhares se encontraram, e algo passou por seu rosto, choque, talvez? Reconhecimento?

Engoli em seco e mantive meu tom firme.

— Joaquín, sou a Dra Catarina Mancini. Vou cuidar de você hoje.

Uma faísca de surpresa surgiu em seus olhos, seguido por uma mistura de emoções que eu não queria decifrar. Ele me conhecia, é claro. Como poderia não me reconhecer?

— Catarina? — Murmurou ele, a voz rouca e carregada de dor e incredulidade.

Eu segurei o impulso de responder com algo mais pessoal. A médica em mim assumiu o controle.

— Vamos avaliar a gravidade da sua lesão e discutir as opções de tratamento — Falo, ignorando o aperto no peito. — Precisamos cuidar de você o quanto antes.

Afastei as lembranças e foquei no que estava diante de mim, um paciente ferido que precisava da minha ajuda. Nada mais importava agora. Mesmo que isso significasse encarar de frente um pedaço do meu passado que eu nunca quis revisitar.

Ele me olhava como se tentasse processar minha presença ali. Mas não havia tempo para lidar com o choque nos olhos dele ou com os fantasmas que começavam a se agitar dentro de mim. A prioridade era cuidar de sua lesão, o resto, por mais doloroso e complicado que fosse, teria que esperar.

— Como está a dor? — Perguntei, mantendo o tom firme e impessoal, mesmo quando meu nome ainda parecia ressoar na mente dele.

Joaquín piscou algumas vezes, como se lutasse para sair do abatimento causado pela dor e pela surpresa.

— Está…Está fuerte — Respondeu, sua voz tensa. Ele se mexeu levemente, o rosto se contorcendo com o desconforto. — Mas… tú está realmente trabalha por aqui? Catarina?

Sim, eu estava ali. Mas não como a garota que ele conheceu há anos. Não como a amiga que compartilhou segredos e sonhos. Estava ali como a médica responsável por ajudar um paciente com uma lesão grave. Ele teria que entender isso.

— Foco na dor, Joaquín — Eu o interrompi, não permitindo que a conversa fosse além disso. — Vamos resolver o problema primeiro. Quero que me diga exatamente onde está sentindo mais incômodo e se há alguma outra parte do corpo com dor ou sensação de dormência.

Ele apertou os olhos, respirando fundo enquanto tentava se concentrar.

— O joelho. Principalmente na parte interna — Falou devagar, o rosto ainda contorcido. — E o tornozelo parece meio latente.

Assenti e me aproximei da maca, mantendo um ar de profissionalismo inabalável. Enquanto colocava as luvas, indiquei para a equipe que preparasse as radiografias e ultrassonografias para verificarmos a extensão da lesão. Senti o olhar dele me seguindo, mas eu me recusei a devolver o contato visual. Mantive o foco em cada passo clínico, avaliando a área lesada com o cuidado de quem não podia se dar ao luxo de cometer erros.

Calma, Catarina. Ele é só mais um paciente.

Quando toquei o joelho lesionado, ele arfou de dor, e eu me obriguei a manter o toque firme, porém delicado. Precisava entender o grau da lesão, identificar se havia instabilidade no ligamento ou qualquer comprometimento mais profundo.

— Me avise se sentir uma dor muito aguda — Pedi, enquanto movia a perna dele levemente para avaliar a amplitude de movimento.

— Você siempre foi tão objetiva como esto? — Murmurou ele, a dor evidente em sua voz, mas ainda tentando manter algum tipo de conversa.

Ignorei o tom, focando na análise. O joelho dele estava instável, o que indicava danos significativos no ligamento colateral medial. A musculatura ao redor também parecia comprometida. Havia uma chance de ser algo cirúrgico, mas precisava dos exames complementares para ter certeza.

— Mantenha a calma, Joaquín. Vamos cuidar de tudo — Falei, e então fiz um sinal para os enfermeiros começarem a preparar a radiografia.

𝐌𝐀𝐊𝐓𝐔𝐁, 𝘗𝘪𝘲𝘶𝘦𝘳𝘦𝘻Onde histórias criam vida. Descubra agora