Nunca conheci ninguém que gostasse tanto de uma piada quanto o rei. Parecia viver
somente para brincadeiras. Contar uma boa e divertida anedota, isto é, contá-la da maneira certa
que salientasse o imprevisto do desfecho, era a melhor maneira de conquistar-lhe o favor. Deste
modo veio a ocorrer que todos os seus sete ministros se destacavam pela maneira como
contavam uma história engraçada ou como planejavam troças que o divertissem. Todos eles
eram fisicamente parecidos com o rei, homens grandes, corpulentos e gordos, do mesmo modo
que inimitáveis brincalhões. Não sei se as pessoas engordam porque fazem gracejos, ou se existe
alguma coisa na própria gordura que predispõe a pessoa à jovialidade; mas é certo que um
contador de anedotas magro é uma rara avis in terris.[1]
No que se refere ao refinamento, ou como ele os denominava, os "espíritos" da comédia, o
rei não demonstrava grande interesse. Ele tinha admiração especial pela amplitude de uma
pilhéria; e muitas vezes era capaz de suportar a extensão de uma história pelo prazer de seu
alcance. As sutilezas da ironia logo o cansavam. Teria preferido o Gargantuá de Rabelais ao
Zadig de Voltaire[2] e, tudo considerado, as brincadeiras pesadas agradavam mais a seu gosto
que os motejos meramente verbais.
Na época em que transcorre minha narrativa, ainda não tinha saído de moda
completamente ter humoristas profissionais nas cortes e palácios. Diversos dos grandes poderes
do continente europeu mantinham os seus "bobos", que usavam roupas recortadas de tecidos
multicoloridos, capuzes e guizos, e de quem se esperava que estivessem sempre a postos - ou até
mesmo interferissem nos assuntos sérios - com críticas contundentes, preparadas de antemão ou
criadas na inspiração do momento, em troca das migalhas que caíam da mesa real.
Nosso rei, naturalmente, tinha o seu bobo. Na verdade, exigia dele que agisse da maneira
mais louca a fim de contrabalançar o sarcasmo pesado dos sete homens sábios que eram seus
ministros - sem contar a própria sabedoria.
Seu bobo, ou humorista profissional, todavia, não era somente um tolo brincalhão. Seu valor
era triplicado aos olhos do rei pelo duplo fato de que, além de anão, também era aleijado. Nesses
dias, anões eram tão comuns nas cortes como os bobos, e muitos monarcas poderiam achar
difícil passar o tempo (porque os dias são muito mais longos nos castelos que em outros lugares)
sem ter um bobo que lhes provocasse o riso e um anão às custas do qual pudessem rir. Porém,
como já observei, os gracejadores, noventa e nove vezes em cem, são gordos, sadios e pesadões,
de modo que era uma inestimável fonte de orgulho para o rei possuir um tesouro triplicado em
Hop-Frog[3], que era o nome que haviam dado ao bobo.