Capítulo 2 - "Energia 0"

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Depois de dividir a pedra, percebi que havia cometido um erro. Ao ver meu irmão se afastando, algo se rasgou dentro de mim. O vazio parecia se alargar, e logo pensei: se tivéssemos permanecido juntos, mesmo que apertados, teria sido mil vezes melhor — melhor para nossa sanidade e para espantar a presença sutil e constante da solidão que preenche este espaço. Mas não, já estava feito. Não temos máquinas do tempo para consertar o que deixamos para trás. O impulso da curiosidade, essa fome insaciável, me arrastou para longe da prudência.

Ele acreditava que encontraria algo no universo, algo que justificasse o risco. Mas não havia nada, apenas o silêncio do espaço, onde as coisas se perdem. O plano falhou, e ele desejava que tudo acabasse. A própria vida parecia insustentável, como uma corda que cede lentamente sob pressão. Em meio ao vazio, ele se viu à beira da morte, considerando-a como a última porta, a única saída. Mas, ao tentar, algo o prendeu, como uma sombra que o segurasse, condenando-o a essa solidão insuportável. Rendido ao tédio e ao vazio, ele aceitou — esse era seu destino.

Até que algo, finalmente, aconteceu. Ele avistou uma forma distante, pequena e tímida, mas que se aproximava com uma intensidade crescente. Brilhava como o prenúncio de um destino inevitável, uma estrela a rasgar a escuridão. Era uma luz no fim do túnel, mas também uma ameaça voraz, um calor implacável que o consumia. Ele tentou recuar, mas não havia escapatória. Quando alcançou o astro, sentiu-se ser desintegrado — mas não aniquilado. Um fluxo de energia irrompeu dele, uma força tão poderosa que a estrela explodiu em uma onda devastadora.

A explosão evaporou mundos próximos, mas um deles, distante e queimado, resistiu. O que restou daquele impacto foi uma energia densa, uma força que parecia ter todas as cores, mas também nenhuma. A energia foi até o planeta mais distante, envolvendo-o, alterando a atmosfera até que o céu se tingisse de um verde mortal. A cada segundo, aquela atmosfera fervia, densa como gás venenoso, para depois se dissipar, revelando algo inesperado: vida.

Mas não era qualquer vida. Embaixo daquela crosta envenenada e carbonizada, o Material encontrou criaturas... criaturas que ele mal sabia nomear. Seres humanos. Eles eram uma mistura curiosa de selvageria e inteligência bruta, tão primitivos quanto sofisticados. Observando-os, o Material sentiu-se atraído, fascinado pela intensidade com que lutavam e se destruíam. Homens controlados pelo medo e pela superstição, condenados a uma era de trevas, onde reis e igrejas mantinham o povo acorrentado, onde a luz da razão quase não existia. A violência parecia ser seu alicerce, e a ganância, seu guia.

O Material via beleza no horror humano — na brutalidade que eles impunham uns aos outros, na paixão do ódio e na harmonia da crueldade. Em vez de repulsa, ele sentia atração; era como se estivesse assistindo a uma dança macabra, onde a vida e a morte se entrelaçavam numa sinfonia violenta e sublime. E, entre eles, viu um homem que parecia distinto, um homem chamado Jades. Diferente de todos, ele carregava algo peculiar, algo mais... profundo.

Jades dizia:
"Percepção da realidade... é o que define quem nós somos, e ainda assim, é a coisa mais frágil que possuímos. Tudo o que sabemos, ou pensamos saber, está à mercê dos nossos sentidos e da nossa mente falível. Mas e se essa ‘realidade’ for apenas uma máscara, um reflexo retorcido de algo imensuravelmente maior? Algo que nunca veremos além do véu? A questão real não é o que existe... mas o que resta quando a percepção falha. Quando não podemos mais confiar no que vemos, ouvimos e tocamos... o que realmente importa?"

O Material absorveu aquelas palavras, vendo naquele homem uma fagulha única, como se ele visse além do véu.

Jades caminhava pela noite, sozinho, com a mente cheia de perguntas e o coração batendo em um ritmo pesado. Algo o corroía por dentro, um desconforto impossível de nomear, como se a própria realidade ao seu redor estivesse deformada. O universo, que antes parecia uma sequência ordenada de dias e noites, de regras e leis naturais, agora era uma presença sufocante, como um enigma encoberto por um véu escuro. Algo estava errado. Ele precisava saber.

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⏰ Última atualização: Oct 26 ⏰

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