início do fim

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Simone

Eu não pretendia ser uma solteirona. Quando tinha vinte e poucos anos, de acordo com minha mãe, "ainda havia esperança para mim". Mas, quando eu já estava com quase trinta anos, a esperança praticamente desapareceu dos olhos da minha mãe.

— O Senhor tenha misericórdia, Simone! - dizia ela. - O que vai lhe acontecer quando seu pai e eu partirmos da Terra?

Na opinião dela, eu estava condenada a uma existência duríssima sem um homem.

Mamãe sempre fora muito ativa, mas estava esgotada nos dois últimos anos de vida. Sua artrite piorou, deixando sua mão pequena e sardenta, e tomar conta do papai consumia o que restava dela. Uma tarde, ela se aproximou de mim na horta, com a mão apontando para o alto , e me olhou com aqueles olhos tristes e castanhos

—O que você me diz do Eduardo?
Quase deixei cair o cesto de alface que estava colhendo.

— Aquele homem idiota, com aquela barriga enorme e pernas atracadas? - Joguei a cabeça para trás e ri.- Mamãe! O que foi que fiz? . Ela acenou com uma das mãos no ar e revirou os olhos.

—Eu só estou dizendo, Simone. Você é uma garota bonita.
Enxuguei o suor do rosto e me agachei, retomando o trabalho.

-Bem, não sei por que todas as garotas bonitas, de Três Lagoas não estão fazendo fila em frente à porta de Eduardo Rocha. Que garota não haveria de querer aquele traseiro velho e caído se arrastando na cama dela todas as noites?

— Que o Senhor tenha misericórdia, Simone! Domingo está perto demais para uma conversa dessas.
Joguei mais um punhado de alface no cesto.

— Foi você quem começou, mamãe. Estou surpresa.

—Não há nada de errado com Eduardo.

— Ele é um imbecil e tem aquele nariz adunco e aqueles braços desengonçados com mãos peludas. Deve ter cinquenta anos!

—Ele é um homem de boa aparência.
Quase morri de rir.

—A beleza dele deve ser do tipo que aumenta com a bebida!

—Ele é tolerável - disse ela. —Nem todos os homens são toleráveis, mas você poderia tolerar Edu.

— O casamento é isso, mamãe? Tolerar alguém? Ela olhou para mim.

—Tem muito a ver com isso. Se você não fica enjoada ao olhar para alguém, está a meio caminho de tolerá-lo.

Não consegui sequer responder a isso. Ela começou a se curva, é a descer com a mão no ar para ela.

—Não se abaixe. Levarei uma eternidade para levantar você. Vou terminar com isto. Você só se preocupa com qual homem triste que eu devo me comprometer.

Minha mãe era minha amiga mais íntima. Passamos nosso tempo trabalhando na horta, fazendo conversa, cozinhando juntas, e conversávamos sobre papai até darmos risadinhas como duas garotas. Adorávamos sentar-se à mesa e comer uma fatia de bolo inglês com uma xícara de chá enquanto ouvíamos as notícias na emissora de rádio. Mamãe não usava relógio; não precisava de um — ela simplesmente sabia quando era hora de chá com bolo. Eu sempre sabia quando mamãe achava que estava precisando de repouso com um copo de chá gelado adoçado, e ela conseguia perceber quando eu precisava pegar um livro e me esconder na varanda dos fundos. Sempre fui impaciente demais comigo e com as outras pessoas, mas mamãe simplesmente as amava, de uma maneira pura e verdadeira, com todos os meus defeitos.

Meus seis irmãos eram todos casados. Quando nasci (mamãe estava com 22 anos), meu irmão mais novo, Júlio, já havia constituição família e tinha dois filhos. Caramba, com a minha idade mamãe havia tido seis de seus sete filhos. Sempre que eu olhava para ela e papai, podia sentir o tempo passando velozmente por mim. Tique: Há um homem! Taque: É melhor agarrá-lo! Tique: O tempo está se esgotando! Taque: Tarde demais!

[...]

Eu estava com 28 anos e nós enterramos papai depois de 62 anos vivendo em Três Lagoas, a comunidade desistiu de mim.
As pessoas começaram a se referir a mim como aquela coitadinha. Eu as ouvia sussurrar na igreja ou no armazém tebet's.

—Simone só fica sentada lá, tomando conta da mãe. Coitadinha, acho que ela nunca vai se casar.

Mamãe também ouvia as pessoas falarem, e essa coisa de solteirona a preocupava terrivelmente
—Mamãe, eu sou feliz - dizia repetidamente.

—Adoro meu trabalho na escola, gosto de vir para fazenda, trabalhar na horta e passar um tempo com você.
De vez em quando, ela olhava para mim com aqueles olhos e envelhecidos, ficava em silêncio e erguia o olhar para as colinas, o sol batendo forte em seu rosto, e dizia: —Não viva com arrependimentos, Simone. É uma coisa horrível -Eu pensava que ela quisesse dizer arrependimento por eu não ter tido "um marido, mas um dia me ocorreu algo.

— Mamãe, que arrependimentos você tem? - perguntei-lhe.

Ela olhou para as colinas.

—Eu tenho um, e ele me atormenta terrivelmente.
Havia algo na voz dela que eu nunca ouvira.

—O que é, mamãe? - Ela não respondeu. — Mamãe?

Foi assim que nós duas passamos, o que acabou sendo seus últimos dias.

Eu sabia que ela estava cansada e frágil. O que eu não sabia e? que O coração dela estava ficando fraco.
Acordei certa manhã e servi o café, como tinha feito todos os dias por anos.

Como o mecanismo de um relógio, eu ouvia os movimentos dos passos, Ruído de seus pés pelo assoalho de tábuas largas, mas naquela manhã tudo o que ouvi foi o tique-taque do relógio na parede da cozinha. Eu à enterrei há seis meses, em janeiro, um mês antes de meu aniversário. O vazio que ela deixou se amplia pela casa, e às vezes me sufoca.

A fazenda está quieta agora e mergulhada em tristeza. Nas noites mais escuras, quando está frio e silencioso, juro que posso ouvir mamãe arrastando os pés pelo corredor na minha direção, com as batidas de sua bengala, mas, quando me viro para olhar, sei que sou apenas eu desejando que ela estivesse aqui.

A porta de tela geme quando a abro, e sentei  na varanda dos fundos olhando para a horta. Fred corre em minha direção, empurrando a cabeça peluda e loira sob minha mão. Ele olha para mim com teus olhos castanhos tristes. Também sente saudades da mamãe. Somos uma dupla digna de compaixão, mas com certeza as coisas vão melhorar. Ou piorar. Nunca sei.

                                        *Autora*

Olá meus docinhos de coco, decidi escrever pois estou de férias e vou conseguir dar continuidade... Assim espero!

Essa fic é inspiração de uma história que eu ouvi E aí eu peguei inspirações dela, enfim...

Vai ser muito bom se vocês deixar sugestões ou qualquer outra forma de me ajudar, eu aceito!!

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Os capítulos será maiores!

Fazenda alvorada | simoraya Onde histórias criam vida. Descubra agora