Echoes in the silence.

14 3 21
                                    

7:33 am

[...]

Acordar era um ato de muita coragem, era um teste diário de sobrevivência ao vazio.

Os primeiros minutos de consciência eram estranhamente pacíficos, como se sua mente ganhasse um breve intervalo antes de as sombras internas tomarem conta. O seu quarto era silencioso, mas esse silêncio parecia um eco do mundo real, distante e intangível.

Calliope estava tendo um momento para si mesma, o que era um luxo raro. A tranquilidade era sempre algo a ser tratado como suspeito, era uma calmaria antes de uma tempestade que ela conhecia bem até demais. Mas agora, aproveitaria cada segundo, aproveitaria o simples ato de respirar sem medo.

...

Pela janela, o sol da manhã derramava uma luz suave no chão, quebrando o cinza da parede. Por alguns instantes, ela focou na luz, como se pudesse absorver algo bom dali.

As vozes não vinham, e aquele intervalo parecia uma bolha. Havia um caderno ao lado de sua cama, onde ela escrevia o que conseguia lembrar dos dias, ou dos sonhos estranhos que vinham vez ou outra. Ela folheou as páginas, observando a tinta borrada das palavras escritas às pressas e com a mão trêmula.

Lá, as palavras flutuavam, soltas e confusas, mas, de alguma forma, cada uma delas era uma pequena amarra que a mantinha presente. Como um eco que ficava depois de as vozes irem embora.

Ela percorria por cada folha até chegar em uma em especifico. Nela havia uma poesia, que soava mais como um desabafo sombrio, ela o escreveu quando tinha apenas 12 anos, ela era jovem, bem jovem, mas ja apresentava sinais de inquietação profunda, um peso que carregava em silêncio, uma melancolia que parecia muito antiga para alguém de sua idade.

Flashback

Ela ainda sonhava.

Mesmo que o mundo já começasse a revelar suas sombras.

Naquela época, as vozes eram sussurros esparsos, quase imperceptíveis, misturando-se às suas próprias memórias e pensamentos, sem ainda dominar o que ela era.

Ela tinha o hábito de escrever tudo o que sentia, desenhando palavras em cadernos escondidos como se fossem seus segredos mais profundos. Eram versos simples, quase inocentes, mas já cheios de uma inquietação inexplicável. Ali, ela traduzia o medo que não sabia nomear, e, a tristeza que ainda não compreendia.

Em uma noite solitária, com a luz fraca da lua espiando pela janela, ela rabiscou um poema curto e misterioso, mas que pareciam conter uma angústia muito maior do que sua idade.

Sua mãe encontrou o papel no chão do quarto.

Ela começou lendo as duas primeiras estrofes.

"A midia pinta o mundo em tinta fria
Em sombras profundas de pura agonia"

ela ficou assustada com o que estava a ler, mas continuou.

"Nos rostos que surgem, o vazio é sombrio
Que ecoam de um abismo escorregadio"

Ela continuava ler, as poucas palavras mexiam com ela.

livra meOnde histórias criam vida. Descubra agora