Sombras predadoras

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As noites na Constância eram as piores, Webber pensava. O escuro nunca o acanhou, nunca o deixou nervoso, mas o escuro daquele lugar era diferente.

Durante a noite, a única luz do lugar era a da lua e a dos vaga-lumes, e também durante a noite, algo saia para caçar. Webber não sabia o que era, mas era algo que chegava silenciosamente, até o alcançar e começar a atacar. Era algo grande e com garras afiadas, e nunca se fazia presente quando você conseguiria vê-la.

E naquele momento, Webber não estava vendo nada. Ele estava escondido, atrás de um túmulo que ele encontrou no meio da estrada. Ele estava dando o seu melhor para não chorar — para conter as suas lágrimas, mas elas não paravam de vir e ele estava fazendo barulho com os seus soluços.

Ele queria a sua mãe e ele queria o seu pai, mas ele não os via haviam semanas. Talvez meses. Ele descobriu cedo que o escuro era perigoso naquele lugar — era simplesmente uma sensação que você sentia até mesmo apenas por olhar para uma sombra. Ele não sabia como começar um fogo sem fósforos. Seu pai tentou ensiná-lo uma vez, quando ele era mais novo, mas ele não se lembrava direito. Ele havia conseguido abrigo até aquele momento em ninhos de aranhas. Sua cabeça já não era apenas sua, disso ele sabia. Nele haviam instintos que não estavam lá antes, e ele conseguia ver isso na maneira como as aranhas se comportavam quando o viam e no próprio reflexo quando ele encarava algum riacho. Não era mais ele, mas ao mesmo tempo era, pois uma das metades de quem ele agora é sempre foi uma aranha.

Naquela noite, fatídica noite, ele não conseguiu encontrar nenhum ninho de aranha. Ele não viu nenhuma de suas amigas, nem as escutou e nem sentiu o cheiro. Sem motivo nenhum, além de puro azar, não havia ninho algum por perto, e agora ele estava condenado.

Ele conseguia ouvir os sussurros. A coisa apareceria a qualquer momento agora.

Quando ele ouviu passos, ele soluçou, sabendo que não seria socorro, mas sim o seu fim.

Por um segundo, a noite pareceu calma. Nenhum som podia ser ouvido, além da água de um riacho próximo. Quaisquer animais ficaram quietos, os sussurros pararam, assim como os passos. Webber ousou levantar a cabeça, abrir os olhos, mas foi apenas isso que bastou, para ele sentir a criatura o atacando.

Ele gritou, de repente alerto ao que estava realmente acontecendo. Ele estava em perigo. Ele estava prestes a morrer.

Adrenalina subiu pela sua cabeça, sua respiração ainda ofegante, se não mais, mas ele lutou contra ela para se levantar e correr, para longe do túmulo e para longe da sombra. Os sussurros haviam voltado, agora mais altos do que nunca, como se estivessem sendo cochichados no seu ouvido. Um deles se parecia até demais com uma risada, mas esse era abafado pelos outros, parecendo distante, mas ele sabia exatamente a qual deles pertencia.

Mais uma vez, ele sentiu o que pareciam ser garras, frias e afiadas, dessa vez bem no seu estômago. Ele gritou de dor e começou a chorar, alto.

— Socorro! — ele gritou, mas o único resquício de luz por perto eram os vaga-lumes.

Ele gritou mais alto, por entre seus soluços e lágrimas, mas não escutou nada além de uma risada e sussurros aos quais ele nem sequer conseguia entender. Ele continuou correndo, o que pode ter atrasado o seu inevitável fim. Era como se a criatura estivesse o caçando, brincando com ele. A cada ataque Webber sentia-se ficando mais cansado, mas ele ainda tinha energia, apesar da sua respiração descompassada e do seu coração quase pulando pela sua boca.

— Socorro! — ele gritou mais uma vez, tirando mais fôlego dos seus pulmões.

Sua visão estava embaçada com as lágrimas molhando todos os seus 8 olhos, quando ele encontrou o que poderia ser a sua esperança: um ponto de luz à distância, grande o bastante para ele saber que ele conseguiria usar como fonte de luz para espantar a escuridão. Ele não sabia ao que ou a quem pertencia, poderia ser um porco ou apenas um amontoado de vaga-lumes, mas ele realmente não se importava. Nem sequer sabia se estava pensando naquela hora, ou movido puramente por instinto.

