Only For The Brave | REBI

2. Escola

(N/a) Recadinho no final, boa leitura!

Logo pela manhã, assim que abriu os olhos, Rebeca questionou se realmente conseguiria ir à escola. Ela tinha um compromisso importante e sabia que seus patrocinadores eram rígidos com as regras. Tudo girava em torno de dinheiro. Para Ricardo Almeida, o CEO da empresa, tempo era literalmente lucro. Milionário, egocêntrico e narcisista, ele nunca admitiria que explorava seus funcionários enquanto pregava o discurso vazio da "meritocracia". Mas quando Rebeca assinou aquele contrato, tinha apenas 16 anos e um sonho — e foi assim que tudo começou.

Na época, Rebeca fazia acompanhamento psicológico em uma UBS de Guarulhos, na Grande São Paulo. Conseguir uma vaga foi uma vitória em si, já que o sistema público sempre esteve sobrecarregado. Ela era apenas uma adolescente tentando encontrar apoio em meio às dificuldades. A família não passava fome, mas contar moedas para o ônibus ou o pão do café da manhã era rotina. Rebeca sonhava em mudar aquela realidade para sua mãe e seus irmãos.

A escola, no entanto, era um ambiente hostil. Ela enfrentava comentários pejorativos sobre sua cor, sua altura e sua situação financeira. O que antes a fazia se encolher, aos poucos se transformou em força. Sua altura, que era motivo de piada, tornou-se uma das coisas que mais amava em si mesma.
Na terapia, ela desabafava sobre os preconceitos e os desafios do dia a dia. Crescer em um lar profundamente religioso tornava certos assuntos tabus — como sexualidade ou sexo. Nunca eram debatidos, muito menos mencionados. Quando começou a se permitir sentir, quando os primeiros desejos floresceram, veio também sua primeira crise.
E foi nesse momento que a terapeuta saiu da Unidade Básica de Saúde. Sem acolhimento, Rebeca enfrentou sozinha uma confusão que parecia maior do que ela

Foi o começo de uma amizade que rapidamente se transformou em algo mais. Os cumprimentos logo viraram abraços, e os abraços se tornaram toques. Até que, após um treino, Anna a beijou. Rebeca retribuiu, e foi como se uma explosão de sentimentos a invadisse.
No entanto, ao voltar para casa naquele dia, encontrou sua mãe assistindo a um vídeo de um pastor no YouTube. As palavras duras ecoavam pela sala:

"Isso não é natural. Temos que lutar contra o demônio do homossexualismo. Estão querendo doutrinar nossas crianças com pautas gays nas escolas públicas. O que eles chamam de amor é, na verdade, uma distorção da verdade divina."
Ao entrar em casa, Rebeca foi recebida por sua mãe, Dona Maria, que, ao vê-la, logo abriu um sorriso acolhedor.

— Oi, filha! Chegou um pouco tarde, aconteceu alguma coisa? O treino foi bem?

— Oi, mãe. Foi sim, uma amiga me acompanhou até aqui, não tem nada de errado... — Respondeu, com um sorriso que mal disfarçava sua preocupação.

— Ah, entendi... tudo bem então. Amanhã eu vou sair bem cedo para trabalhar e não sei a que horas volto. Vou fazer uma faxina lá no centro de São Paulo, então fica difícil dizer quando chego. Mas vou tentar te avisar, seja por mensagem ou ligando pra você ou para seus irmãos. Só aceitei esse serviço porque a senhora vai pagar a minha passagem e o valor é bom, então, não me espere acordada caso eu demore, tá?

— Tá bom, mãe. Eu vou tomar um banho e ir deitar. Boa noite, te amo. — Murmurou, antes de caminhar rápido até seu quarto, querendo se afastar daquele ambiente, onde a TV despejava palavras de ódio contra quem não se encaixava nos padrões que ela via em casa.

Sozinha no banho, Rebeca se pegou pensando em algo que temia: Como sua mãe reagiria se algum dia ela falasse sobre "beijar meninas"?
Dona Maria sempre foi uma mulher religiosa e fervorosa, convicta de que a salvação vinha de seguir a fé. Rebeca recordava com clareza o desgosto nas palavras de sua mãe quando sua prima Bruna se assumiu lésbica. A conversa com a família foi marcada por frases de pura ignorância que ainda ecoavam na mente de Rebeca: