Dentro da tenda

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Taehyung largou a colher sobre o prato vazio e passou as mãos pelos cabelos. O cansaço da viagem era evidente, mas sua mente não lhe dava descanso.

Ele passou horas revisando os mapas à sua frente, tentando prever cada movimento que precisaria fazer ao chegar em Florenzia. 

Porém, sua concentração foi abalada pela lembrança do rosto de Jungkook. 

— Não posso...— murmurou para si mesmo, tentando dissipar os pensamentos. Não podia se dar ao luxo de sentir nada por aquele trakai.

Mas a verdade era que a presença de Jungkook o desestabilizava de formas que ele não queria admitir. 

Jungkook levantou-se abruptamente da fogueira, ignorando os olhares curiosos de seus companheiros. Decidiu que precisava de um momento sozinho, longe dos risos e das tensões. Caminhou em direção à cachoeira próxima, onde o som da água caindo era um alívio para seus ouvidos. 

O lugar estava iluminado apenas pela luz da lua, a água cristalina refletindo o brilho.

Ele se agachou na beira, mergulhando as mãos na água gelada e deixando que a sensação fria percorresse seu corpo. 

“Um rei controlado pela igreja...” Jungkook nunca teve paciência para religião ou política, mas não podia negar que havia algo quase trágico na situação de Taehyung. Um homem que parecia tão poderoso, mas que estava encurralado em seu próprio reino. 

Seus pensamentos foram interrompidos pelo som de passos atrás dele. Jungkook virou-se rapidamente, a mão instintivamente indo até o punho de sua faca. 

— Não sabia que você era tão paranoico — disse Taehyung, surgindo das sombras com uma expressão calma. 

— O que está fazendo aqui? — retrucou Jungkook, franzindo o cenho. — Pensei que estava ocupado demais. —

Taehyung deu de ombros, aproximando-se da beira da cachoeira. 

— Precisava de um momento. Achei que fosse encontrar paz aqui, mas vejo que você teve a mesma ideia.  — Ele o viu e seguiu até aquele lugar.

Jungkook não respondeu, mas seu olhar permaneceu fixo em Taehyung, observando-o enquanto ele se sentava em uma pedra próxima. Por um momento, o silêncio entre eles foi quase confortável, quebrado apenas pelo som da água. 

— Você acha que vou falhar, não acha? — perguntou Taehyung de repente, sua voz baixa, mas carregada de uma determinação desafiadora. 

— Não sei do que está falando— respondeu Jungkook, com sinceridade. — Mas não vou fingir que entendo por que você quer lutar por um reino que parece querer sua cabeça. 

Taehyung soltou uma risada curta, sem humor.  — Você não entenderia. —

— Sério? Então me explique. 

O loiro virou o rosto para Jungkook, seus olhos brilhando sob a luz da lua. 

— Florenzia é tudo o que eu tenho. Tudo o que meus pais me deixaram. Não importa o quanto os nobres me odeiem ou o quanto a igreja tente me destruir, eu não vou abandonar o que é meu. 

— Mesmo que isso signifique a sua destruição? 

Taehyung hesitou, mas seu olhar não vacilou.  — Mesmo assim. 

Jungkook sentiu uma onda de admiração involuntária por ele. Havia algo na teimosia de Taehyung que era, ao mesmo tempo, irritante e fascinante. Mas ele não deixaria isso transparecer. 

— Você é louco, Kim. 

Taehyung sorriu, mas havia um toque de tristeza naquele sorriso. 

— Está deixando de me chamar de majestade ou sua alteza?

Por um instante, ambos ficaram em silêncio novamente, mas dessa vez, a tensão entre eles era quase palpável. Havia palavras não ditas, sentimentos não admitidos, e ambos estavam dolorosamente conscientes disso. 

Finalmente, Taehyung se levantou, limpando as mãos nas roupas. 

— Volte para a fogueira, Jungkook. Você parece mais à vontade entre os selvagens. 

Jungkook arqueou uma sobrancelha, mas não respondeu. Apenas observou Taehyung se afastar, o manto dourado balançando levemente ao vento. 

Quando o loiro desapareceu na escuridão, Jungkook soltou um suspiro pesado e voltou seus olhos para a água. 

— Egocêntrico maldito — murmurou, mas havia um tom quase carinhoso em sua voz. 

Ele sabia que não deveria sentir nada por Taehyung, mas ignorar o que crescia dentro dele estava se tornando cada vez mais difícil. 

Jungkook permaneceu à beira da cachoeira por mais alguns minutos, tentando encontrar clareza em meio ao turbilhão de pensamentos.

Um homem da nobreza, humano demais, controlado por instituições que ele considerava inúteis, o loiro tinha uma força que não era fácil de ignorar.

Quando finalmente voltou ao acampamento, o silêncio reinava. A fogueira dos trakais ainda ardia, mas os guerreiros estavam dispersos, alguns já dormindo e outros conversando em murmúrios baixos. O grupo de Taehyung, por outro lado, estava trancado em suas tendas, afastados e isolados como sempre. Jungkook ignorou ambos os lados, indo direto para seu cavalo, que estava amarrado a uma árvore próxima.

Ele afagou o pescoço do animal, buscando um momento de paz. O cavalo relinchou suavemente, como se entendesse o peso que o trakais carregava. 

— Pelo menos você não me questiona — murmurou Jungkook, com um toque de humor sombrio. 

Jungkook olhou ao redor e encontrou um lugar afastado para se deitar, mas seu sono foi agitado. Sonhos confusos, com imagens de Taehyung e Florenzia, perseguições e batalhas, assombraram sua mente. 

Quando o sol começou a surgir no horizonte, ele já estava acordado, sentado sobre uma rocha e observando o céu mudar de cor. Não demorou muito para que os primeiros movimentos do acampamento começassem: os trakais levantando com preguiça, enquanto o grupo de Taehyung já estava de pé e organizando as carruagens. 

Jungkook suspirou e se levantou, pronto para mais um dia de viagem. Ele sabia que os próximos dias seriam desafiadores, não apenas por causa do cansaço físico, mas também pelo peso crescente da relação complexa entre ele e Taehyung. 

E, no fundo, ele sabia que ainda havia muito mais a enfrentar — tanto fora quanto dentro de si mesmo. 

O Líder Trakai e O Rei cruel_taekookOnde histórias criam vida. Descubra agora