3 - Uma Lembrança Infeliz

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Todo o meu corpo estava travado como se eu tivesse sido congelada. Minha boca estava aberta pelo susto, e também por respirar ofegante. Eu me perguntava mentalmente como tudo aquilo acabou atraindo aquela pessoa para perto.

– Você se sente mal? – Um de seus braços passou por debaixo dos meus joelhos e o outro se apoiou nas minhas costas. Aaron me ergueu do chão com certa facilidade e eu me vi ali, nos seus braços sendo carregada no meio de uma viela. – Eu preciso que responda, caso contrário só pensarei duas coisas. Ou está em choque, ou está se aproveitando de mim.

– Me coloca no chão. – O repreendi firmemente, eu nem podia ao mesmo ficar perto dele depois daquelas palavras, aquele idiota.

Aproveitei e me lembrei do que ele me disse na porta da igreja, naquele mesmo dia, mais cedo. Eu podia sentir a raiva subindo em mim. Como ele ousava fazer piadinhas naquele momento, sem ao menos se preocupar com que tinha dito mais cedo? Droga, eu me sentia mal por ele apenas ter me tocado. Seus olhos procuravam um pingo de comédia no meu rosto, mas eu me mantive séria, afinal estava com raiva também não tinha do que dar risada. Nisso, ele provavelmente entendeu o recado e finalmente me colocou no chão.

– De nada, princesa. – Assim que meus pés tocaram o chão, eu tratei de dar alguns passos para trás, me distanciando o suficiente dele. – O que a filha do reverendo faz essa hora da rua? Não era para estar dormindo com os anjinhos? Ou rezando um pai nosso?

– Você não demonstra um pingo de respeito em nada do que fala? – A pergunta era retórica e só fez com que ele soltasse um riso. Já eu, estava ofegante passando as mãos nos cabelos sem parar. – Eu agradeço contra a minha vontade que tenha me ajudado, apesar de achar que você não merece a minha gratidão.

Ele soltou uma risada gostada levando a cabeça para trás no processo. Eu queria saber aonde estava a piada?

– Eu não preciso da sua gratidão, irmã. Podia nem mesmo ter ajudado, o novo boato nos bares dos arredores vai ser que estamos namorando. Foi como eu fiz ele te largar, lembra?

Balancei a cabeça irritada, aquilo era verdade, ele tinha dito que eu era sua namorada, foi assim que o demônio me soltou, mas tudo bem, era só aquilo nunca chegar aos ouvidos de meu pai e tudo ficaria bem. Merda, o que aquele garoto estava pensando?

– Eu não vou ficar aqui ouvindo você. Meu pai está em casa me esperando, então com licença – Me virei sorrindo ironicamente e dando passos longos para longe de Aaron, já ele continuava com uma risada baixa, idiota. Eu fiquei realmente irritada com aquilo, então me virei de uma só vez, já longe do mesmo e gesticulei com os braços. – Por que está rindo dessa maneira?

– Você é exatamente como eu imaginei, e como eu soube que era. Só para saber, qual o nome bíblico seu pai colocou em você? Aposto que sabe meu nome, mas eu não sei o seu. 

– Sinto muito em lhe desapontar, meu nome é Pietra. – Parece que eu tinha aprendido a arte do sarcasmo naquele momento, porque minha saliva pingava a ironia.

– Se fosse Dalila você tiraria a força do seu pai por mim? – Neguei com a cabeça não acreditando naquilo.

Apesar de não ser exatamente assim que as coisas aconteceram na história de Sansão e Dalila, eu havia entendido a referência, e achado um pequeno absurdo. Não estava gostando nada do rumo que aquela conversa estava tomando.

Meu cérebro já trabalhava em algo para retrucar, mas percebi que no fim ele tinha dito algo importante, ele citou uma história bíblica. Por mais conhecida que fosse, ainda era algo bíblico, então ele conhecia as histórias. Aaron não era um simples infeliz, tanto quanto parecia.

God Only Knows (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora