Entre Dois Mundos

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A semana começou como qualquer outra. As aulas, as conversas rápidas pelos corredores da universidade, o som de risadas e discussões acadêmicas ecoando pelo campus. Mas, para Jack, algo havia mudado. Jen não estava mais à sua espera nos intervalos, como de costume. Os dias passaram sem a presença constante do amigo ao seu lado, e a ausência de Jen pesava mais do que ele imaginava.

Jack tentou se concentrar nas aulas, mas as palavras de Jen continuavam ecoando em sua mente. "Você está vivendo uma vida que não é sua..." Ele se perguntava se, de fato, estava se distanciando da pessoa que ele costumava ser.

Na sexta-feira, mais uma vez, o convite chegou.

"Jack! Festa na casa da Isabel esse fim de semana! Vai ser épico!" exclamou Thomas, largando seu braço sobre os ombros de Jack no corredor.

"Vai todo mundo", disse Isabel, se aproximando. "Vem com a gente. Vai ser incrível, como sempre."

Jack hesitou por um momento. A última festa, em que havia ficado imerso no luxo, o tinha encantado, mas agora havia um gosto amargo que ele não conseguia ignorar. "Eu não sei, pessoal. Tenho coisas para estudar."

"Estudar?" Thomas riu. "Você está brincando, certo? Não existe estudo quando há uma festa de milhões para ir."

Isabel olhou para ele, com uma expressão que misturava surpresa e decepção. "Vai dizer que não vai? Sério?"

Jack respirou fundo, percebendo que estava no centro de uma escolha difícil. "Eu vou pensar", respondeu finalmente, tentando escapar da pressão imediata. "Talvez eu apareça."

"É isso aí!" Thomas deu um tapinha nas costas de Jack antes de se afastar com Isabel.

Jack ficou parado no corredor, vendo os amigos se afastarem, enquanto a dúvida pairava em sua mente. Aquela noite, ao voltar para o apartamento, ele foi recebido pelo silêncio. Jen ainda não havia voltado do trabalho, e a atmosfera no pequeno espaço que eles dividiam parecia mais fria, mais vazia.

Ele sentou-se na pequena mesa da cozinha, pegando o celular. Sua mão pairou sobre o nome de Jen na lista de contatos, e ele pensou em ligar para o amigo, talvez se desculpar, talvez tentar consertar as coisas. Mas antes que pudesse tomar uma decisão, uma mensagem apareceu no grupo dos amigos ricos:

Isabel: "Gente, confirmadíssimo o DJ para amanhã! Vai ser insano!"

Thomas: "E quem não for é louco. A festa vai ser de outro nível!"

Jack fechou os olhos por um momento, sentindo-se puxado em duas direções. De um lado, o conforto e a familiaridade de sua amizade com Jen, alguém que conhecia sua verdadeira essência. Do outro, o brilho do luxo, a sensação de pertencimento a um grupo que vivia sem limites.

Ele largou o celular, de repente exausto de tudo aquilo. A vida parecia estar exigindo que ele escolhesse quem ele realmente queria ser, mas Jack ainda não sabia a resposta.

Na manhã de sábado, o apartamento estava silencioso quando Jack acordou. Ele notou que Jen ainda não estava em casa. Provavelmente, o amigo havia passado a noite fora ou saído cedo para evitar qualquer possível confronto. O silêncio entre eles só piorava as coisas.

Jack decidiu sair para uma caminhada. Ele precisava de ar fresco, precisava pensar. Pelas ruas movimentadas da cidade, ele caminhou sem rumo, observando a vida ao seu redor. Pessoas indo e vindo, cada uma com suas preocupações e rotinas, e ele, perdido em pensamentos sobre a vida que vinha levando.

Caminhou até o parque onde ele e Jen costumavam ir para conversar nos primeiros semestres da faculdade. O lugar tinha algo nostálgico, quase acolhedor. Ele se sentou em um dos bancos de madeira, observando as pessoas passarem. A simplicidade da cena era reconfortante, e ele se lembrou de como costumava valorizar momentos como aquele – sem festas extravagantes, sem conversas sobre dinheiro, apenas boas companhias e o prazer das pequenas coisas.

Foi então que ouviu uma voz familiar.

"Não achei que te veria por aqui."

Jack virou-se rapidamente e viu Jen, com um olhar calmo, mas distante. Ele estava com uma sacola de compras, aparentemente voltando do mercado.

"Jen..." Jack levantou-se, nervoso. "Eu... Eu estava pensando."

Jen o olhou por um momento, antes de suspirar. "Sobre o quê?"

"Sobre tudo isso", Jack gesticulou, quase sem saber como explicar. "Sobre o que você disse. Você estava certo."

"Eu sei que estava." Jen deu de ombros, sua voz sem ressentimento, mas carregada de algo mais profundo – decepção.

"Não, eu quero dizer... Eu percebi que tenho me perdido", admitiu Jack, finalmente encarando a verdade. "Tenho me deixado levar por coisas que não importam tanto. E no processo, tenho te afastado. Isso nunca foi minha intenção."

Jen ficou em silêncio, o encarando por alguns instantes. Finalmente, ele sentou-se no banco ao lado de Jack. "Sabe, Jack, eu não me importo que você tenha outros amigos. Não é sobre isso. É sobre o que esses amigos representam. Eles não te conhecem de verdade, e eu vejo você mudando cada vez mais perto deles. Você se perde nessa ideia de que o que eles têm é o que você precisa, mas você não precisa de nada disso."

Jack abaixou a cabeça, sentindo o peso da verdade em cada palavra de Jen.

"Eu só... eu só me senti deslumbrado. Toda essa vida parecia tão fácil, tão perfeita. Quase como se fosse um atalho para algo maior."

"Essas coisas são vazias, Jack. No fim, o que sobra? O que te sustenta? A verdadeira felicidade não vem do dinheiro ou do que as pessoas pensam de você. E eu sinto que você esqueceu disso."

Jack respirou fundo, sentindo a culpa o consumindo. "Eu não quero te perder, Jen. Você é o único que me conhece de verdade. Eu só não sei como equilibrar as coisas."

Jen olhou para ele, com um meio sorriso. "Você só precisa lembrar de quem você é, Jack. De quem sempre foi. E valorizar o que realmente importa."

Jack assentiu, sentindo que, pela primeira vez em muito tempo, estava começando a entender. Ele não precisava escolher entre dois mundos, mas sim lembrar quem ele era e qual o valor das pessoas que estavam ao seu lado por quem ele era, e não pelo que ele tinha ou queria aparentar.

"Eu vou me esforçar para ser melhor. Prometo."

"Não precisa prometer, Jack", disse Jen, levantando-se. "Só precisa ser você mesmo."

Enquanto Jack observava Jen se afastar, sentiu um peso sair de seus ombros. Ainda havia muito a ser feito, muitas questões a serem resolvidas. Mas, naquele momento, ele sabia que estava começando a tomar o caminho certo – o caminho de volta para si mesmo.

"Vivendo uma Vida que Não é Minha"Onde histórias criam vida. Descubra agora