DOIS

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NICHOLAS

A minha vida sempre teve altos e baixos, mas eu nunca tive muito sobre o que reclamar. Cresci em uma família tranquila e feliz no Texas. Talvez meu pai fosse um pouco exigente, sempre cobrando o melhor de mim, mas acredito que isso seja normal. Não tinha muito do que reclamar, na verdade. A vida sempre foi estável, com os tropeços e conquistas que qualquer um enfrenta.

Tudo começou a desmoronar quando conheci Ava, minha ex-namorada e, atualmente, o maior dos meus problemas. Nós nunca fomos o casal perfeito - na verdade, estávamos bem longe disso. Brigávamos por tudo, das coisas mais fúteis às mais sérias. As discussões eram intensas, cheias de acusações e gritos. Mas sempre havia essa química inegável, uma força que nos puxava de volta, mesmo quando sabíamos que estávamos nos destruindo um pouco mais a cada vez.

Quando terminamos, achei que seria um alívio, uma libertação dessa montanha-russa emocional. E foi... por alguns dias. Mas a verdade é que, mesmo odiando tudo o que ela representa, eu sempre acabo voltando. Ocasionalmente, Ava aparece e a gente se perde nos mesmos velhos hábitos. Sexo casual, como se isso fosse suficiente pra preencher o vazio ou apagar todas as merdas do passado. Como se isso bastasse.

Eu odeio admitir, mas parece que não consigo me livrar dela. Ela é como um vício que eu não quero largar, mesmo sabendo que só está me arrastando ainda mais pra baixo. E o pior de tudo é que, de alguma forma distorcida, sei que ela também se sente assim. Como se nenhum de nós conseguisse se libertar de vez do outro.

Enquanto termino de me vestir para o dia, ouço a campainha tocar. Ava. É sempre ela, como um fantasma que me persegue, uma lembrança constante do que poderíamos ter sido, mas nunca fomos. Ela entra, sem cerimônia, como se ainda fizesse parte da minha vida. E talvez, de algum jeito doentio, ela faça.

Mesmo que eu me odeie por isso.

Eu deixei o set com o corpo exausto e a mente ainda pior. Mais um dia em que tive que me forçar a sorrir e atuar como se tudo estivesse no lugar certo, enquanto dentro de mim, a tempestade nunca cessa. O peso do dia me atinge de uma vez quando finalmente chego ao estacionamento, desejando apenas um pouco de silêncio, um pouco de paz. Meu celular vibra no bolso, e eu já sei de quem é a mensagem antes mesmo de olhar.

"Aparece aqui", diz a mensagem de Ava. É direta, sem rodeios, como sempre. Como se ela soubesse que, no final das contas, eu vou acabar indo.

Respiro fundo, encostando na lateral do carro. Parte de mim quer apagar a mensagem, ignorar e seguir em frente. Como se fosse tão fácil assim. Mas outra parte - aquela parte quebrada e impulsiva - sempre acaba cedendo. E é aí que está o problema: eu me odeio por isso, mas ainda me sinto puxado para ela, como se não houvesse outra escolha. É um ciclo vicioso que eu não consigo quebrar, não importa quantas vezes eu prometa a mim mesmo que "dessa vez será diferente".

Enquanto dirijo até a casa dela, minha mente é um turbilhão. Penso no quanto essa situação é tóxica, no quanto me afunda cada vez mais. Não é amor. Nunca foi amor. Não mais. É só uma necessidade doentia de não se sentir tão sozinho, de ter alguém que conhece cada uma das suas cicatrizes e que, mesmo assim, ainda te aceita - ainda que seja de forma distorcida.

Quando chego à casa de Ava, ela está parada na porta, com aquele sorriso irônico que me irrita e me atrai ao mesmo tempo.

- Achei que você não ia vir - ela diz, se afastando para me deixar passar.

- Eu pensei em não vir - respondo, entrando e fechando a porta atrás de mim. - Mas acho que você já sabia que eu viria, de qualquer forma.

