Jungkook [2]

3 1 0
                                    

— Oi, Férias! — brinquei, assim que o Yoongi abriu a porta para me receber

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

— Oi, Férias! — brinquei, assim que o Yoongi abriu a porta para me receber.

Os olhos castanhos dele não abriam direito, por causa da claridade. No lado esquerdo do rosto havia uma fina linha de saliva e seus cabelos pretos estavam bagunçados e meio arrepiados.

— Oi, oi, oi — ele fingiu um tom animado.

— Certo. Vai lavar a cara, suas remelas estão me incomodando! — Dei risada.

O Yoongi revirou os olhos e me puxou para dentro de casa, rindo também.

— Qual o problema de vocês? — Ele cruzou os braços. — Eu estou de férias e acho que mereço dormir o tempo que me parecer necessário!

Dei de ombros.

— Tudo bem, campeão, mas, enquanto você hiberna, o mundo lá fora está acontecendo…

— Você sempre tem resposta pra tudo! — ele rebateu.

— E você sabe que o que eu digo é sempre o certo!

O Yoongi reprimiu um sorriso e bateu o cotovelo no meu braço.

— Por que você não ocupa sua boca com algo mais útil? Quer comer alguma coisa? — ele ofereceu.

— Não, não! — Bati na barriga. — Estou satisfeito.

— Ótimo. Não quero que você coma minha comida mesmo!

Nesse ponto já estávamos na cozinha, e a Seoyeon e o Jaewon olharam para o filho de cara feia.

— Esses não são os modos que nós te ensinamos, Yoongi! — a Seoyeon ralhou.

Eu o olhei, disfarçadamente, segurando a risada.

— Até porque — o Jaewon completou —, o Jungkook pode, sim, comer toda a comida que quiser nesta casa.

Não aguentei e olhei para o Yoongi com deboche.

— Seoyeon e Jaewon, muito obrigado… Eu sei que esta não foi a educação que vocês deram ao Yoongi…

Ele me olhou torto.

— Ainda faz piadinhas à custa da minha comida!

Eu apenas ri.

O Yoongi então subiu para se aprontar para sairmos enquanto eu conversava com os pais dele. Eu amava a Seoyeon e o Jaewon, e seu infalível bom humor matinal. A relação deles era inspiradora; o jeito como se olhavam, como pegavam a mão um do outro, como se isso fosse a coisa mais gostosa do mundo, a forma como riam de piadas de que acho que só eles achavam graça. Eu me perguntava se isso algum dia aconteceria comigo. Os dois pareciam se amar, assim como meus pais. Na verdade, nossos pais, os meus e o do Yoongi, deviam ser dois casais sortudos e escolhidos a dedo para terem uma história feliz. Na escola, eu e o Yoongi éramos minoria no nosso grupo de amigos, todos tinham pais separados.

Mas aí, interrompendo meus pensamentos, o Holly apareceu — o cãozinho valente do Yoongi. Eu o adorava. Ele sempre abanava o rabo e me lambia quando nos encontrávamos. Um dia, há uns dois anos, nós o encontramos dentro de uma caixa de papelão, com um latido estridente e melancólico. Não pensamos duas vezes e o levamos para a casa do Yoongi. Foi amor à primeira vista, e todos o aceitaram na família Min; também, né, ele era o cachorrinho mais legal do mundo!

Eu o acarinhei um pouco, até que o Yoongi surgiu descendo as escadas. Ele havia molhado o rosto e parecia um pouco mais desperto.

— Pai, mãe, vamos andar de bicicleta! — ele anunciou.

O Jaewon disse para tomarmos cuidado. A Seoyeon apanhou minha mochila para guardá-la no quarto do Yoongi. Então, eu e meu amigo fomos para o quintal, e eu fiquei feliz, pois o que mais queria era ter um pouco de privacidade com o Yoongi.

Aquele era um dia ensolarado de dezembro; o céu estava muito azul, sem nuvens. Era um dia feliz. O que era o total oposto do que eu sentia dentro de mim.

O Yoongi pegou sua bicicleta vermelha e me olhou, com uma sobrancelha erguida.

— Ué, cadê a sua bicicleta, Guk?

Mordi o lábio, nervoso. Enfiei as mãos nos bolsos do short e suspirei. Eu deveria estar com olheiras horríveis, já que não conseguira dormir e fiquei revirando na cama a noite toda.

— Bem… Eu não trouxe.

— E como você pretende andar de bicicleta, então? — Ele riu.

Eu não era bom com palavras. Era bom com números. E entendia bem que 2, quando se divide por 2, vira um.

— Você está me assustando… — O Yoongi largou a bicicleta no chão e me levou até a parte de trás do quintal, onde havia uma jabuticabeira. Ele sabia que eu amava jabuticaba e que elas sempre me deixavam feliz.

Sentei no gramado verde, na sombra da árvore, e o Yoongi demorou um pouco para se juntar a mim. Quando se aproximou, sua mão estava cheia de frutas. Ele me ofereceu, com um sorrisinho de canto de boca. Pesquei uma e comi, tentando prolongar ao máximo o momento, como se isso fosse me ajudar a falar. Como se isso fosse me ajudar a escolher as palavras corretas a serem ditas.

— Seus lábios estão roxos — o Yoongi falou, rindo. Ele sempre comentava isso quando eu comia jabuticaba.

Mostrei-lhe todos os meus dentes num sorriso aberto.

— Uau! — ele disse de forma meio estridente. — Isso, sim, é um sorriso! Meio nojento e com jabuticabas mastigadas, mas ainda assim…

— Pois é… — Baixei os olhos para os meus pés. — Hummm… Há um bom tempo que eu não sei o que eu não sei o que é sorrir de verdade.

— É… Eu estava te achando meio estranho mesmo… Mas pensei que fosse apenas por causa das suas notas em português.

Dei de ombros.

— Mas eu passei. Isso é o que importa.

O Yoongi sorriu, mas depois retomou sua expressão séria. Ele sentou ao meu lado, colando as costas no tronco da árvore. Nossos braços estavam encostados, os olhos fixos no muro à nossa frente, onde uma planta trepadeira se encarregava de deixar o ambiente um pouco mais verde.

— Você sempre rodeia demais pra falar o que está pensando — Yoongi reclamou.

— É medo.

— Medo de quê?

— Do futuro.

— Mas você é tão novo… Nós somos.

— Eu sei. Não é por isso que tenho medo.

— Então…? — E o Yoongi me olhou.

Percebi que minhas mãos tremiam.

— Meus pais… Bem, meu pai, na verdade… Ele recebeu uma proposta irrecusável… Para trabalhar e…

Meus pensamentos ficaram um pouco turvos. Eu não sabia mais o que estava dizendo ao certo, apenas lembro da voz do Yoongi dizendo “não chora”, “vai ficar tudo bem”..., até que a voz que soou foi a minha:

— Eu vou embora. Com meus pais. Pro Japão.

O Yoongi nada dizia. Sua boca estava entreaberta.

— Essas são as nossas últimas férias juntos — eu completei, enfim.

Yoongi continuou me encarando, chocado. Até que se levantou, sem dizer nada, e se afastou. Escutei a porta da casa dele batendo forte.

Botei mais uma jabuticaba na boca.

Mais uma lágrima correu pelo meu rosto.

Eu não era muito de chorar.

Mas as coisas estavam mudando.

Entre humanas e exatas, eu escolho a nossa química | YKOnde histórias criam vida. Descubra agora