Mais uma vez, Webber gritou, pulando e balançando os braços, implorando por uma salvação. Quando as garras o acertaram dessa vez, foi com a intenção de matá-lo, ele sabia disso. Ele não sabia como, mas havia continuado em pé, mas sentiu suas costas ardendo e o sangue escorrendo delas. Ele tropeçou, mas se recompôs rápido e lutou contra a dor.

Ele já não conseguia mais gritar, apenas correr e chorar, alto e sem vergonha de dizerem que ele parecia um bebê. Parecer um bebê era o menor de seus problemas no momento.

A luz foi aumentando, e os sussurros ficando mais altos. Ele estava se aproximando.

A luz estava encostada do lado da trilha, ele notou aliviado, então não era nenhum ser ao qual ele precisaria seguir para ficar próximo. Se fosse apenas um aglomerado de vaga-lumes todo aquele esforço teria sido por nada.

Ele gritou mais uma vez, dessa vez bem mais baixo, sem fôlego. Ele conseguia sentir um pouco de sangue escorrendo pelo canto da sua boca, e ele quando ele tossiu ele viu ele pingando para fora.

— Por favor! — ele gritou uma última vez. Ele estava mais próximo agora, mas não o suficiente para ter uma boa visão de quem estava lá — Eu estou aqui! Socorro!

As sombras pareciam ter se irritado com o quão bem sucedido ele tinha sido em achar uma fonte de luz, e no segundo seguinte Webber se viu caindo. Uma dor rasgou pela sua perna, tirando seu equilíbrio, e ele sabia que não havia mais o que fazer. Ele gritou e chorou, chamando pela luz e se debatendo para escapar das sombras, mas elas haviam começado a envolvê-lo. Os cortes, agora que elas o tinham eram pequenos, mas rápidos e em grande quantidade e ele voltou a chorar, tentando se arrastar para longe, mas nada aconteceu.

Ele gritou uma última vez, tentando chamar atenção, mas os sussurros aumentaram, quase se tornando gritos, e ele realmente pensou que ele estava prestes a morrer.

Os sussurros estavam tão altos no seu ouvido e a dor era tão grande que ele mal conseguiu escutar os passos quando eles chegaram, mas quando ele escutou, ele apenas se lembrou dos passos tranquilos antes do primeiro ataque. Aqueles, no entanto, eram diferentes. Eram apressados, quase desesperados.

Em um momento, todos os sussurros pararam, e a risada se desfez como o eco de uma caverna. Ele olhou para cima com o resto de forças que ainda lhe restavam, e notou que ele conseguia ver. O escuro, apesar de ainda presente, não era mais avassalador. Havia uma luz singela, de algum lugar um pouco acima de sua cabeça.

Sua visão ainda embaçada procurou aquele que havia trago a luz até ele, e assim que ele levantou o olhar, viu não um porco ou um humano, mas sim uma criatura diferente de qualquer uma que ele havia visto. Ela era feita de plantas e vinhas, pelo que ele conseguia ver, e seus olhos brancos e arregalados o encaravam com curiosidade e talvez um pouco de pena.

Ele começou a chorar ainda mais, aliviado apesar de seu corpo inteiro ainda continuar doendo. Agora que tudo havia acabado, ele não possuía mais energia nem mesmo para se levantar, quem diria andar. Tudo o que ele conseguia fazer era agradecer, murmurando "obrigado" de novo e de novo, enquanto lágrimas escorriam pelos seus olhos e sangue pelas suas feridas abertas.

A criatura de planta virou para o lado, como se estivesse falando com alguém, mas Webber apenas conseguia escutar um chiado agudo.

Algo que parecia bastante com um monstro máquina que ele já havia visto se aproximou, mas ele não tentou atacar nem ele e nem a criatura, então ele se permitiu fechar os olhos, finalmente em paz. Ele estava realmente cansado, e ele sentia uma dor profunda no seu estômago, nas suas costas e na sua perna esquerda. Até mesmo seus braços, que permaneceram livres de qualquer ferimento grave, estavam pesados demais para isso.

Talvez se ele fechasse os olhos por um segundo, ele conseguiria forças o suficiente para continuar.

Ele acabou desmaiando naquele exato momento.

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⏰ Última atualização: Oct 11 ⏰

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Vaga-lumes [Don't Starve Together]Onde histórias criam vida. Descubra agora