Ela sorri de lado, um sorriso que beira o deboche.

- A gente sempre acaba aqui, não é?

Dou de ombros, sem saber ao certo se estou mais frustrado com ela ou comigo mesmo.

- Parece que sim - digo, minha voz carregada de um cansaço que vai além do físico.

Ava se aproxima, o cheiro familiar do perfume dela toma conta do ambiente. É como se, naquele momento, o tempo parasse, e tudo o que existe seja esse ciclo sem fim no qual nos afogamos repetidas vezes. Ela coloca a mão no meu peito, o toque quente contra minha pele fria. E eu sei que, mais uma vez, estou caindo na mesma armadilha.

Ela me olha nos olhos, um brilho travesso refletido neles, como se estivesse se divertindo com o jogo que sabemos que estamos jogando. O mundo lá fora desaparece, e tudo o que importa é o momento entre nós.

- Você está diferente - Ava diz, seu olhar perscrutando meu rosto. - Parece cansado.

- Você conhece a rotina - respondo, tentando me afastar do que ela realmente quer dizer. - Longos dias, filmagens intermináveis.

Ava inclina a cabeça, uma expressão de compreensão misturada com um toque de provocação. Ela dá um passo à frente, e nossa proximidade se intensifica.

- Você sabe que eu posso ajudar com isso, não sabe? - sua voz é um sussurro, e eu sinto meu corpo reagir instantaneamente.

- Não quero ajuda, Ava. - Tentei soar firme, mas a maneira como ela se move me faz sentir que estou perdendo a batalha.

Ela ri levemente, e é um som que me deslumbra e me irrita ao mesmo tempo.

- Claro que não. Você sempre diz isso. Mas, no fundo, sabe que a gente se entende.

Um silêncio pesado se instala entre nós. Lembro-me das nossas conversas sobre o que queríamos da vida, dos sonhos que tínhamos antes de tudo se perder no meio de brigas e ciúmes.

- Eu só... não sei mais o que estamos fazendo aqui - digo, minha voz falhando um pouco. - É só um ciclo sem fim, Ava. Uma roda-viva de merda.

Ela se aproxima mais, sua mão agora em meu queixo, fazendo com que nossos olhos se cruzem. O calor do seu toque me faz esquecer por um momento todos os motivos pelos quais deveria me afastar.

- Mas é isso que nós somos. Você não consegue ficar longe de mim, e eu também não consigo de você. Estamos nessa juntos, mesmo que só por um tempo.

Eu me pergunto se é isso que quero ouvir ou apenas mais uma manipulação para me manter preso. Mas a verdade é que, mesmo assim, a conexão entre nós é inegável.

- E se eu não quiser mais? - eu retruco, um último esforço para me afastar da inevitabilidade do que está por vir.

Ela ri novamente, agora com um brilho de desafio nos olhos.

- Você sabe que isso não vai acontecer. Vem cá, só por hoje.

Ela se inclina, nossos lábios quase se tocando, e eu sinto minha resistência desmoronar. O que ela diz pode ser um jogo, mas cada palavra me puxa mais para perto dela. Então, num impulso, a puxo para mim, nossos corpos colidindo em um calor que quase me queima.

- Só por hoje - sussurro, e, assim que as palavras saem, estou perdido de novo, sem saber se isso é um erro ou um momento de fraqueza.

E enquanto nossos lábios se encontram, a linha entre o que é certo e o que é errado se torna cada vez mais tênue, como um fio prestes a se romper.

E cá estou eu, caindo na armadilha. Na porra da mesma armadilha de sempre.

𝐤𝐢𝐧𝐠 𝐨𝐟 𝐦𝐲 𝐡𝐞𝐚𝐫𝐭 - 𝗻𝗶𝗰𝗵𝗼𝗹𝗮𝘀 𝗰𝗵𝗮𝘃𝗲𝘇 Onde histórias criam vida. Descubra agora