Prólogo
Matt.
Era um calor infernal. O que, infelizmente, não era algo incomum naquela época do ano. Na verdade, mudanças drásticas de temperatura não eram algo incomum em Edimburgo como um todo. Mas havia sim algo que era constante: o vento gelado e cortante que nem mesmo o corta vento de longa data e já familiarizado com as montanhas de região estava conseguindo me proteger naquela manhã de fim de agosto.
– Mano, eu estou voando!
O comentário animado e quase infantil do meu primo, que andava de costas e fazendo graça, me tirou dos devaneios sobre o cantar do vento. Revirei meus olhos e ri.
Eu havia sido preparado para aquele momento durante toda a minha vida. Era o início de um novo ano letivo, provavelmente o mais importante até que eu entrasse na faculdade. Ou então no mestrado. E o doutorado também. Bem, era, ao menos, o início do ciclo mais importante da vida de um adolescente: o ensino médio. E não era qualquer ensino médio, não quando se fazia parte da dinastia Arkman.
– Ai, qual é? – Fred perguntou quando coloquei meu pé atrás dele fazendo-o cambalear, mas não cair. Assim que recuperou o equilíbrio, ele, esguio como era, passou um dos braços pelo meu ombro o que, inevitavelmente, me deixou desconfortável pela nossa enorme diferença de tamanho.
– Nem parece que você vive aqui a vida toda. – Provoquei, falhando em escapar dos braços de boneco de posto de gasolina.
A família Arkman era um grupo peculiar. Não só pelo nome que carregava nas Terras Altas escocesas, pela sua dupla nacionalidade geracional, a imensa extensão anuclear ou pelo fato como nenhum dos indivíduos se assemelhava fisicamente com outro. Nem mesmo pela figura extremamente característica e marcante que era matriarca Margareth Arkman. Talvez por um conjunto de todas essas particularidades. Éramos uma família unida, acima de tudo.
Mas mesmo agindo como irmãos, nenhuma pessoa que passasse por nós dois naquela movimentada rua turística se atreveria a dizer que éramos parentes. Isso se dava provavelmente por Fred ter puxado muito dos genes de sua mãe, uma escocesa típica, que passou para ele os cabelos ruivos e a pele extremamente branca não favorecida pelo sol britânico. Enquanto isso, eu, que tinha os dois pais brasileiros, carregava um dourado monocromático em cada pedaço. "Matt é o meu quilate de ouro mais precioso", a Marquesa Margareth sempre dizia, "a pele, os olhos e o cabelo sempre devidamente penteado. Mandei banhá-lo no ouro assim que nasceu." Embora muito cedo compreendi que essa era apenas a forma que minha avó tinha encontrado para explicar para as amigas da alta elite escocesa porquê tinha um neto tão "latino".
– Oh, minha amada Escócia, diga-me se existe uma cidade mais bela! – Fred pediu dramaticamente com as mãos levantadas, como se falasse com os céus.
– Você sabe, né, que Escócia é o país? – Zombei pelo que deveria ser a sétima vez naquela manhã, mas, na verdade, me divertia com o primo desengonçado que, vez ou outra, parava em frente a uma vitrine as lojas turísticas para conferir sua nova barba por fazer, a última invenção para tentar entrar nos clubes noturnos naquele verão.
– Deixa de ser babaca, Matt, eu e a Escócia estamos no meio de um momento aqui. – Ele retrucou sem tirar o sorriso do rosto.
Resolvi não responder a apenas adiantei meu passo descendo a larga ladeira de Castle Hill. A realidade é que Fred tinha toda a razão: Escócia era um lugar encantador. Edimburgo era uma cidade mágica. Eu me lembrava com detalhes da primeira vez que estive ali, achando que cada um daqueles grandes e velhos prédios que mais pareciam castelos eram teatros, prefeituras ou museus, como era comum no Brasil, e descobri que não passavam de casas ou restaurantes duas estrelas. Aquele era o cenário comum e ordinário. E mesmo com o céu cinza e o clima fechado sempre, não importava para que lado você olhava, a cidade tinha sempre uma vista de tirar o fôlego. Aquele era o topo do mundo.
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Riverside
Teen FictionEla adorava encrenca. Adorava bater boca, entrar numa discussão ou arranjar uma briga. Motivos ela tinha de sobra. Vivendo na sombra do irmão, o garoto prodígio, o grande gênio, o filho perfeito, Lola Morenno não passava de uma garota problemática j...